Capítulos: Prólogo 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 Epílogo
Autor: Andréia Kennen
Fandom: Naruto
Gênero: Drama, Lemon, Mistério, Romance, Suspense, Terror, Tragédia, Universo Alternativo, Yaoi
Classificação: 18 anos
Status: Completa
Resumo: Sinopse: Japão, 1890, transição do período Edo para Era Meiji, um jovem brilhante e recém formado investigador é incumbido de um caso estranho em um povoado afastado do grande centro urbano do país. Descrente da causa que estava motivando a série de assassinatos no tal vilarejo, ele segue para o local, certo de que iria desmascarar algum falsário psicopata, e ganharia, enfim, seu lugar de destaque na policia da capital. Contudo... Queria o destino que o mal que aterrorizava aquela região, não fosse uma mera crendice popular. [ItaNaru. Shota. Yaoi. + 18. Drama. Terror. Suspense. Sobrenatural. Lemon.]
Redenção
Revisado por Blanxe
Capítulo VII - Pêndulo
“Estava exausto,
mortalmente exausto com aquela longa agonia e,
quando por fim me desamarraram e pude sentar-me,
senti que perdia os sentidos.
A sentença – a terrível sentença de morte –
foi a última frase que chegou, claramente,
aos meus ouvidos. Depois, o som das vozes
dos inquisidores pareceu apagar-se
naquele zumbido indefinido de sonho...”
(O pêndulo e o poço - Edgar Allan Poe)
Antes de ter qualquer reação, Itachi sentiu que a mão que havia agarrado seu tornozelo perdera a força rapidamente. Agachou-se rente ao chão e empurrou a cama. Agindo com o intuito de socorrer aquilo que, em sua mente, era um prisioneiro assim como ele e — o mais grave — era o dono de todo aquele sangue espalhado no chão.
Tateou o solo, mas não encontrou nada.
— Onde você está? Está ferido? — perguntou. O investigador ouvia uma respiração condensada, um sopro que acariciava o lóbulo de sua orelha esquerda. Virou-se rapidamente, inquirindo: — Onde você está? — insistiu, estreitando os olhos e tendo a nítida impressão de estar acompanhado.
Contudo, nada. O suor frio correu pela lateral do rosto. Tinha absoluta certeza de que havia alguém ali dentro, sentira o agarrar forte no seu tornozelo. Mas não enxergava. Elevou as duas mãos na cabeça e as embrenhou nos cabelos escorrendo-os até arrancar a amarra que prendia todos os fios juntos ao pescoço.
O que está acontecendo?! — questionou–se, o desespero tomando-o. — Quem é você? O que quer comigo? O que quer de mim?
“Você...”
Itachi sentiu um arrepio surgir em sua coluna e percorrer cada vértebra, do cóccix a nuca. Seus olhos se arregalaram. Algo lhe respondera. Mas não era uma voz clara, audível como a de alguém que estivesse ali presente; era como a respiração que ouvira antes: um sussurrar, um sopro gélido e macabro, que não adentrava em seus ouvidos, parecia um som reproduzido direito no seu subconsciente.
Não conseguia compreender; imaginou ser apenas a reprodução do vento que penetrara por alguma rachadura, adensada por sua mente cansada e perturbada.
“A escuridão de tão atormentadora... chega a ser fascinante...”, lembrou-se da citação do filho desaparecido de Danzou. Não havia nada fascinante naquela penumbra. Sentia-se tentado a perguntar novamente, mas tinha receio de ouvir a resposta. Sentou-se no chão, encostando-se a parede, para evitar que aquela sensação em suas costas se repetisse. Passou-se alguns minutos, até que conseguiu tentar mais uma vez.
— Tem alguém aqui?
“Você...”
A resposta se repetiu como um deboche de alguém presente e não uma brincadeira da sua mente.
— Pare de brincar comigo! Apareça e diga o que quer de mim!
“Estou diante de você...”
O som estava distante, abafado, fechado em outro ambiente, mesmo que a informação dada alegava proximidade. ‘Seria um fantasma?’ Itachi se questionou, estreitando mais os olhos e forçando-se a ver além da escuridão. Se houvesse algo ou alguém ali, conseguiria vê-lo nem que fosse um vulto mais escuro, alguma coisa, mas não tinha nada. Ergueu uma das mãos e a moveu.
Nada.
— Não há nada diante de mim!
O silêncio perdurou por alguns instantes, até que a resposta se repetiu.
“Estou diante de você...”
— Pare de brincar comigo! Eu não consigo ver nada!
“Você não pode me ver com seus olhos...”.
Aquela informação repentina fez o coração de Itachi disparar. Era mesmo um fantasma? Fechou os olhos imediatamente e abaixou a cabeça. Ouvia claramente o quanto sua respiração estava acelerada e tensa, sentia o coração tamborilando no peito... Foi então que percebeu na escuridão de suas pálpebras cerradas, um brilho diferente, alaranjado. Ergueu a cabeça, mantendo os olhos fechados, e comprovou que havia algo… uma silhueta; talvez, a de um menino. Mas havia também um manto da cor de fogo o cobrindo como se fosse chamas crepitantes que não permitia distingui-lo claramente. Lembrou-se da visão que tivera na estrada e da fera que parecia lhe sorrir com os olhos...
“Agora vê?”, a voz perguntou-lhe, mais uma vez, ecoando dentro da cabeça do investigador.
— É um espírito?
“Não sei dessas coisas que me pergunta. O que é um espírito?”
— Hm... Não sei ao certo também... — Itachi constatou. — E por que eu posso vê-lo de olhos fechados?
“Não sei...”
— Eu o conheço?
“Sim...”
— É você, não é... Naruto?
O silêncio perdurou por mais algum tempo e como não obteve resposta, o Uchiha tentou outra pergunta:
— Se é você, por que eu conseguia vê-lo claramente das outras vezes?
“Não sei... Meu corpo não se mexe quando eu sinto fome. Não consigo andar com ele pelas passagens...”
— Passagens? Seu corpo? Então é mesmo seu corpo que está naquele quarto, não é?
“Estou com medo...”
— Medo? Do quê?
“De ficar sozinho. De ficar sem você, nii-san...”
Itachi elevou as mãos para o rosto e o cobriu, bloqueando por um instante aquela visão. Estava exausto, cansado, principalmente por aqueles mistérios não se resolverem e só aumentarem. Mas de algo tinha certeza: Naruto era especial. Aquela criança tinha um campo magnético que o atraía de uma forma sobrenatural; ainda que tivesse a constatação naquele instante de que ele não era um ser daquele mundo. Queria tê-lo para sempre ao seu lado. Comparara aquele sentimento ao de uma paixão avassaladora, mesmo não sabendo ao certo como era se apaixonar, já que nunca passara pelo processo. Porém, já ouvira inúmeros relatos e todos que diagnosticavam diziam que a sensação era perturbadora, de fome, posse, desejo ardente, pervertido e mundano.
Por isso, não conseguiu evitar a alegria de ouvir aquelas palavras. Entretanto, se Naruto fosse o tal demônio, poderia ser o responsável pela morte do irmão e de todas aquelas pessoas na vila. Porém, nem esse fato diminuía aquele desejo incandescente que brotava em seu interior como uma fogueira sendo alimentada por lenha e querosene. Era irônico sentir seu coração se perturbando por uma criança-demônio faminta por carne humana.
Retirou as mãos dos olhos e o visualizou em meio ao manto alaranjado e no meio dele, pode distinguir os orbes vermelhos tão diferentes dos límpidos da criança loira, mas não menos tentador.
“Está chorando?”
— Não.
“Está com medo?”
Itachi demorou um pouco a responder, mas negou com um balançar mecânico de cabeça.
— Aquela noite na qual cheguei à vila, era você na estrada, não era? — quis tirar aquela dúvida.
“Eu vi o nii-san... Vi o nii-san chorando... Mas eu não sei se era eu...”
— Naruto, você tocou na minha perna agora pouco, não foi? — a resposta veio em um menear positivo. — Você consegue me tocar de novo?
Para responder aquela dúvida, o vulto alaranjado se aproximou e o que parecia um braço se estendeu e tocou o rosto de Itachi, em um movimento de carícia.
O calor daquele toque fez Itachi sanar sua dúvida. Não era uma miragem, ou uma ilusão como chegara imaginar; o toque era verdadeiro, apesar de a sensação ser diferente de um toque humano comum e provocar um formigamento em sua pele. Sobrepôs à mão dele com a sua e, com uma certeza da qual ele mesmo desconhecia, garantiu:
— Você não vai ficar sozinho, Naruto. Nunca mais. Eu vou cuidar de você.
“Promete, nii-san?”
— Eu prometo.
...
Asuma e seus dois comandados, percorriam a floresta em busca do padre.
— Mas que inferno! Como não percebemos o sumiço dele antes?
— Acalme-se, Asuma-sama...
— Não me peça calma, Kotetsu! Eu já estou no limite. Vamos encontrá-lo de qualquer forma, ou eu não sou digno de ser chamado de governante.
Os dois capangas se entreolharam e, após verem Asuma se embrenhar na mata à frente, eles assentiram um para o outro, como se concordassem em pensamento, e cada um seguiu para um lado.
A chuva continuou caindo, enquanto o governante adentrava a floresta em desespero, recordando de quando Iruka e ele estiveram juntos na diocese da capital, logo após a morte do seu velho pai. Primeiro, ficara intrigado ao receber uma carta resposta da delegacia da capital referente ao seu pedido de orientação quanto ao que fazer sobre as estranhas mortes que estavam acontecendo na vila, e então, ser redirecionado para uma catedral. Fora alertado que deveria ir na companhia de um padre ou um seminarista, por isso, obrigou Iruka a acompanhá-lo, mesmo que o rapaz se recusasse; dizendo que ainda não era um sacerdote.
Ao se encontrarem com Arcebispo ficou ainda mais surpreso ao perceber que o homem parecia saber muito mais do que estava acontecendo na vila, do que ele próprio.
“Sem dúvida alguma, é obra de um demônio”, o diocesano afirmou calmamente, após ouvir o que relatara.
“Me desculpe, senhor. Mas isso é absurdo. Essas coisas de ‘demônio’ só existem em contos!”
O Arcebispo suspirou de um jeito enfadado. Era comum aquele tipo de reação. Então se levantou, pedindo para que eles o acompanhassem. Desceram inúmeras escadas, até atravessarem o solo e se embrenharem em mais corredores úmidos e escuros de um gigantesco porão. Quando Asuma e Iruka começaram a arfar por falta de ar, chegaram a uma porta que estava lacrada por grossas correntes e um cadeado de segredo. Na frente da porta, sentado em uma escrivaninha, catalogando algo em um livro, estava um velho corcunda. O homem não precisou de nenhum comando e ao ver o Arcebispo se aproximando; se levantou imediatamente e encobrindo o cadeado com seu corpo, destravou a tranca e abriu a sala.
Adentraram aquele recinto que fedia a coisa velha e abafada pelo tempo; admiraram de boca aberta as imensas prateleiras de livros. O velho corcunda adiantou-se na frente deles e acendeu uma lamparina próxima do chão, em um suporte de pedra, ao centro do recinto e distante dos livros; proteção necessária para manter as chamas longe dos volumes velhos que estavam guardados como tesouros.
Era óbvio que, se fossem fazer uma pesquisa ali, não saberiam por onde começar, pois só com um pequeno correr de olhos pelos livros, tanto Asuma quanto Iruka perceberam que não havia nomes nas lombadas das capas e sim números.
Foi então que Dom Gregório — o velho Arcebispo —, ainda sem dizer nada, estendeu a mão para o ancião, o provável bibliotecário, e este, com certa relutância, retirou um livro de dentro da camisa e estendeu ao homem. Depois de algumas folheadas, Dom Gregório ditou sequências de números que para os visitantes não fazia o menor sentido. Não demorou muito, e com uma agilidade assustadora para a idade, o velho guardião dos livros começou a empurrar as escadas de um lado para outro, escalá-la e retirar os volumes conforme fora lhe pedido. Depois de alguns minutos, o Arcebispo devolveu o catálogo de capa preta ao corcunda que não disfarçava os olhares de censura para a autoridade e seus visitantes, como se estivessem violando seu tesouro sagrado, e mantendo o ar pouco amistoso, puxou o livro das mãos do homem, voltou a guardá-lo junto ao peito e se retirou, trancando-os na sala.
“Acho que ele não gostou da gente.”, Asuma comentou.
“Ele não gosta de ninguém.”, Dom Gregório afirmou, sentando-se em uma mesa e convidando seus visitantes a se acomodarem também.
Em seguida, o homem os fez jurar de que tudo que ouviriam, leriam e veriam naquela tarde — em nome de Deus e dos entes vivos que amavam — guardar sigilo até a morte. Após consentirem, ele passou a explicar com o ‘quê’ estavam lidando.
Naquela noite, ouviram de Dom Gregório, que há muito tempo atrás, existira um clã que se especializara em invocações demoníacas. Seus membros passaram séculos estudando e aperfeiçoando rituais dos quais pudessem um dia invocar e despertar bestas malignas que vivem no submundo e possuem poderes descomunais. Esse grupo, ao ser descoberto, fora perseguido pela Igreja e grande parte foi exterminado; os poucos que restaram, se recolheram nas sombras.
Até que um dia, um jovem rei com sede de poder e de rápida ascensão, acolhera os membros do clã em seu palácio, camuflando-os como seus conselheiros e dando-lhes verbas e condições necessárias para continuarem suas pesquisas. Muitas mortes vieram a partir de então, moradores que morreram como cobaias e, mesmo assim, todos os resultados foram falhos.
Os membros do clã imploraram ao rei por mais tempo, porém a paciência do homem poderoso estava se esgotando. Além do que, ele notara que após a chegada do grupo, as desgraças pareceram ter se alojado em torno de si e se alastrava para tono reino. A mulher com quem se casara não o amava e vivia deprimida, também não lhe dava filhos, o reino estava beirando a falência, as plantações não produziam e, por causa de dívidas com os reinos vizinhos, estavam prestes a ser atacados e dominados por falta de tropas.
Ordenou, então, que todos do clã fossem presos e exterminados. Contudo, a premonição de um jovem membro do grupo, convenceu o rei a aguardar um pouco mais. O rapaz vira que, uma morte inesperada e um nascimento inconcebível iriam trazer-lhes o poder que desejavam.
E, no dia seguinte, o padre do reino amanhecera morto, pendurado por uma corda no salão principal do palácio — era a morte inesperada; a conclusão da primeira parte da profecia. Três dias depois, a rainha anunciara estar grávida — era o nascimento inconcebível; a profecia havia se concretizado.
O rei ficara feliz, e realocou todos os membros do clã em seus cargos de confiança e assim, os meses se passaram e os problemas se amenizaram. Todavia, sua alegria durou apenas os nove meses de gestação do esperado herdeiro, pois, assim que a criança veio ao mundo, o rei teve certeza de que fora um homem traído. O menino não tinha seu sangue. Todos os traços na pequena face eram do verdadeiro pai, um caucasiano de olhos azuis claros berrante. O homem que jurou votos de castidade e se matou enforcado após se dar conta do seu pecado: o padre. Naquela mesma noite, o rei, em cólera pela traição da mulher, a matou a punhaladas, enquanto ainda amamentava o recém nascido. Não teve coragem de dar o mesmo destino à criança, por mais que esse fosse seu desejo, por isso, o deixou sobre o corpo dela e os trancou no quarto, esperando que ele morresse de fome.
Passaram-se dias, semanas e os conselheiros continuavam perguntando para o rei o que havia acontecido com a mulher e o bebê. “Morreram no parto”, fora a resposta dele. “E onde foram enterrados os corpos?”, perguntavam em vão, obtendo apenas o silêncio depressivo em resposta.
Alguns dias depois, o homem veio a falecer de inanição. Entrara em uma depressão onde não conseguia ingerir nada. Os conselheiros decidiram ocultar a morte dele, já que não havia herdeiros e aquela notícia poderia ser geradora do caos. O líder deles decidiu que se passaria pelo rei, até encontrarem uma forma de dar a notícia ao povo. Um dia após a posse do clã, um dos integrantes do grupo ouviu um choro vindo dos aposentos reais, arrombaram a porta e se petrificaram com o que viram: o filho do rei estava vivo e, na cama, jaziam os ossos espedaçados do que fora a rainha.
Pelo que deduziram, aquele pequeno ser que já estava sentado na cama, mesmo tendo algumas semanas de nascido e que ao vê-los, interrompeu o choro e abriu um sorriso com uma fileira de dentes todos similares aos caninos,fora o causador da morte da rainha.
Um dos integrantes, eufórico e ignorando os alertas do líder para que não se aproximasse, foi até o pequeno gritando “É um milagre!” e o apanhou nos braços, para, segundos depois, estar agonizando no chão por ter recebido uma mordida no pescoço. Ainda sobre o corpo do homem, o bebê abocanhara o braço e com uma ferocidade fora do comum, arrancou pedaços da carne e passou a devorá-la como se fosse um animal faminto agarrado a sua presa.
Asuma e Iruka admiraram — perplexos — as figuras desenhadas no livro que o arcebispo mostrava. O final da história que homem narrara fora ainda mais bizarro: no início, o clã decidira manter a criança viva, e como ele repudiava outro tipo de alimento, passou a sustentar o demônio com seres humanos; a princípio, condenados e criminosos. Em troca, o ser trouxera poder como previram, ajudara o reino a vencer guerras e conquistar riquezas. Porém, alimentá-lo logo se tornou um problema. Quando não havia mais criminosos, passaram-lhe a ofertar mendigos, devedores. E quando já não restavam mais vítimas, pessoas inocentes passaram a morrer.
O medo no castelo se espalhou quando as ruas começaram a se esvaziar e não havia nem empregados para cuidar dos afazeres do palácio. As pessoas que rodeavam o demônio passaram a temê-lo e também, começaram a procurar uma forma de matá-lo. Mas, infelizmente, descobriram aquilo que já imaginavam: nada humano era capaz de acabar com sua vida. Nem espadas, nem adagas, nada. Todos os ferimentos cicatrizavam em uma velocidade desumana. Tentaram também estacas no peito, cortar-lhe a cabeça, queimá-lo. Nada. Dias depois, ele ressurgia, ainda mais poderoso e faminto.
Os poucos sobreviventes do clã decidiram pedir auxílio à Igreja, mesmo contra a vontade ‘do rei’, que tinha o demônio como próprio filho. E com a ajuda de padres e pregadores, tentaram exorcizá-lo; usaram crucifixos, água benta e armas benzidas. Não o mataram, mas descobriram estarem no caminho certo, pois os ferimentos causados pelos artigos religiosos demoravam a cicatrizar, além disso, a presença dos próprios membros da igreja intimidava o monstro...
“E como a igreja conseguiu derrotá-lo?” Asuma interrompeu a explicação do padre, impressionado com a história.
“As escrituras não dizem ao certo... Mas pelo que entendemos, o homem que conseguiu acabar com a vida da fera, fora concebido da mesma forma que ele.
“Da mesma forma?” Iruka também se manifestara, em perplexidade.
“Sim, meu jovem. O único capaz de matar o demônio, é o filho de um sacerdote que tenha quebrado seu voto. Isso não vale para os padres que largaram a batina para se casarem, e sim, aqueles que cometeram a injúria de se deitarem com o sexo feminino, ainda sobre os votos de castidade, engravidando-a..”
“Está nos dizendo, Bispo, que o demônio que está atacando os moradores da nossa vila...”
“Sim, meu rapaz.” Dom Gregório completou seu pensamento. “Provavelmente, é um fruto de uma concepção maligna. E, a única forma de destruí-lo, é com outro, concebido da mesma forma...”
“E eles existem?”
“Esse é o problema, Asuma-san... Há casos, porém, são raros. A igreja tornou-se ainda mais rigorosa depois desse ocorrido e os sacerdotes traumatizados e cientes dessa verdade, quando são atentados pelas trevas para quebrarem seus votos, a consciência os levam a fazê-lo com jovens do mesmo sexo, evitando pelo menos assim, a possibilidade de uma concepção como essa.”
“Mas, existem?”, Asuma repetiu a pergunta, tentando-se apegar aquela esperança, olhando com firmeza nos olhos do homem.
“Sim.”, o Arcebispo assentiu. “Padres são homens, humanos, e muitos deles, não conseguem resistir à tentação da carne, meu jovem...”
— AHHHHHHHHHHHH!
O governante da vila da folha teve seus pensamentos quebrados com o grito que ecoou pela floresta; fazendo com que as aves abrigadas nas árvores, levantassem voou. Seu coração disparou do susto; parecia a voz de um dos seus homens. Desesperado, deu meia volta e retornou pelo caminho que abrira entre as folhagens.
Os gritos aumentaram e ele correu, sem se importar de se ferir nos arbustos e galhos.
— Kotetsu?! Izumo?! — ele os chamou, tentando ouvir onde estavam e assim localizá-los.
— Asuma-samaaaaa! Não venha!
— Onde você está, Kotetsu?!
— Não venha... Fuja... — a voz do rapaz repetiu chorosa e mais enfraquecida.
Mas era óbvio que aquele era um pedido impossível dele atender, não era um covarde para deixar seus homens e fugir.
— Estou chegando! Aguente mais um pouco! — pediu, mas desta vez não obtivera resposta.
Adentrou uma clareira no meio da floresta e foi obrigado a fazer uma parada brusca ao ver pendurado em uma árvore diante de si, as cabeças dos seus dois ajudantes pingando sangue. Caiu de joelhos, sentindo as lágrimas que verteram involuntariamente.
Não conseguia entender. Se era mesmo um monstro que se alimentava de carne humana, porque as cabeças eram arrancadas do corpo por uma lâmina? Quem mais poderia estar por detrás daqueles assassinatos?
— Apareça, desgraçado!!
Asuma paralisou-se com os olhos arregalados. Em meio às sombras da floresta havia algo parado e encarando-o. Dominado pelo ódio, trincou os dentes, segurou a arma que trazia nas costas por debaixo do colete e apontou na direção dos olhos fumegantes, descarregando a arma enquanto gritava.
Os disparos levantaram fumaça e o governante avançou, com intuito de encontrar a coisa caída e agonizando no chão. Ele viu um estranho brilho metálico reluzir, como se fosse a lâmina de uma foice maligna que riscou o ar e segundos depois, vira uma claridade. Não havia dor e nem desespero, não sentia mais o coração batendo nem o corpo. Em um flash, viu a bela esposa, aguardando sua chegada no portão de casa com a filha no colo. “Eu amo vocês...”, disse em seu pensamento e, de repente, o corpo decepado que jorrava sangue pelo pescoço caiu de joelhos no chão e tombou. A cabeça rolou em meio às folhagens e só parou ao bater contra um tronco de árvore.
O homem alto e que tinha metade do rosto encoberto por um pano, saiu das sombras e passou os dedos na lâmina da espada de tamanho desproporcional para limpar o excesso de sangue, em seguida, secou os dedos sujos na roupa, deixando-a mais encardida.
— Parece que desta vez a entrega vai ser maior do que a esperada... — ele constatou, apanhando a cabeça pelos cabelos. — Melhor deixá-las na estrada onde será mais fácil de serem encontradas. — O homem recolocou a espada no suporte em suas costas e apanhou a perna do corpo do governante e saiu arrastando-o. “Se desta vez aquele maldito cara de cobra não me devolver aquilo que me pertence, é o corpo dele sem cabeça que servirá de alimento para aquele bicho de estimação demoníaco...”
A chuva aumentara. Iruka havia se abrigado em uma caverna esperando que a torrente se acalmasse antes de continuar a viagem. Tivera a impressão de ter ouvido gritos ao longe. Mas, resolveu acreditar que havia sido coisa da sua cabeça. Retirou a mochila das costas e a vasculhou a procura de uma lanterna de querosene. Assim que a acendeu, observou melhor o ambiente, imaginando que poderia estar na toca de algum animal, pois o cheiro de carne em decomposição era insuportável. Apertou o nariz com dois dedos e continuou adentrando, tomado pela curiosidade. Sempre andara por todos os lados naquela floresta, até já havia visto a caverna, mas nunca se interessara em investigar.
O odor se intensificava a cada passo. Chegou a uma porta improvisada feita com lascas de tronco de árvores, unidos uns aos outros por pedaços de cipós. Deduziu, então, que não poderia ser a toca de um animal, afinal, animais não poderiam construir uma porta. Encostou o ouvido no patamar e tentou ouvir algo, mas o único som era os zumbidos de moscas agitadas. Destampou o nariz para procurar uma forma de abrir aquela passagem, quando ouviu um som baixinho, algo como um lamento ou um choramingo.
— Tem alguém aí?! — perguntou, encostando novamente o ouvido na madeira. Notou que o choro baixinho continuava, mas não obteve resposta. — Fique calmo! Eu vou tentar empurrar essa porta.
O padre retirou mais uma vez a mochila das costas, apanhou um lenço e amarrou na face para evitar ânsia de vômito que o cheiro estava causando. Deixou a lamparina no chão e passou a usar sua força para arrombar a porta. Depois de duas investidas contra a mesma conseguiu abrir uma fresta o suficiente para o seu corpo magro transpassar. Resolveu deixar a mochila, para evitar maior volume. Passou primeiro o braço com a lamparina e, logo depois, conseguiu se esgueirar para o lado de dentro.
— Alguém? — inquiriu, erguendo a lamparina, mas assim que sua mente concebeu a informação daquilo que seus olhos viam, perdeu a sensibilidade dos dedos. A lamparina foi ao chão e um berro horripilante deixou sua garganta.
Continua...
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