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[Sailor Moon] Cada Vez que nos Encontramos, Cada Vez que nos Separamos - Capítulo 11, escrita por Anita

Autora: Anita
Fandom: Sailor Moon
Gênero: Comédia romântica, Realidade alternativa
Classificação: 14 anos
Status: em andamento
Resumo: Usagi/Mamoru. Usagi está na faculdade e acaba de terminar com Seiya, seu primeiro namorado de toda a vida, quando decide aceitar um emprego de meio período no bar de seu amor de adolescência, Motoki. Entre os desafios dessa aventura, o passado decide reaparecer na sua frente, especialmente quando o homem que mais a atazanava retorna a Tóquio, Mamoru. Ela percebe então um conflito entre o que sente por Seiya e por Mamoru. A história também vai explorar os romances de cada uma das senshi! 

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Olho Azul 20 Anos Apresenta:

Cada Vez que nos Encontramos,
Cada Vez que nos Separamos


Capítulo 11 — Ligações

  Os olhos de Usagi não conseguiam desgrudar da barraca de hambúrguer gigante e sua barriga grunhia cada vez mais alto. Mas tudo o que conseguira juntar de suas moedas, troco do almoço e do trem até o shopping onde se encontrara com Minako, foram duzentos ienes. Mais da metade seria necessária para o trem de volta, como quer que pudesse fazer para voltar. Não sabia onde a estação estava, ou mesmo qual linha seria aquela. O celular em sua mão começou a vibrar e ela o atendeu aborrecida. Havia tentado ligar para Mamoru assim que se percebera perdida e ele a ignorara.

— O que foi? — perguntou, não contendo a irritação.

Onde você está? Acabei de chegar ao quarto do hotel.

— Não te interessa.

Aconteceu alguma coisa?

  Ao sentir a respiração falhar em razão das lágrimas que lhe vinham, Usagi fechou o aparelho. Olhou de volta e, antes que Mamoru retornasse, ela abriu apenas para apertar o botão de desligar tempo o bastante para ler a despedida na tela e o fechou como se estivesse desligando mais uma vez na cara do outro.

— Hum! — fez contrariada com a garganta, imaginando a expressão de Mamoru naquela hora, mas não conseguindo nem mesmo sorrir. Estava com fome demais para aquilo.

  Retornou sua atenção para a barraca a tempo de ver um grupo de estudantes comprando seus hambúrgueres. Pareciam tão bons... E aquele grupo a fazia se sentir sozinha. Talvez não devesse ter vindo com Mamoru, ainda não estava pronta para aquele tipo de viagem. Precisava de um grupo para que nunca ficasse só, a menos que o desejasse.

— Dois hambúrgueres, por favor. Vou comer aqui, com esta moça — ouviu alguém dizer, um homem de camiseta polo e calça jeans, com uma câmera enorme no pescoço. Ele sorriu para o dono que agora também sorria, mas para o suposto casal que via à sua frente.

— Seiya!? — Usagi exclamou bem alto.

— Eu tava ali na rua comercial quando vi de longe um cabelo bem loiro passando por aqui.

  Usagi olhou para a direção oposta da que viera e percebeu haver uma rua coberta, além de uma loja de donuts.

— Você... enxerga bem — disse a moça, sinceramente impressionada.

— Eu achei que estava era doido. O que Usagi Tsukino estaria fazendo no meio de Nagasaki? Você mesma tinha me dito que não devia conseguir folga do trabalho pra viajarmos. Aí a Minako arruma este passeio com a gente também. Pra mim, você estaria direto naquele bar. — Seiya limpou o suor da testa. — Mas, nossa, parece que já é verão aqui, né? Em poucas horas já vai anoitecer, mas eu devo virar suco antes disso.

  Usagi não conseguia deixar de encará-lo. Aquele era o mesmo Seiya? O mesmo com quem ela havia terminado tudo havia bem pouco tempo? O mesmo que se recusara a falar com ela no telefone não fosse para reatarem? Era tal como se houvessem voltado ao tempo anterior ao namoro; Seiya estava simplesmente lhe sendo um amigo.

  Teria ela desmaiado de fome e aquilo era um sonho?

  O dono da loja entregou-lhe uma sacola com os dois hambúrgueres e agora Usagi os olhava incerta de como proceder naquela situação. Era verdade que havia uma longa lista de questão mal resolvidas, mas não podia negar que Seiya mais parecia um príncipe encantado pronto para salvá-la. Talvez percebendo como ela o estudava, Seiya balançou a sacola e lhe sorriu:

— Vamos sentar e comer logo? Você parece que não vê comida há uns dez minutos, deve estar faminta!

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

  Após mais algumas tentativas frustradas de contato com Usagi, Mamoru guardou o celular de qualquer jeito no bolso. Só confirmou que tinha sua carteira antes de descer correndo as escadas do hotel; não havia como ficar parado esperando o elevador.

  Havia situações em novelas e livros que o mocinho saía correndo pela cidade para encontrar sua amada em algum lugar com significado para o casal. Infelizmente, ele nem seria o mocinho daquela história. Nem mesmo havia conseguido tirar Usagi das mãos de seu ex-namorado; apenas destruíra de alguma forma o romance dos dois. Neste caso, Mamoru era o vilão? Em algum momento de sua estada em Nagasaki, Usagi o havia percebido e agora estava fugindo dele?

  Não, não precisava fazer tanto drama. Ela provavelmente apenas havia se aborrecido com sua demora em voltar do almoço. Mas nem ficara tanto tempo. Prometera-lhe voltar antes da janta. Até lhe enviara uma mensagem, para indicar que não a havia esquecido. Mas Usagi não a respondera. Depois, ela lhe telefonara justo quando ele estava no elevador do hotel. Isto poderia tê-la aborrecido. Isto sim era bastante provável. Não obstante a hipótese de que poderia ser só um aborrecimento pontual, a situação indefinida deles agravava o mau pressentimento que lhe descia a espinha.

  E era culpa dele. Ele nunca tinha sido realmente honesto sobre seus sentimentos, nem mesmo consigo mesmo. Claro, tinha suas razões; já achava que tinha perdido Usagi naquela noite em que se abriu e lhe propôs um relacionamento. Mesmo que Mamoru encontrasse justificativas, ele sabia que essas razões não eram válidas para Usagi.

  Andando a largos passos desesperados pelos arredores do hotel, procurou-a nas poucas lojas de conveniência e lanchonetes. Sem sucesso ainda, voltou para dentro e perguntou no saguão sobre quando Usagi tinha entregado a chave do quarto para a limpeza. Contudo, já se havia passado mais de um turno, e a pessoa que estava atendendo não estava mais ali. Frustrado, Mamoru dirigiu-se aos panfletos turísticos e encontrou aquele que Usagi sempre carregava consigo. Examinou cada sugestão que ainda não tinham explorado. Se ela tivesse decidido passear sozinha pela cidade. Mas não haveria muito mais tempo para passeios; a maioria das atrações fechavam por volta das cinco ou seis da tarde e já eram quase seis.

  A razão lhe aconselhava a deixar estar. Usagi estava bem quando se falaram. Aborrecida, mas em segurança. E qualquer problema, ela lhe ligaria. E era certo que Mamoru não havia lhe feito nada tão ruim; nem sequer estivera com ela o dia inteiro. E não ir com ele tinha sido uma escolha dela. Mesmo imaginando que poderia ser um evento chato para alguém como Usagi, ele a havia convidado para conhecer o ex-chefe, havia algo dentro dele de querer que o encontro acontecesse.

  Apesar de a razão lhe buzinar os ouvidos, porém, seu corpo estava mais uma vez no lado de fora. Voltou a andar pelo centro, procurando lojas. Seguiu o mapa até uma tal ponte que quando refletida formava uns óculos. Ficava em uma longa rua a quase meia hora do centro. Casas antigas seguiam por lá e havia supostamente um templo mais ao norte, mas que estaria fechado àquela hora. Prestou melhor atenção ao mapa. Havia alguns locais históricos subindo monte Kameyama, mas Usagi não iria lá por conta própria, não quando ela teria que subir aquilo tudo de morro.

  Uma vertigem o atingiu e Mamoru quase se agachou no meio da rua. Sua razão estava cansada agora que começava a anoitecer e o desespero começava a lhe tomar conta. Usagi ainda não tinha ligado. O pensamento que ele vinha calando voltava com força.

  E se ela não estava mais em Nagasaki?

  Ele deveria era ter ido à rodoviária, perguntar lá se alguém vira Usagi. Ela chamava atenção o bastante, certo? Não realmente, concluiu aflito. De fato, uma jovem sozinha indo para o aeroporto no meio da golden week poderia ser curioso o bastante que eles reparassem. Mas não haveria certeza de que seria Usagi. E aí ele faria o quê? Entrar como um louco num táxi pro aeroporto? Pegar o primeiro avião de volta e procurá-la em casa?

  Seus olhos estavam ardendo, mas ele se convenceu de que era apenas cansaço. Voltou a conferir o mapa. Ainda havia uma última esperança. A pouco mais de dez minutos dali, havia uma rua comercial chamada Hamanomachi Arcade, um distrito bastante famoso pela vida noturna, dizia o guia. Um destino provável para alguém da idade de Usagi, pois era um lugar para jovens.

  Lembrava-se da China Town local de quando estava morando ali e ainda de um shopping perto da estação das barcas. Usagi poderia ter ido a ambos também, tanto por comida como por lazer. Tinha muito campo que cobrir antes de estender a busca pra Tóquio.

  Caminhou por uma rua que quase continuava a da ponte. Pouco depois, chegou à rua mais famosa, repleta de fotos de Ryoma Sakamoto, o herói nacional que por um tempo vivera na cidade. Mas não era como se Usagi ligasse muito para ele, lembrou-se. Mamoru tinha mencionado no dia anterior que havia uma estátua dele com uma vista interessante e ainda um mirante com botas que representavam os calçados usados pelo samurai da Revolução Meiji e a reação de Usagi fora entortar o nariz e perguntar se o aquário de pinguins seria caro.

  Mamoru logo se sentiu murchar. Eram seis e meia da tarde e Usagi não estava em nenhum restaurante. Não haveria outro destino naquele horário, mas Mamoru também havia conferido até as lojas mais improváveis. Após subir ao segundo piso de um Mc Donald’s, quase no final da rua, ele suspirou.

  Ela estava no aeroporto. Ou em um avião. E iria reatar com o ex-namorado. Agora que começara, a mente de Mamoru não conseguia parar de lhe mostrar todos os pensamentos, uma construção aparentemente racional de o que Usagi estaria fazendo no momento. Mamoru era a transição, aquele que viera logo após um relacionamento intenso e significativo. Nunca daria certo. Pior, era certo de terminar em desastre. Ela não encontraria outro, Usagi simplesmente o deixaria. Eles estavam em um relacionamento em que o sentimento era apenas para conforto mútuo. Não importava o quanto ele havia posto suas próprias cartas na mesa, o quanto ele havia querido mudar isso. Mamoru causara aquela situação e não chegaria a tempo a Tóquio para mudá-la, porque tudo já estava solidificado contra ele naquela primeira noite em seu apartamento. A ordem deles estava errada demais...

  Ele chegou ao final da rua. Havia um Mr. Donuts e um restaurante de gyudon, ambos sem qualquer vestígio dela. Notou mais uma rua após o restaurante e ao virá-la achou que estava tendo visões. Usagi estava agachada em um canto, enquanto seu ex-namorado se encontrava de pé, olhando para o alto e lhe falando alguma coisa. Mas olhou novamente e eles dois ainda conversavam tranquilos ao lado de uma barraca fechada.

  Seus pesadelos tinham acontecido da forma mais louca.

“Usagi ligou para que ele viesse até Nagasaki?” pensou, segurando o braço com a mão. Apertando-o para controlar sua raiva que fervia em seu estômago de si mesmo, de como deixara a situação lhe fugir do controle apenas por mais umas noites com Usagi. Por que ele fora propor o namoro? Dizer sobre como se sentia? Antes continuassem apenas como um caso. Agora que havia experimentado dias calmos com Usagi a seu lado, como ele conseguiria voltar à sua vida normal?

  Uma imagem mental da mala desarrumada de Usagi no chão do quarto do hotel. E se ela estivesse fazendo hora com Seiya para juntar tudo e sumir? Como seria não vê-la quando acordasse no dia seguinte?

  Não obstante reconhecer que não possuía qualquer direito sobre Usagi, Mamoru marchou até os dois. Não queria admitir que a havia perdido quando ela mais lhe parecia próxima, como fora naquela viagem, quando dormiram agarrados toda a noite.

  Seiya foi o primeiro a percebê-lo, acertando a postura. Usagi se levantou assustada e olhou para os dois. Seus olhos estavam vermelhos. Agora Mamoru se sentia um intruso. Era um intruso. Devia só ter dado a maia volta e esperado por Usagi no quarto do hotel; ela teria que voltar lá pelo menos para a sua mala.

  Seiya lhe estendeu-lhe a mão e disse:

— Ainda não fomos apresentados, né? Eu me chamo Seiya Coe. Usagi estava me falando sobre vocês dois.

— Mamoru Chiba.

  Não era tão incomum Mamoru apertar mãos com outras pessoas por causa de seu trabalho, mas sentiu-se estranho por ser a daquele homem; novamente se percebia o vilão da história. Olhou para Usagi e engoliu em seco. Voltando-se novamente para Seiya, viu que ele não parecia tão feliz como tentava fazer parecer pelo tom despreocupado de voz.

— Mamoru, pode pagar mil ienes ao Seiya? — pediu Usagi, quando ficou claro que Mamoru não diria mais nada. — Ele me comprou um hambúrguer e um suco, mas eu não tenho dinheiro.

  Normalmente, um homem pagava sem esperar que esta lhe devolvesse. Seiya não parecia feliz de ouvir que não seria assim, mas não disse nada sobre “esquecer”, “deixar para lá”, ou “da próxima você paga pra mim”.

  Tentando não pensar, porque parecia rude pensar naquilo, Mamoru pegou a carteira e de lá tentou escolher a melhor nota.

  Ressarcido, Seiya se voltou para Usagi.

— Foi bom conversarmos — disse-lhe. Em seguida, voltou-se para Mamoru e se curvou um pouco apenas para partir na mesma direção de que Mamoru viera.

  Usagi apenas acenava a ele sem sorrir.

— Vamos jantar agora, né? — perguntou-lhe assim que Seiya virara em direção à estação mais próxima. Antes da resposta, começou a andar na direção oposta.

  Mamoru não fazia ideia se ela sabia que estava indo para ainda mais longe do hotel e da estação mais próxima, mas a seguiu em silêncio. Não importava.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

  Makoto largou com um baque uma bandeja na frente de Usagi, que apenas estava olhando para o nada em vez de cuidar do bar. Usagi olhou para os copos com cerveja e de volta para a amiga, sem entender.

— Serve a mesa do fundo, eu que não volto lá — pediu, virando os olhos.

  Usagi protestou, mas acedeu. Ao menos o mau humor de Makoto não era com ela.

  Parecia que uma de suas maiores funções era lidar com clientes que tendessem a embaraçar as meninas que trabalhavam ali. Makoto e Rei sempre acabavam lhe empurrando essas pessoas; esta pelo prazer de alegar sua imunidade, Makoto simplesmente por achar que Usagi lidava melhor com a situação e que clientes precisavam estar vivos para pagar a conta no final da noite. Fosse como fosse, Usagi nunca realmente se sentira assediada e, muitas vezes até acabava se divertindo no karaokê com esses mesmos clientes, ou até ouvindo histórias de primeiro amor ou amores igualmente excitantes.

  Ao retornar da mesa, com todas as partes do corpo intocadas, Usagi percebeu que Makoto lia o folheto que a própria trouxera de uma palestra na faculdade, à qual tivera que comparecer apesar de as férias de verão haverem se iniciado naquela segunda. Era difícil acreditar que já fazia dois meses desde a viagem para Nagasaki na Golden Week, e agora sua amiga estava assistindo a palestras sobre busca de emprego. Por que o tempo estava voando?

— Você também vai procurar emprego, é? — perguntou-lhe.

— Acho que sim, é o que todo mundo faz, acho... — Makoto sorriu.

— Mas você vai continuar aqui no Motoki, né? Ele sempre diz que você é a sucessora dele!

— Na verdade... — Seu olhar desceu ao papel sobre o balcão. — Eu comecei um meio-período em outro bar, como experiência. É só um dia na semana, não vai atrapalhar aqui. Eles sabem que eu tenho o Drunk Crown e tudo.

— Como assim?

— Bem, ano que vem precisamos nos concentrar ainda mais nas entrevistas de emprego, né? Eu tô pensando em achar algo certo, que não seja um bar. Mas se for para ser um bar, eu... eu tenho pensado em não ser este.

— Mas por quê?

— Onde está o Motoki agora?

  Usagi pensou na resposta, mas não tinha certeza, apenas que o patrão viajara na segunda-feira com a atual namorada — sua ex-noiva. Abriu a boca ao perceber o que Makoto tinha querido dizer com a pergunta.

  A porta do bar se abriu para interrompê-las e Rei entrou. Não, marchou até o balcão, onde se sentou com o punho firme, exigindo uma bebida.

— Mas qual delas? — perguntou Makoto confusa, levando os olhos até o monte de garrafas coloridas que tinham para preparar os drinques.

— Cerveja. É, isso aí. O maior copo de cerveja! E umas rodelas de alho pra acompanhar.

  Usagi olhou confusa para Makoto, como se perguntando se era para anotar o pedido.

— Aconteceu alguma coisa com a Ami? — perguntou a Rei.

— Claro que não. A idiota continua sem brigar pelo cafajeste. — Rei balançou a mão como quem dizia para nem tocarem mais no assunto. Então olhou para as duas, que riam abertamente, e falou: — Não vão me atender, não? A maior cerveja e rodelas de alho. Pra ontem! Aliás, cadê o Motoki pra pôr ordem aqui? — Esticou o pescoço, como se pudesse enxergar a cozinha.

— Não está. — Makoto virou-se para a cozinha logo em seguida.

  Rei franziu as sobrancelhas quando concluiu:

— Com a namorada?

— É, viajaram e só voltam amanhã de tarde.

  Assim que ouviu a resposta de Usagi, Rei se levantou e esticou o corpo ainda mais que antes.

— Makoto, larga de ser boba e põe ele logo contra a parede!

  A mais alta apareceu da cozinha levemente pálida, espiou o arredor, mas os clientes seguiram suas atividades e fizeram-se de desentendidos. Sem demonstrar se ela tinha percebido que eles só estavam fingindo, Makoto voltou para o interior e enfim trouxe o pedido de Rei. Usagi correu para servir a cerveja.

— Eu estava falando com a Usagi — Makoto continuava a conversa como se nada tivesse acontecido, os olhos no prato intocado de Rei — que vou largar aqui. Estou em experiência noutro bar lá perto de casa, vamos ver se funciona. Sabe, é um caso diferente do da sua amiga. Nunca tivemos nada, nossa relação é profissional e é isso.

— Quer dizer que é você quem não quer o bastante?

— Não, sou eu admitindo que perdi. Motoki nunca me olhou como mais que uma irmã mais nova. Agora posso sair em paz daqui e deixar tudo com vocês duas. — E sorriu.

— Só pode ser vingança, né? — Rei escarneceu, de olho em Usagi. — Deixar o coitado com a Usagi...

— Eeei! — reclamou.

  Makoto gargalhou de leve.

— Ele sempre pode contar com você também, Rei. E nos finais de semana há bastante gente.

— Não sei sobre os outros, mas a Usagi é inútil. E eu mesma não ficarei por tanto mais tempo. — Suspirou. — Meu pai... — Rei deu uma pausa para suspirar de novo, enquanto Usagi prendeu a respiração. O pai dela. O pai dela que era o ex-chefe de Mamoru. Era a primeira vez que a ouvia mencioná-lo de verdade. — Nós não nos damos nada bem, mas agora que estou no penúltimo ano da faculdade ele quer que eu me case com alguém que possa suceder os negócios. Ele já até escolheu quem, acreditam? — Riu-se, ajeitando os longos cabelos. Antes de prosseguir, tomou um longo gole da cerveja. — Isso realmente me dá nos nervos!

  Usagi engoliu em seco. Mais de dois meses já se haviam passado desde a viagem para Nagasaki, e ela ainda não conseguira tocar no assunto com Mamoru sobre o que ele faria tanto quanto o casamento como quanto a transferência. Não era como se qualquer das opções fossem lhe beneficiar.

— Por que não recusa logo? — perguntou Makoto.

— Eu pensei, mas... meu avô está envelhecendo e logo não conseguirá mais cuidar do templo. A verdade é que eu queria assumi-lo, mas não tenho confiança de que poderia mantê-lo como meu avô consegue. Ter o dinheiro do meu pai enquanto alguém mais o administra seria uma ótima forma, né?

— Mas seu pai te excluiria da família assim? Só por isso?

— Não é como se ele fosse morrer antes do meu avô... Mas se eu me casar, eu ficaria próxima o bastante para usar o dinheiro dele caso precise pro templo. Sem contar que ele me deu a entender que também poderia acabar adotando alguém se realmente eu não quisesse fazer isto. Só o fato de eu não estar sendo obrigada abertamente me deixa simplesmente... — Ela bebeu mais alguns goles para ilustrar o que dizia. — E me casar com um estranho! Mesmo que seja quando eu me formar e até lá eu possa conhecê-lo melhor... É enfurecedor!

  Usagi olhou para as próprias mãos, ela estava puxando seus dedos e se beliscando a cada palavra. Vinha se prendendo em um último fio de esperança: o de Rei nem estar sabendo ainda dos planos de casamento arranjado e que seria compatível com seu jeito acabar por rejeitar toda a ideia. Agora, ele estava se partindo.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

  Usagi percorreu os olhos pelo bar mais uma vez e de novo para o celular em sua mão. Não sabia o que fazer. Discou novamente o número de Motoki, mas continuava retornando um aviso de que o aparelho estava desligado. Aquele não estava sendo um dia muito bom, concluiu. Já eram quase onze da noite e de repente vários clientes começaram a aparecer de um jeito que faziam quando queriam ficar até tarde, e Usagi não queria simplesmente mandá-los embora quando mal começaram a consumir.

— Nada? — perguntou Makoto após entregar a segunda rodada de bebidas para uma das novas mesas.

  Usagi balançou a cabeça.

— Antes Rei não houvesse ido embora, ela poderia ficar aqui até quando quisesse. — Makoto bufou com força. — Se bem que ela já tava mais pra lá que pra cá, né? Mais um pouco e conheceríamos um novo lado daquela lá. — Riu-se.

  Usagi não queria se lembrar da visita de Rei, isto a fazia recordar outras coisas e já estava com um problemão agora se não achasse Motoki. Não que ela já não viesse pensando nisso o tempo todo. Em Nagasaki, o único assunto que parecia haver se resolvido era Seiya, o que já era alguma coisa. Só que faltava muito. Agora, como Seiya mesmo lhe dissera, podiam se considerar um caso concluído. Era um pouco triste, mas após tantos meses separados, Usagi via que fizera o certo terminando. No final, Mamoru tinha razão, parecera horrível na época, mas foi passando e no momento era um alívio.

  Infelizmente, era o único alívio para Usagi. Exceto talvez pelo trabalho no bar. Já fazia seis meses desde que começara e não se arrependia de aceitar o convite de Motoki. Graças àquele lugar, ela tinha se conectado com Mamoru e iria poder continuar a vê-lo mesmo depois. Ou não? Rei não iria precisar de renda extra se eles se casassem.

  Mas antes de isso acontecer, os dois tinham uma desculpa para se verem ocasionalmente. Ultimamente, Usagi vinha tentando ignorar e engolir qualquer desconfiança de que ele pudesse estar se encontrando com outra nos dias em que não o via. Por mais improvável que fosse, pois Mamoru sempre lhe deixara claro que não gastava energia atrás de mulheres, não deixava de ser um risco. Um dia, ela encontraria algum objeto no apartamento que não era dele. Com esse medo, ela já tinha pensado muitas vezes em retomar o assunto do namoro, mas reconsiderara. Não queria cair no mesmo erro de Seiya, namorar apenas porque é o mais confortável, empurrar os problemas pra depois. E os problemas com Mamoru eram muito maiores — um casamento! Desde aquela noite em que Mamoru lhe fizera a proposta, ela tinha que se repetir como aquela não era a solução. Havia um tempo limite para estarem juntos, e que devia estar próximo a tirar pelo que Rei tinha dito.

  Olhou a tela do celular, mas luz de fundo já havia apagado. Quanto tempo ficara divagando naquela posição? Percebeu seu cenho carregado, então começou a fazer movimentos circulares no rosto para relaxar.

— E aí? — Makoto perguntava mais uma vez.

— Nada, né... — disse, lembrando-se de por que estava com o aparelho no meio do trabalho. — Mas acho que vou ficar por aqui. Eles vão pagar muito bem. E é férias, né? Seria bom um dinheiro extra.

— Pra gastar com o namorado, né? — brincou Makoto.

  Fazia já mais de dois meses que Usagi ficara desimpedida para assumir sua relação com Mamoru, mas ainda não conseguia apresentá-lo a ninguém. Em qualquer situação, ela acabava falando dele só como o amigo de Motoki, e apenas Naru de tudo. Bem, Motoki também, mas não fora Usagi quem lhe havia contado, e o patrão nunca falava abertamente sobre o que pensava. Quando Usagi interrogou Mamoru sobre toda a gentileza de Motoki lhe deixar viajar durante a golden week, descobrira que Mamoru nunca lhe contara nada e que esclareceria ao amigo assim que voltassem. Usagi não sabia como perguntar a nenhum dos dois o que era exatamente que Mamoru havia esclarecido. Da forma como o caso andava, morreria assim, na escuridão. Ao menos, ninguém lhe faria a cara de pena que fizeram quando ouviram sobre o fim do namoro com Seiya, tornaria a situação mais simples de se lidar.

  Percebeu que Makoto esperava uma resposta. Usagi olhou rápido para o celular e disse que era melhor tentar outra vez.

  Mesmo ciente de que ainda não conseguiria contato, ela apertou para discar novamente. Será que Motoki a estaria evitando para não atrapalhar sua viagem? Uma ira súbita invadiu-lhe. Outros podiam ser felizes enquanto a sua própria fuga a dois para Nagasaki transformara-se em duas pessoas que mal se trocavam palavras. O clima tinha ficado estranho... não, ele tinha ficado ainda mais estranho após Mamoru a ver com Seiya.

  Acabou ligando para o próprio Mamoru depois de outra vez a chamada para Motoki a levar para a caixa postal.

Usagi? — O sono na voz do outro lado da linha era inconfundível.

— Sabe do Motoki?

Motoki? — Mamoru fez silêncio, enquanto Usagi imaginava-o com tanto sono que estivesse se perguntando quem era Motoki. — Ele ainda tá viajando, né?

— Pode ligar pra ele, não tô conseguindo contato e preciso tirar uma dúvida sobre o bar.

Você ainda tá aí? Já são onze e meia da noite... Alguém mais tá contigo, né?

— A Makoto tá, mas logo ela terá que pegar o último trem. Eu devo ficar até os clientes saírem... Ligue pro Motoki, ouviu? Vou ficar esperando. — Desligou.

  Sabia que Mamoru estava pronto para lhe dar lições sobre não ficar sozinha tomando conta do bar. Ele não compreendia como aquela ocupação a fazia se sentir bem. Diferente das manhãs — ou tardes — em que acordava a seu lado.

  Mal teve tempo de respirar aliviada quando ele retornou. Porém, não fez diferença, pois não tinha conseguido falar com Motoki e acrescentou-lhe de deixasse de ser idiota e apenas fechasse o bar. Estas também costumavam ser as instruções de seu patrão, sabia, mas... Olhou ao redor, para o movimento empolgante deixando o salão quase reluzente, e desligou no meio de alguma recomendação ou sermão de Mamoru. Todos estavam tão felizes com seus amigos e bebidas... Um cliente lhe chamava para uma sessão de karaokê. Seus amigos incentivavam.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

  Meia hora após a terem chamado, Rei retornou parecendo mais estar embriagada. Por outro lado, suas roupas estavam longe de parecerem tão arrumadas quanto o normal. Atrás da mesma, entrou Yuichiro.

— Já disse que não preciso de guarda-costas! — gritava irritada com ele, estendendo a palma aberta em sinal de pare, impedindo-o que a seguisse para trás do balcão.

  Makoto a cumprimentou e já foi arrumar suas coisas antes que perdesse o último trem.

— Como faremos com o dinheiro? — perguntou Rei antes que a outra se fosse.

— Hum? O normal, né?

— Vamos, o bar nem estaria aberto não fosse a gente.

— Mas não sabemos o preço das bebidas nem nada.

— Já sei. Por que não anotamos as horas extras e o caixa de agora e depois, Usagi? Aí combinamos com o Motoki. Tem que dar um bom dinheiro! Yuichiro, atenda àquele senhor que tá chamando enquanto isso. — Rei jogou para ele um dos blocos de nota.

  Makoto olhou para Usagi e sorriu. Usagi apenas virou os olhos, estranhando como já estava acostumada com o jeito mandão de Rei.

— O que vocês duas estão cochichando!?

— Só me despedindo, Rei. Valeu por ficar com a Usagi! O namorado dela tava ligando direto preocupado com ela e tudo.

  Ela tinha notado? O rosto de Usagi ficou pálido e seus olhos caíram sobre o celular.

— Bem, é difícil ignorar algo tocando tanto — explicou Makoto, dando uma piscada.

— Você atendeu? — perguntou, tentando imaginar o que Mamoru teria dito.

— Não, não! Só imaginei que fosse isso. — E riu sem se conter. Logo, saiu.

  Rei só esperou que a porta fechasse para perguntar:

— Você não tinha terminado? — Distriu-se apenas por um momento quando Yuichiro retornou com um pedido e ela precisou preparar o drinque. Mas seu olhar ficou em Usagi, aguardando a resposta.

    Usagi não sabia como mudar o assunto sem ser óbvia e queria nem imaginar como ela reagiria quando descobrisse que aquela pessoa era a mesma com quem se casaria. Se fosse ser sincera, não sentia como se estivesse traindo Rei por estar saindo com seu futuro noivo. Era como se fosse Rei quem lhe estivesse roubando Mamoru.

— Eu não tenho namorado, a Makoto só tava brincando — mentiu no final das contas.

— Sei não, você parece bem suspeita... Mas vá trabalhar, anda! Você também, Yuichiro. Para de fofoca!

  Passaram a recolher os copos sujos e anotar mais pedidos. Mas quando Usagi estava para ir à cozinhar preparar os pratos, seu celular vibrou mais uma vez.

  Mamoru ainda não tinha desistido? Era melhor fingir que não existisse, Usagi preferiu não arriscar. A última coisa que gostaria era que Rei soubesse mais como estava a relação deles. Não era mais questão de orgulho, pensou. Era apenas de não aprofundar a ferida.

  Mas ao pegar o aparelho, percebeu que o nome nada tinha a ver com o de Mamoru e suspirou com alívio para atender animada à ligação de Naru.

Usagi... Eu te acordei? — perguntou com a voz um pouco abafada.

— Não! Eu tô aqui no trabalho. Tudo bem contigo?

  Razniu a testa, percebendo haver tempo que não falava com ela. Ela a vira uma vez depois de Nagasaki, em uma das saídas em grupo que Minako tinha organizado. Até Seiya estava lá. Isso fora... um mês antes?

Eu... sou péssima. Você vai me odiar... — Naru fungou alto, mas antes que Usagi pudesse dizer qualquer coisa, continuou: — Masato também... Ele vai me odiar... Mas eu preciso terminar com ele. Por favor, diga para eu não o fazer. Você vai odiar quando ouvir tudo, Usagi. Por favor... Peça para que eu não o faça antes de... — Naru começou a chorar.

  O que dizer em uma situação daquelas? Que fazia muito bem, porque tinha certeza de que ele gosta da outra e não se sabia por que ele tinha escolhido continuar com o noivado? Não, seria a pior resposta para Naru. Ao mesmo tempo, não vinha à sua cabeça qualquer outra, por isso, ela continuou muda até a amiga prosseguir.

  Mas isto se deu no exato momento em que Usagi ouviu Rei cumprimentar um cliente recém-chegado, o tom de voz das boas-vindas quebrado pela surpresa.

Eu me apaixonei pelo Seiya.

  Mamoru entrou quase sem ar no Drunk Crown e, apenas depois de fechar a porta, percebeu que Rei estava bem à sua frente.

Continuará...

Anita, 18/04/2012

Notas da Autora:

Enfim publicando o penúltimo capítulo! Muito obrigada por ter me esperado até aqui, juro que só falta um, mas é um bem longo. Em breve está aí pra vocês. Enquanto isso, por favor, deixem seu comentário.

(24/08/2023)

Próximo Capítulo

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