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[Sailor Moon] Então, Fique ao meu Lado - Capítulo 3, escrita por Anita

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Autora: Anita
Fandom: Sailor Moon
Gênero: Comédia romântica
Classificação: 12 anos
Status: completa
Resumo: Tsukino Usagi / Chiba Mamoru. Usagi é forçada a passar um final de semana com sua família em um hotel no interior. Ela não sabe se o pior é descobrir um ataque de um possível youma ou que Mamoru Chiba está hospedado no mesmo local. Ele ainda acaba a acompanhando enquanto ela tenta investigar, só para deixar tudo mais complicado.

Olho Azul Apresenta:
Então, Fique

Ao Meu Lado

Capítulo 3 — A Primeira

Talvez eu pudesse contar nos dedos as vezes em que havia segurado a mão de um homem na minha vida. Eu não ia prova isso agora, porque ou eu ia ficar deprimida de estar errada ou ia fica deprimida de estar certa. Melhor deixar na imaginação. Mas era ainda mais provável que aquela fosse a primeira vez que eu realmente pegava na minha a mão de um homem estranho. Alguém que não era meu pai, meu irmão, meu colega de escola. Simplesmente um homem.

Um homem que eu tinha visto pelado no dia anterior; muito obrigada, memória. Você funciona muito bem nas horas mais convenientes.

Meu rosto queimava com a enxurrada de pensamentos constrangedores me deixando surda a respeito de: por que diabos eu tinha pegado a mão do Mamoru?

Aparentando estar igualmente confuso, a mão dele tremeu. Talvez considerava retomá-la para si. Qual fosse o motivo, no final, acabou deixando-a ali na minha.

Num impulso tão inexplicável como o meu anterior, eu juntei minhas mãos, fazendo um sanduíche com a dele.

— Você tá tão gelado — comentei com a voz instável. Um comentário idiota já que estávamos em pleno outono, numa cidade nas montanhas, num frio desgraçado, no meio da rua e sem luvas. Perceber que ainda por cima eu o havia dirigido àquele homem não me fez me sentir menos louca.

— Eu devia ter trazido luvas — ele respondeu.

Sua mão tremeu de novo, mais um pouco e ele a tiraria dali. Por que avaliar isso me trazia aflição?

— Em pensar que ainda é uma hora da tarde... O inverno vai ser bem forte este ano — ele continuou a falar.

Eu só assenti; não conseguia tirar os olhos de onde minhas mãos seguravam a dele.

— Não vai me perguntar sobre o Takayuki-san?

— Por onde eu começaria?

Ele riu.

— Eu sou mesmo adotado — ele disse, então.

Agora sim ele tinha toda a minha atenção. Meus olhos saltaram pro rosto dele, para saber que piada estranha era aquela. Só que não era. Ou Mamoru era um ótimo ator.

— Adotado? — acabei repetindo suas palavras.

— “Só se forem de pai e mãe diferentes”, não foi o que você disse? Por que está tão surpresa agora?

— Só quis dizer que vocês são muito diferentes. Só uma piada. Sabe, tipo quem diz que vocês se parecem no branco dos olhos?

— Sim, eu entendi. Mas foi a primeira vez que alguém reparou em como somos diferentes. Quem se esforça para ser sincero sempre fala de como temos um ar parecido.

Acabei rindo. Quando Mamoru me olhou sem entender, precisei explicar:

— É que isso parece muito com dizer que se parecem no branco dos olhos. Tipo o ar que vocês respiram é parecido.

— Não é bem nesse sentido... — Mamoru acabou puxando sua mão de volta nessa hora, para mexer com o cabelo e bagunçá-lo. Ele também fizera um gesto assim antes, não era? Ele continuou: — Nós só não somos de falar muito e sempre fomos estudiosos. — Pausou um pouco. — O que quero dizer é que comparam as nossas personalidades.

— Pois não achei vocês nem nisso parecidos — eu disse. Até que eu havia realmente feito uma comparação assim. Mas eu tinha sido propositalmente injusta, só porque os dois tinham me irritado. — Aquele homem tá mais pra um lobo em pele de cordeiro.

— Não é verdade; Takayuki-san realmente é tudo o que parece ser.

— Um adúltero pervertido.

Mamoru desviou o olhar, nitidamente incapaz de defender o irmão adotivo dessa.

— Não sei o que deu nele — ele falou enfim.

— E intrometido na minha vida — complementei.

— Ele não disse nada errado. Não sei o que deu em mim pra te trazer com a gente.

— É o amor? — brinquei. — Sei bem como eu sou irresistível!

— Claro, Cabecinha de Vento.

— Ei! Você é incapaz de me chamar pelo meu nome ao menos uma vez? Achei que estávamos em uma conversa séria.

— Foi você que começou a piada. — Ele riu do seu jeito convencido.

Em parte, era reconfortante vê-lo menos sério. Mas dentro de mim, era como se eu tivesse perdido alguma coisa. E não conseguia dizer o quê. O que tava dando em mim desde a noite no onsen? Eu não tô mais fazendo sentido algum!

— Vamos? — Mamoru apontou para a rua à nossa direita.

— Pra onde? Comer? Porque eu acho que o dia hoje tá pedindo um bolo bem gostoso com um chocolate quente, não acha?

— Depois reclama que te chamo de Cabecinha de Vento. Não sabe nem mais pra que lado fica o hotel. — Ele pôs a mão nas minhas costas e me empurrou de leve mas com firmeza. — Vamos logo que se eu te deixar sozinha você acaba se perdendo e se metendo em confusão.

— Já tô indo... Mas nem um chocolate?

— Pague um quando chegarmos.

— Pão duro! Eu vi seus pais, tá? Eles super mandam em tudo naquele hotel. Aposto que têm grana.

— E têm mesmo; eles são os donos. Só que não são meus pais.

Os donos! E você sendo miserável e me forçando a pagar um chocolate quente! Que absurdo... — Estalei a língua. — Não em venha com desculpa de filho adotivo, porque filho é filho. Vai me pedir um chocolate quente sim e ele vai direto pra conta do quarto dos seus pais, ouviu?

— Não fica parando a cada dois passos. — Ele empurrou de novo minhas costas e só aí notei que ainda estava com a mão lá.

Senti-me de novo sem graça, pois não importava quem nos visse, pareceríamos muito um casal. Mas ele nem devia achar isso, né?

E nem eu devia achar. O que estava dando em mim?

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

Alcançamos o hotel na mesma hora em que meus pais regressavam com meu irmão. Ainda tentei me esconder atrás de Mamoru, só que ele era um traíra, e eu já devia ter imaginado que teria mais chances correndo do que esperando alguma ajuda dele.

— Quem é você e o que está fazendo com a minha filha? — meu pai perguntou bravo logo que Mamoru me empurrou na direção deles.

— Ele é o amigo do Motoki-san, querido — minha mãe explicou com um sorriso que me causava arrepios. Por que ela estava piscando pra mim? — Vocês foram almoçar juntos?

— Já que os dois me abandonaram aqui sozinha no hotel — respondi no lugar de Mamoru e cruzei meus braços.

— Obrigada por fazer companhia pra nossa Usagi — minha mãe disse, alheia à minha tentativa de fazer eles se sentirem culpados. Ela continuava com aquele sorriso estranho. — E por trazê-la de volta também. Se a deixasse sozinha, era muito capaz de ter se perdido. — E riu com uns agudos que me faziam querer tapar os ouvidos.

— De fato, eu a trouxe exatamente porque estava indo para a direção contrária.

Minha mãe riu de novo.

— Precisava vê-la ontem tentando fugir da gente. Em vez de ir pra longe do hotel acabou—

Eu a interrompi, empurrando-a para longe.

— Por que vocês não vão pro onsen em vez de ficar fofocando no saguão do hotel, hein?

— Isso sim é uma ótima ideia — meu pai disse. — Está bem frio lá fora, nem parece que ainda é outono.

— Então vão! Anda! — Empurrei os dois, notando que Shingo já tinha sumido para o quarto em algum momento da conversa.

Suspirei quando eles sumiram corredor abaixo.

— Até parece que queria ficar sozinha comigo, Cabecinha de Vento.

Olhei para trás assustada. Na verdade, queria tanto evitar minha mãe começar os planos para me casar com aquela criatura — e ela ainda nem sabia que ele era o dono do hotel! —, que me esqueci justamente da própria criatura ali de pé. Sorrindo todo convencido.

— Não dá pra você fazer puf e desaparecer, não?

— Melhor você fazer. — Mamoru caminhou até um canto do saguão, onde havia umas cadeirinhas e duas mesinhas, uma delas coberta de folhetos do hotel, da cidade, da região, etc. Lá sentou-se e cruzou as pernas com um dos folhetos em mãos.

Minhas sobrancelhas colaram uma na outra e o segui, esticando a cabeça para ver o que podia ser melhor naqueles papéis que se esquentar na água de um onsen.

— Você tá se camuflando, né? — concluí, sorrindo de tanta satisfação pelo momento raro de inteligência.

— Quê? — Ou ele era bom ator, ou realmente não entendera.

— Camuflando, pra espionar. Você tá aqui pra espionar seu irmão!

— Não é nada disso. — Mamoru cruzou a perna e pegou agora uma pequena revista regional. — Não vai embora? — perguntou com uma carranca pra mim.

Balancei a cabeça e peguei a cadeira do lado.

— Também quero brincar! Afinal, é do homem que me tratou mal que estamos falando, eu também quero fazer parte.

— Parte do quê, sua Cabecinha de Vento? Só estou... — Ele entortou o pescoço e se levantou do nada, como se houvesse se esquecido de que estávamos no meio de uma conversa.

Olhando na mesma direção, encontrei Takayuki-san passando por uma porta reservada a funcionários junto com uma mulher de talvez uns trinta anos e postura perfeita. Mamoru já os estava seguindo quando me liguei.

A porta dava em um corredor com muitas outras. Takayuki-san e a mulher andaram até a última e fecharam.

— Chiba-san! — a mulher exclamou para ele e não pro outro Chiba do meu lado. — Não íamos discutir as— Nenhum som. Então, um ruído de papéis, de um móvel arrastado no chão, outros sons mais difíceis de descrever. Principalmente porque Mamoru me puxou pelo braço para longe da porta.

— Eles tão se pegando! — sussurrei empolgada com mais aquela descoberta.

— E por que você me seguiu? — ele perguntou bravo, mas também sussurrando.

— Porque eu também queria participar da investigação, oras. — Apontei para a porta fechada. — Eles tão se pegando lá dentro. Seu irmão tá pegando outra lá dentro! — Foi quando a realidade chegou a mim e meus olhos se encheram de lágrimas. — Ele tá pegando outra lá dentro! Ele não me dispensou porque era casado! Ele sequer sabe que é casado? — A raiva passou por cima da tristeza e eu já tava a uma frase de passar do limiar entre o sussurro e o grito histérico.

Mamoru balançou a cabeça, com certeza, não se importando de responder as minhas perguntas. Ao menos, estávamos na mesma página sobre as atitudes daquele irmão mais velho dele.

— Você disse outra? — Ele massageou a cabeça com uma das mãos. — Aquela mulher não era a mesma de ontem?

Fiz que não sem esconder o contentamento com saber mais que aquele sujeitinho. Toma na sua cara suas notas perfeitas.

— Completamente diferente — acrescentei.

— Você viu a moça de ontem?

— A voz! O jeito também. Aquela menina ontem devia ter uns dezoito? Vinte? Sei lá, mas não tinha trinta não. Essa deve ter até bem mais que isso. Não viu? Até as palavras delas são diferentes.

Queria estar filmando a admiração com que Mamoru me olhava de volta. Até porque só durara um segundo, substituída por duas sobrancelhas quase grudadas uma na outra.

— Usagi.

— Que foi? — Eu me encolhi, porque não era todo dia que ele lembrava que eu tinha nome.

— Seu chocolate quente. Não era isso que você tava pedindo? Vamos lá. — Ele fez menção para a porta por que passáramos, de volta ao saguão.

— Você tem um plano novo? Em que tá pensando? Conta logo! Porque eu tava aqui tramando. E se eu me disfarçar com uma minicâmera e aí a gente mandava tudo pra esposa? Há um limite de fidelidade a irmãos, né? Tá na hora de ela saber o que o marido metido a membro dos Edgers tá aprontando.

— Eu só quero sair daqui.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

Não tinha ninguém no restaurante quando entramos, mas havia uma placa de aberto, informando que fechavam às dez da noite. Mamoru se sentou em uma mesa para dois, como se realmente precisássemos salvar espaço para a fila de clientes que não estava esperando lugar. Pouco depois, uma senhora se aproximou com dois cardápios. Mas ele levantou a mão para recusar e disse:

— Um chocolate quente para ela e um café para mim.

— Entendido, já trarei. — A senhora saiu com os cardápios.

— Mas e se eu quisesse um bolo? — reclamei, fazendo bico. Spoiler: eu queria, claro.

— Você volta e come depois, se venderem. — Mamoru estalou a língua e mais uma vez massageou a cabeça. — Tem certeza mesmo que era outra mulher? Com o Takayuki-san?

Assenti.

— Pra mim, ele que é uma criança. Não respeita nem a própria esposa, né? — disse com a voz crescendo a palavra.

— Eu não estava querendo espioná-lo. — Mamoru encostou-se na cadeira e cruzou os braços com o olhar distante. — Só falar a sós com ele. Não que nos falemos muito, mas desde que cheguei, não consegui nem uma palavra quando estivéssemos só nós dois. Takayuki-san estava sempre procurando documentos do hotel aqui e ali. Ou com alguma garota, pelo visto. Eu nem sei qual o quarto dele...

Minha mão andou sozinha até a mesa, querendo consolá-lo, mas não era possível alcançá-lo.

— Takayuki-san não é assim. Enquanto conversávamos mais cedo, percebi como ele está diferente. Será que o hotel está com algum problema? Ou o casamento dele? Não que eu fosse alguma ajuda, mas queria ao menos entender o porquê de tudo. — Mamoru balançou a cabeça. — Por que estou falando disso contigo?

Dei de ombros.

Meu chocolate já havia chegado quando percebi movimento na entrada do restaurante. Três homens se aproximavam e quase engasguei ao ver que Takayuki-san era um deles.

— Rápido, segura minha mão! — Sacudi-a para enfatizar mais a urgência para Mamoru. Como ele estava de costas para eles, sua única reação foi me olhar confuso. — Anda, por favor!

Embora eu mesma que tivesse pedido, fiquei surpresa quando Mamoru atendeu. Seus dedos chegavam até o meu pulso e sua palma enlaçava suavemente as costas da minha mão.

— Você tá toda vermelha por quê? — ele perguntou impaciente e então virou para onde eu tentava não encarar.

— Não seja tão óbvio! — reclamei.

— Takayuki-san?

Confirmei com a cabeça, engolindo a seco. Os três estavam agora em uma mesa redonda bem no canto do salão, mas Takayuki-san havia nos reconhecido dúvidas.

— Finja que está gostando do que tô falando... — pedi.

— Você realmente não é o tipo dele, se a sua ideia é fazer ciúmes. Além do mais, Takayuki-san nunca iria querer uma namorada minha. — Mas ele mantinha sua mão ali, acariciando a minha. Sua expressão também ficara mais suave enquanto sustentava um olhar fixo no meu.

— Não é isso. — Minha voz parecia rouca. Eu era tão inexperiente com homens que até aquela farsa com Mamoru Chiba me abalava? Meu coração estava batendo tão forte que doía literalmente. Sabe quando você corre muito a toda velocidade? Eu me sentia pronta para ganhar uma medalha. Forcei-me a respirar fundo e pensar melhor. — Só quero mostrar pra ele que não sou criança.

— Saindo com o irmão mais novo um dia depois que ele te rejeitou? — Mamoru levantou uma sobrancelha. — Ou mais maduro que isso, fingindo que está saindo.

— Se não quiser ajudar, é só ir embora. E foi ele quem já pegou duas depois daquilo.

Ele sorriu e mexeu com a mão. Fechei os olhos para não ver que meu plano tinha ido por água abaixo. Mas Mamoru não a recolheu. Invés disso, ele a subiu pelo meu antebraço, os dedos deslizando pela minha pele.

— Sua cabecinha de vento; só crianças ficam tão desesperadas por provar que não são crianças.

Mas ele não parou de atuar, por isso decidi apenas ignorar a enésima lição de moral pelo Professor Sou Demais e me concentrar em não me concentrar no que ele tava fazendo com o meu braço.

— Sabe de uma coisa? — Levantei-me antes que ficasse sem oxigênio no cérebro e morresse por não conseguir respirar. — Vou lá falar com ele e já volto.

Mamoru franziu a testa, mas ignorei. Quem se importava com qualquer opinião que quisesse me dar? Pessoas que se conhecem se cumprimentam. Era isso o que ia fazer. Cumprimentá-lo e sair dali.

— Takayuki-san, boa tarde! — disse o mais animada que pude.

Os três homens se viraram para mim.

Takayuki-san me olhou dos pés à cabeça e acenou com a cabeça como se não estivéssemos a metros um do outro.

— Usagi, meu nome é Usagi — eu disse, incerta se era só o meu nome que ele não lembrava.

— Claro. Olá, Usagi-chan. Que tal o restaurante?

Olhei para os lados num reflexo — na verdade, nem me lembrava mais de onde estava — e dei de ombros.

— É bom — respondi por falta de opção melhor. Estávamos mesmo tendo aquela conversa? Como prosseguir o assunto? “Que tal qualquer mulher que não eu?” era a única opção que me vinha à mente. Que decepção... Como havia perdido meu dia inteiro de ontem pensando naquele cara?

Alguém segurou meu cotovelo e me virei para encontrar Mamoru, cuja mão agora estava no meu braço, puxando-me para junto dele.

— Takayuki-san — ele cumprimentou o irmão e depois acenou para os dois outros. — A Usako só queria te dizer oi antes de subirmos pro quarto.

Quarto? Por que íamos subir pra quarto algum? E quem diabos era Usako? Quando enfim o outro tinha aprendido meu nome aquele convencido ia confundi-lo com seus apelidos idiotas!

— Mas vejo que está ocupado, então já estamos indo. — Mamoru inclinou a cabeça até seus lábios roçarem pelos meus cabelos e me puxou gentilmente em direção à saída. Eu tinha acabado de descobrir que podia sentir coisas pelos fios de cabelo, porque até agora aquele lugar estava queimando.

— Ela é sua namorada? — Takayuki-san perguntou me olhando como se nem me conhecesse.

— A Usako? — Mamoru gargalhou e pela primeira vez percebi o nervosismo nele. Porque eu já tinha ouvido milhões de vezes a gargalhada convencida que ele deveria ter dado naquele momento, mas era a primeira vez que ela soava tão aguda. — Só estamos aproveitando o final de semana. — Ele me puxou ainda mais para perto.

Era tão quente estar assim com um garoto que meu cérebro com certeza entrou em pane dessa vez. Quando dei por mim, estava deixando o restaurante quase abraçada a Mamoru. Não fazia ideia de como Takayuki-san reagira àquela farsa.

— Que quarto que vamos? — perguntei depois que já tínhamos passado pelo corredor e retornáramos ao saguão. Precisei pular para longe dele antes que perdesse os sentidos e agora disfarçava minha respiração ofegante com um acesso de tosse — É outra investigação? — Não consegui imprimir a animação com que eu o diria em circunstâncias normais, quando metade de mim não tinha um cheiro tão bom.

— Foi só pra... — Mamoru me olhou de volta. — Você não entendeu mesmo?

Neguei com a cabeça. Meus pensamentos estavam voltando ao normal depois de toda a emoção, mas ainda não o bastante para entender o que fosse aquele quarto.

Ele sorriu e estalou a língua.

— Deixa pra outra hora.

Eu podia insistir, ameaçá-lo até que se explicasse, mas os sensores do meu cérebro ainda tavam desconectados demais.

— Mas obrigada pela ajuda. E pelo chocolate, apesar de que o hotel é seu então...

— Dos meus pais adotivos; não é meu. E mesmo assim, acha que temos vacas leiteiras aqui? Plantação de cacau? Trabalho escravo?

— Ai, já entendi! — tentei falar aborrecida, mas acabei de rindo. — Já te agradeci, não é? Ainda bem que o Takayuki-san não é lá tão esperto.

— Do que tá falando?

— Porque até eu que não sou sua irmã saberia na hora que você tava mentindo. — Ri de novo, só de me recordar de como Mamoru não soara ele mesmo. — Não tente a carreira de ator.

Mamoru pareceu incrédulo, ficando parado por um momento com a boca entreaberta. Aliás, incrédula também estava eu que havia conseguido desarmá-lo sem nem estar tentando.

— Fiz bem mais do que você tinha pedido e fiz muito melhor. Agora ele sabe que você não é só uma criancinha.

Assenti com condescendência.

— Eu não fui nem um pouco óbvio — continuou, e estava claramente desesperado para provar seu ponto. — Você é que sabia que era mentira, sua Cabecinha de Vento.

Assenti mais uma vez, mas não aguentei mais segurar a gargalhada.

— Vai brincar por aí, vai. E aproveita pra estudar pras provas em vez de ficar de recuperação. — Mamoru me deu as costas e subiu as escadas, provavelmente para onde era o quarto dele.

De propósito, ri ainda mais alto.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

Depois de um longo cochilo e a cabeça mais tranquila — exceto pela parte que isso se devia à ajuda de Mamoru —, era hora de ir até o onsen. Meu pais continuavam desaparecidos pela cidade, ou talvez lá mesmo e meu irmão estava jogando alguma coisa no outro canto do quarto. Então, eu me levantei do futon e fui sozinha mesmo. Queria estar com a pele cintilando no jantar quando Takayuki-san me visse de novo.

Parei na entrada e li o aviso com calma. Realmente alertavam que, depois da meia-noite, o onsen passava a ser misto e para maiores de idade. Aquilo não fazia sentido algum, a menos que quisessem causar confusão, como o que aconteceu comigo. Como filho dos donos — ou filho adotivo, como Mamoru gostava tanto de destacar —, ele devia alertá-los. Mas, pensando bem, muitos hotéis nem mesmo deixariam o onsen aberto depois de certa hora da noite, e se os pais dele acabarem fazendo o mesmo? E por que eu devia me preocupar se as chances de algum dia eu voltar aqui eram quase zero?

Foi porque estava nos pensamentos que fiz uma curva errada e abri um dos armários para suprimentos em vez de virar para os armários onde podíamos armazenar nossos pertences.

E algo pesado caiu na minha direção.

— AAAAAAAAAAAAAAAAH!!! — pulei para trás jogando fora o que fosse, completando com mais uns dez tapas no ar para garantir que não tinha sobrado nada em mim. Caí de bunda contra a outra parede, mas ainda estava tentando me afastar quando um lado mais são da minha cabeça sugeriu com a voz bem baixa: “Isso não é uma pessoa?” Pisquei algumas vezes, conferi de novo de nada tinha grudado em mim e olhei para o que tinha me atacado.

— Senhorita, está tudo bem? — Alguma funcionária do hotel apareceu na entrada. Do outro lado, duas mulheres também vieram do onsen, se escondendo nas toalhas, mas esticando a cabeça para ver o...

— É-É um c-corpo? — perguntei quando enfim olhei. Uma mulher de cabelo bem longo e uniforme do hotel tava caída no chão numa posição longe de natural. — Ou um boneco? — acrescentei com alguma esperança.

A funcionária também olhava hesitante de se aproximar.

Juntando toda a minha coragem e experiência como Sailor Moon, esgueirei pelo chão e toquei a mulher caída. Pulei de volta pra trás no instante seguinte.

— É um corpo! — gritei umas cem vezes mais alto que planejava.

— Suzuki-san! — a funcionária gritou logo depois. Ela se agachou do lado de Suzuki-san e começou a mexer com ela.

— É melhor não tocar — disse uma das clientes do onsen. — Alguém a pôs nesse armário, né? — Ela apontou pro armário que eu tinha aberto.

Concordei trêmula.

— Mas ela tá viva! — A funcionária agora estava chorosa, acertando a posição de Suzuki-san e tentando acordá-la. — Suzuki-san? Suzuki-san? — ela a chamava desesperada.

— O que está acontecendo aqui?

Apesar de todo o barulho que fazíamos, todas olhamos mudas para Takayuki-san, que aparecera à porta como se fosse o professor responsável da sala.

— O que houve com ela? Por que ninguém chamou um médico? — Ele tirou o celular do bolso e ligou para a emergência.

Todas continuamos mudas enquanto ele nos afastava da pobre Suzuki-san e nos mandava de volta aos nossos quartos. Olhei uma última vez para ela, e me senti uma idiota por não ter percebido isso antes. Depois de tantos monstros e casos que enfrentara como Sailor Moon, não era pra eu estar tão abalada com mais um. Era um cenário clássico de alguém que tivera sua energia sugada por algum monstro do Dark Kingdom.

Passei os olhos por todo o lugar antes que estivesse completamente fora junto com as hóspedes e a funcionária amiga da Suzuki-san. Nenhum sinal de youma por perto. Takayuki-san ficaria bem esperando ali sozinho pela ambulância. Enquanto isso, eu tinha que investigar mais para não ser pega de surpresa de novo.

Se a Luna estivesse aqui pra me ouvir nem ia acreditar!

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

Depois que me afastei do grupo, ocupado demais perguntando tudo da vida da Suzuki-san, apertei o passo para fazer uma varredura pelo hotel. O ideal seria eu olhar o onsen primeiro, mas o lado das mulheres estava extraoficialmente interditado e os homens logo se agrupariam do lado deles para saberem o que havia acontecido.

E se o youma estivesse em todos os onsens? Uma canseira me fez parar um pouco, só de considerar a trabalheira de ter que ir a cada um dos trocentos hotéis dali. Mas eu não podia desanimar, eu era a única senshi da região. Se o youma me encontrasse antes e me pegasse de surpresa... e eu ainda tinha que pensar nos meus pais.

— Aconteceu alguma coisa, Cabecinha de Vento? — Mamoru já tinha voltado ao lobby e estava sentado na mesma cadeira de mais cedo, de onde me olhava preocupado. Eu tava fazendo uma cara tão feia assim?

Sacudi a cabeça. Dizer que tinha um monstro sobrenatural à solta não ajudaria aquele momento único — Chiba Mamoru estava me levando a sério.

— Você tá pálida. — Ele se aproximou e pareceu hesitar antes de pôr as costas da mão na minha testa. Se eu tivesse com febre não estaria vermelha?

Cheguei para trás e rompi nosso contato.

— Tá tudo cem por cento tranquilo! — Sorri para dar mais confiança. — Vou lá falar com os meus pais, ok? Até mais tarde! — E corri para o corredor do meu quarto.

Até levei susto quando abri a porta e encontrei meu pai digitando em um notebook. De onde veio aquilo?

— Usagi-chan! Que susto. — Ele riu nervoso e fechou a tampa.

Tentei não imaginar o que diabos ele poderia tá fazendo de tão errado no computador, porque tava bastante suspeito. Em vez disso, perguntei:

— O Shingo saiu?

— Dei um ultimato a ele pra aproveitar o onsen — meu pai respondeu com uma piscada. — Sua mãe tá comprando lembrancinhas. As lojas aqui perto estão muito caras, então, ela foi para mais longe.

— De onde saiu esse notebook? — Estiquei o pescoço e tava pronta para pegar nele quando meu pai me impediu.

— É do trabalho, só umas coisinhas que eu precisava fazer.

— Na sua folga? Que coisa chata isso de trabalhar... — Espreguicei cansada só de pensar em ter que fazer coisas no meu final de semana.

— É melhor adiantar que deixar pra última hora, não era como se eu estivesse fazendo algo.

— É... Será que vão fechar o onsen?

Meu pai franziu a testa.

— Como assim, Usagi?

Depois que contei toda a história, acabei me arrependendo. Como meu pai era jornalista, mesmo que não realmente especializado em casos de youma e sim em cobrir festas e eventos, eu já devia previsto que ele ia querer se aprofundar. Ele devia achar que era médico e a história alguém que vai morrer se ele não prestar socorro. Mas, com um youma à solta, quem estava indo em direção ao perigo era justamente ele, né?

— Vou perguntar melhor pro hotel. Não é estranho que ainda não ouvimos nenhum barulho? Ambulância, polícia, já era pra alguém estar aqui.

Dei de ombros, porque não estava realmente prestando atenção se teve barulho ou não. Sabia que Suzuki-san ficaria bem desde que não encontrasse o monstro de novo.

— Não saia do quarto e tranque bem a porta quando eu passar. — Meu pai largou o notebook misterioso na mesinha em que estava e saiu decidido.

Mordi meu lábio inferior. Não gostava disso de meu pai estar procurando problemas... Mas ele só ia perguntar por aí, né? Peguei minha bolsa com o broche, o Cetro Lunar e o comunicador e os olhei por um longo período. Chamava ou não as meninas?

Antes de decidir minha mão já o tinha feito. O rosto da Ami-chan apareceu na tela do comunicador.

— Eu não sei de nada, Usagi-chan — ela disse rapidamente, olhando para algo fora da tela.

— Hã? Eu já tinha dito alguma coisa? — perguntei confusa. Não esperava que a Ami-chan realmente pudesse explicar sobre a Suzuki-san, só ia avisar que talvez fosse precisar de ajuda.

— Rei-chan me mostrou tudo o que tem te mandado e prefiro não me envolver no assunto. Já estamos no final deste semestre e estou quase atrasada com os estudos.

Assenti sem entender ainda, quase atrasada não queria dizer que ela estava em dia?

— Desculpa, Usagi-chan, mas preciso ir. Está tudo bem aqui, não se preocupe. — Ami desligou sem esperar que eu me despedisse. Pior, sem nem ouvir sobre o monstro que possivelmente estava atacando o hotel. E por que ela diria que estava tudo bem?

Cocei minha cabeça, olhando para a parede por mais tempo que seria considerado são. Talvez Ami estivesse mesmo estressada com os estudos, porque não era só impressão minha que aquela conversa tinha sido bem maluca.

— Usagi-chan? — Mako-chan respondeu minha chamada um pouco ofegante. — Eu tô meio ocupada aqui, podemos falar depois que você estiver de volta?

— Ocupada com quê? — Levantei minhas sobrancelhas. — Não me diga que tá perseguindo algum garoto que parece seu ex-namorado! — brinquei, mas depois percebi que era bem capaz de ser algo assim.

Mako-chan riu nervosa.

— Como adivinhou, né? Preciso ir agora, aproveite o final de semana! — E desligou.

Ela nem perguntou por que eu tinha ligado. Mas que diabos tava acontecendo enquanto eu tava aqui? Já estabelecemos antes que não era meu aniversário, então não podia ser uma festa surpresa.

— Que foi? — Rei-chan me encarava com mau humor.

— Pra quem se divertiu tanto no show dos Edgers, você tá com uma cara horrível.

E ela desligou.

Quê!? Sem nem dar uma desculpinha? Sem nem mesmo me avisar? E se elas estivessem com a data errada do meu aniversário? Eu podia fingir na festa surpresa, não estragar todo esse esforço.

Mas antes disso eu precisava falar sobre o monstro!

— Usagi-chan? — Luna pelo menos parecia a mesma gata preta de sempre. O que não queria dizer nada, já que ela nunca tivera qualquer paciência pra mim.

— Aconteceu alguma coisa aqui, Luna.

— O que houve? — ela soava mais alerta. Enfim, alguém me dava ouvidos.

— É que eu tava indo pro onsen e errei a porta, acabei abrindo um armário do pessoal da manutenção. Aí de repente caiu uma coisa em cima de mim e eu dei um pulo com o susto e bati na parede achei até que—

— Usagi-chan, — ela me interrompeu —, estamos todas cuidando da cidade enquanto você descansa. Não fique nos ligando à toa só pra contar historinhas. — E a Luna, minha última esperança, desligou.

Claro, eu podia ligar de volta pra qualquer uma e contar a história toda. Só que... e se a Suzuki-san só tivesse ficado presa naquele armário? Melhor ainda: e se eu resolvesse o caso, exterminasse o youma sozinha e depois esfregasse na cara delas?

Não podia acreditar que ainda não tinha tido aquela ideia antes. Rei vinha duvidando da minha capacidade de ser líder e a Luna nem me deixou contar a história toda, porque achou que eu só tava contando besteira. Então que assim fosse! Desta vez, Sailor Moon provaria por que era a melhor senshi!

Peguei meu cetro e meu broche e saí decidida do quarto. Não iria me esconder; iria garantir a segurança da minha família e de todos daquele hotel. Esta senshi aqui não estava ocupada demais pra fazer o trabalho dela!

— Usagi! — Mamoru estava bem do lado de fora, como se estivesse prestes a bater à porta.

Inclinei a cabeça, olhei minha porta, olhei de volta para confirmar que era mesmo o Mamoru.

— Você tava vindo pro meu quarto?

— Entre aí. — ele me segurou o ombro, abriu o quarto e me pôs lá de volta. Então, trancou a porta atrás de si.

— Q-que pensa que está fazendo? Eu preciso ir... — Corri meus olhos pelo quarto pensando em qualquer coisa que não fosse “procurar um monstro pra salvar a cidade”. — Com o meu pai! Ele tá me esperando logo ali. — Apontei para onde imaginava ser o saguão e avancei para a porta.

Mas Mamoru segurou meus braços e me olhou nos olhos.

— Você fica aqui comigo.

Continuará...

Anita, 10/12/2018

Notas da Autora:

Muito obrigada por continuarem acompanhando a história, especialmente aqueles que comentaram, Pandora Imperatrix, James Birdsong, Spooky e Timbi (e ao filhinho dela por dar uma pausinha pra mamãe vir aqui me prestigiar!)

A quem já estava perguntando, o capítulo já começou explicando que o Mamoru é adotado mesmo, rs. A Pandora também me perguntou sobre o monumento que apareceu no segundo capítulo, tudo inventado. Eu até vi algo no Google acho, mas era uma obra de arte, acho que não usavam de marco pra nada, eu só precisava de uma inspiração pra fic e tcharan, achei essa foto, haha.

Tomara que continuem acompanhando e gostando da fic, até a próxima!

Capítulo Seguinte

Um comentário:

  1. Tá tão legal a fic, Anita! Não esperava que teríamos um youma na história XD Quero a continuação!

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