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[Saint Seiya] Sobre Dívidas e Novas Chances, escrita por Madam Spooky

Título: Sobre Dívidas e Novas Chances
Autor(a): Madam Spooky
Fandom: Saint Seiya
Gêneros: het, geral.
Classificação: Livre
Personagens/Casais: Saori Kido/Aioros de Sagitário. Tatsumi apareceu em uma ou duas cenas sem ser convidado e há um médico OC mais ou menos aleatório.
Resumo: Saori e Aioros forjam uma amizade depois que ele acorda de um coma que já durava vinte anos. Pós-Hades.



Avisos: Neste fanfic os Cavaleiros de Ouro não foram ressuscitados. OOC e instabilidade de gênero. Adoraria dizer que isso aqui é humor ou romance, mas acho que seria forçar a barra.

Devo mencionar que não sei nada sobre os assuntos “Japão”, “Planetários” e “Cemitérios Asiáticos” (a não ser o que a Nemui e a Naru me disseram a respeito desse último, e até isso consegui dar um jeito de distorcer), mas resolvi escrever sobre eles assim mesmo.

Disclaimer: Não me pertencem. E eu sempre tento devolve-los praticamente incólumes.

Notas: Minha presenteada é a Thamy! Novamente! Falei para ela tomar banho de sal grosso, me ignorou agora aguenta. >o<







Saori entrou no consultório do diretor do hospital da Fundação Graad com terremoto nos pés e fogo no olhar – uma expressão que seu avô costumava usar quando ela era criança e deixava seu gênio levar a melhor; algo que gostava de pensar não acontecia com muita frequência esses dias.

Se estivesse de bom humor teria achado engraçada a maneira como as pessoas tratavam de desaparecer da sua frente ultimamente, desde que voltara ao Japão e de forma ainda mais obvia desde que entrara no prédio minutos antes. Era como se ela fosse uma bomba que detonaria com qualquer movimento brusco. Mal sabiam eles que a explosão já tinha acontecido há dias.

Estava ali para ver o diretor Kaitou Chiba, o amigo mais antigo ainda vivo de seu avô. Um homem gentil e de caráter irrepreensível, a quem Mitsumasa confiara o hospital e recebia na própria casa com a cortesia com que trataria um parente. Saori o conhecia desde sempre e tal intimidade tornava a situação ainda mais difícil. Sentia-se irracionalmente traída, confusa e envergonhada. A maneira emocional como agira durante a conversa que tiveram na última vez em que se encontraram fora imperdoável para alguém na sua posição. Agira como a herdeira mimada que costumava ser e o fato do médico não ter demonstrado surpresa com isso adicionava combustível a sua humilhação.

Estremecia ao lembrar como tinha protestado; se negado a aceitar o que estava ouvindo; até mesmo levantado a voz, como se gritar fosse mudar alguma coisa. Tudo isso enquanto o homem beirando os oitenta a encarava apologeticamente. Aquele olhar tinha sido o que a irritara mais. Sabia que o médico tinha apenas sido leal às instruções de seu avô e jamais sentiria remorso por isso. Se ele se desculpara fora apenas para aplacar sua reação.

Depois do encontro ela voara de volta para a Grécia, para o isolamento do Santuário, onde poderia ignorar as ligações do médico e pensar no que deveria ser feito. Tinha passado aqueles dias vagando pelas Doze Casas vazias, fingindo que ainda estavam ocupadas e esforçando-se para elevar seu cosmos e sentir alguma presença. Qualquer presença.

Não havia nada. As altivas Doze Casas Zodiacais agora não passavam de cascas vazias esperando que uma nova geração voltasse a ocupa-las. O silêncio era doloroso. Fazia-a lembrar de que tinha sobrevivido enquanto pessoas com quem se importava não tiveram a mesma chance. Estava consciente de que fizera o possível, de que tentara traze-los de volta do Mundo dos Mortos junto com ela e que teria felizmente se sacrificado em troca de suas vidas. Saber disso, porém, não era grande consolo. No final nem mesmo Athena tinha sido forte o bastante para desafiar a tesoura de Átropos.

Pelo menos os Cavaleiros de Bronze tinham sobrevivido e agora lidavam com as sequelas da última batalha cada um a seu modo. Eles nunca estavam muito longe, sempre enviando notícias sobre seu progresso.

Seiya estava realizando missões pelo mundo; Shun começava a falar sobre estudar medicina; Hyoga e Shiryu tinham voltado a seus locais de treinamento e tentavam construir uma vida. Nem os deuses do Olimpo saberiam onde Ikki poderia ter se enfiado dessa vez.

- Senhorita Kido.

A entrada do dono do escritório interrompeu seus pensamentos. Só então percebeu que estava parada no meio do espaço, segurando o encosto de uma cadeira como se o destino da humanidade dependesse daquilo. Suas mãos estavam doloridas e começava a sentir a aproximação de uma dor de cabeça.

Respirou fundo e conseguiu sorrir placidamente, sentando-se em seguida. Continuou respirando daquela forma, dando uma rápida olhada a sua volta enquanto tentava afastar a enxaqueca que se insinuava.

O escritório não mudara. Ainda tinha as mesmas paredes brancas, a mesma mesa de vidro e os mesmos armários de madeira de um amarelo desbotado que ela se lembrava. Se não fosse pelas capas de livros de várias cores e pelas fotografias de familiares de seu ocupante penduradas nas paredes, o lugar pareceria tão desconfortável e asséptico quanto qualquer outro consultório do hospital. Enquanto o médico examinava uma série de documentos em cima da mesa, Saori encarou o retrato disposto diretamente em sua linha de visão: o diretor Chiba e seu avô vestidos formalmente em algum tipo de evento de caridade, olhando para a câmera e sorrindo. Era o único vestígio da amizade entre os dois homens entre as várias fotografias dos filhos e netos do diretor.

- Então, senhorita Kido, está pronta para ouvir sobre o paciente?

Saori esperava estar.

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Meia hora depois, o diretor Chiba terminava o relato sobre as condições gerais de saúde do homem misterioso – pelo menos para ele – que era a razão da reunião e esperava apenas a ordem da nova presidente da Fundação para seguir com o planejado.

Saori suspirou pesadamente. Podia entender as razões do avô para guardar aquele segredo, mas não podia deixar de se ressentir delas. Por que deixar instruções para que ela só fosse comunicada da situação se houvesse uma mudança no quadro clínico do paciente? Poupar seus sentimentos? Ela não era mais criança. Deveria ter sido avisada no minuto em que fora oficialmente declarada como herdeira.

Também a incomodava que nunca tivesse descoberto aquela presença em seus momentos de meditação solitária. O cosmos não devia ser como uma enorme parabólica captando o sinal de todos aqueles conectados a imensidão do universo? Será que havia tantos sinais que ela era incapaz de distinguir um específico a não ser que estivesse procurando? E quanto aos outros Cavaleiros? Por que nenhum deles...?

- Senhorita Kido, não gostaria de vê-lo agora? – perguntou o médico quando o silêncio dela se estendeu por tempo demais.

Saori assentiu. De que adiantava se torturar com perguntas? As coisas eram como eram e tudo que podia fazer era seguir em frente.

O diretor do hospital ergueu-se da mesa e começou a juntar as fichas e resultados de exames que usara para explicar os detalhes que levara ao paciente à condição atual. O mesmo gozava de excelente saúde agora, mas nem sempre fora assim. Segundo o diretor Chiba, da primeira vez que o atendera parecia tão mal que jamais teria acreditado na possibilidade de sobrevivência se não tivesse visto com os próprios olhos. E ele estar vivo nem mesmo era a parte mais extraordinária do quadro.

- Por aqui, por favor.

Saori seguiu o velho médico por uma infinidade de corredores até a ala especial, no último andar do prédio, onde os Cavaleiros de Bronze tinham sido mantidos mais de uma vez depois de batalhas. Aquela parte do hospital tinha acesso restrito a uma equipe limitada, da mais completa discrição, e generosamente recompensada. As enfermeiras que trabalhavam ali não faziam perguntas e não comentavam a quantidade de recuperações impossíveis que testemunhavam. A herdeira da Fundação Graad se perguntava se o silêncio não seria mais pelo fato de que ninguém acreditaria nelas que pela compensação financeira.

Pararam na frente de uma janela de vidro que dava para um quarto tão equipado que mais parecia uma UTI. O único ocupante, identificável como um homem, estava virado de costas para eles, sentado na cama olhando na direção da parede. Estava suficientemente recuperado para não precisar dos aparelhos disponíveis, mas uma intravenosa ainda ligava-se a um dos braços. Saori notou que seu cabelo castanho estava bem aparado e que a pele tinha uma cor rosada saudável. Os dedos, porém, estavam brancos de apertar o lençol da cama como se estivesse fazendo um grande esforço.

- Ele faz isso o tempo todo – disse o médico, percebendo para onde ela estava olhando. – As enfermeiras não gostam de entrar no quarto quando acontece. Elas dizem que ele fica em uma espécie de transe no qual não percebe nada do que ocorre em volta. Se o interrompem, a reação costuma ser desagradável. Da última vez uma comadre foi arremessada contra a parede...

Saori assentiu, não ouvindo o resto do relato. Podia sentir o cosmos se elevando em volta da forma imóvel do paciente, tentando alcançar alguma coisa à distância. Também podia sentir a esperança e o desespero lutando dentro dele. Ficou grata por ser capaz de esconder o próprio cosmos tão bem. Não achava que ser identificada daquela maneira fosse a melhor escolha de aproximação.

- Do que ele se lembra? – perguntou, ainda encarando as mãos cada vez mais tensas do paciente.

O diretor Chiba suspirou e passou a mão pela testa em um gesto involuntário. Saori o olhou de esgoela. Podia imagina-lo tentando entrevistar o homem misterioso, encantado por ter em mãos um caso raro de retorno depois de um período de coma tão longo, sem nenhum sucesso. O quadro clínico devia estar sendo visto como um verdadeiro milagre: nenhuma rigidez muscular, nenhuma alteração negativa de qualquer espécie.

Nenhuma resposta para os meros mortais.

- Ele se lembra do nome – respondeu o médico com um ar carrancudo. – E ele disse a uma das enfermeiras que tem um irmão mais novo.

- Ele disse? – Saori se surpreendeu.

- Essa enfermeira em particular gosta de tagarelar enquanto trabalha. Ela diz que é em benefício dos pacientes – o tom aborrecido com que disse isso revelava exatamente o que pensava a respeito. - Especialmente esse paciente, que não teve contato com ninguém além da equipe desta ala nos últimos vinte anos. Segundo ela, mencionou o aniversário do filho e sua intenção de presenteá-lo com um livro, embora não fizesse ideia de qual escolher. O paciente sugeriu um desses manuais de astronomia para crianças, porque era o favorito do seu irmão mais novo quando pequeno. Ela disse que ele ficou melancólico depois disso e não respondeu a nenhum outro tópico de conversa pelo resto do dia.

Saori assentiu, demonstrando bem menos interesse do que sentia.

- Quando ele poderá ter alta? – perguntou, já sabendo a resposta. Em um dia ou em um ano; ela tomaria a decisão.

- Ele tentou fugir uma vez – disse o médico.

Mais uma surpresa.

- E ainda assim, aqui está ele... – Não havia a menor possibilidade do pessoal do hospital tê-lo capturado se ele estivesse decidido a ir embora.

- Nós o paramos no andar térreo e o convencemos a espera-la. Afinal, a Fundação Graad tem tomado conta das contas médicas dele por duas décadas agora. Acredito que se sentir em dívida com a senhorita foi o que o manteve sob controle nos últimos dias. Ele demonstrou interesse em conhecer o responsável pela fundação e agradecer.

- Foi por isso que fui informada? – Saori perguntou friamente. Não gostava da ideia daquela pessoa se sentir em dívida com ela. Era o extremo oposto: ela quem devia a ele sua vida.

- Senhorita Kido... – o médico começou a se desculpar novamente, mas parou e inclinou a cabeça, como se decidisse que era inútil.

- Vou entrar agora.

- A senhorita quer que a acompanhe?

Saori balançou a cabeça e enviou um único olhar significativo na direção dele: ela entraria sozinha e ele não tinha permissão para assisti-los pela janela. E ela saberia se o fizesse.

Abriu a porta e entrou, fechando-a atrás de si. O homem na cama não se moveu, então ela esperou ouvir os passos do diretor se afastarem no lado de fora antes de dizer:

- Bom dia, Aioros. Como está se sentindo hoje?

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As mãos dele relaxaram quase imperceptivelmente do aperto nos lençóis e a respiração foi ficando mais longa à medida que o cosmos se apagava. Ele tinha acordado fazia quase dez dias e devia estar realizando aquele tipo de busca havia quase o mesmo tempo. Teria descoberto sobre os Cavaleiros? Sobre Aioria?

- Bom dia.

A voz de Aioros soou forte, mas um pouco rouca pela falta de uso. Ele realmente precisava ganhar peso, mas os braços e pernas não fraquejaram quando se deitou de lado na cama, em uma posição que o deixava de frente para ela. Os olhos dele eram castanhos e estavam muito alerta. Os cabelos, de um tom semelhante, tinham sido cortados, mas ainda assim era uma bagunça que apontava para todos os lados.

No geral, ele parecia bem. Até bem demais considerando as circunstâncias

- Você deve ser a representante da Fundação Graad de quem eu ouvi falar – disse o Cavaleiro, direto ao ponto. – Estava esperando que viesse para falarmos sobre a minha dívida.

- Sua dívida – repetiu Saori, disposta a deixa-lo falar. Tentava desesperadamente não encarar, mas não conseguia parar de olhar para ele. Um homem que achava estar morto. A quem devia a vida. E que injustiça que a verdade só tinha sido descoberta agora, quando Aioria não podia mais estar ao seu lado e homens como Shura não podiam mais procurar por seu perdão. No que estava pensando, vovô?

- Os cuidados médicos pagos pela Fundação Graad – disse ele. – Imagino que tenha perguntas para me fazer. Você parece um pouco distraída, mas não curiosa sobre o meu estado de saúde. Tinha certeza que a primeira coisa que me perguntaria seria como posso estar tão bem depois de vinte anos em coma.

Aioros olhou para ela, estudando sua expressão. Ele tinha aquele tipo de olhar penetrante que desestimulava as pessoas a mentir.

Saori procurou uma cadeira e se sentou.

- Já vi coisas extraordinárias acontecerem – ela disse. – No momento estou mais preocupada com a sua dificuldade para se lembrar do passado.

O olhar de Aioros hesitou por um momento muito rápido, mas que não passou despercebido à encarnação de Athena. Ela ergueu uma sobrancelha, não se preocupando em esconder como não acreditava em uma palavra daquela história de amnésia.

- Sou Saori Kido. O homem que o encontrou anos atrás era Mitsumasa Kido, meu avô. Soube que o trouxe para cá e providenciou para que fosse bem cuidado. Infelizmente, ele faleceu há alguns anos. Sou a herdeira de seu patrimônio, inclusive da Fundação. Admito que ignorava sua presença no hospital até pouco tempo. A informação me pegou completamente desprevenida.

- Você sabe quem eu sou? – o Cavaleiro ergueu-se na cama e cruzou as pernas, com uma expressão intensa.

- Seu nome é Aioros – respondeu Saori, devolvendo a expressão. – Grego; Serei bondosa e não vou mencionar sua idade. Você se envolveu em, digamos, um acidente perto de umas ruínas e foi encontrado pelo meu avô. Junto com você havia duas cargas preciosas: uma armadura e um bebê. Até pouco tempo eu pensava que estivesse morto. Seu sobrenome e histórico familiar são desconhecidos, a não ser pelo seu irmão mais novo. As enfermeiras mencionaram que você falou sobre ele em pelo menos uma ocasião.

- Aioria.

- O que?

- O nome do meu irmão mais novo é Aioria.

- Sei. Seus pais não tinham muita imaginação.

Aioros sorriu de lado. O tipo de sorriso que Saori se lembrava de ter visto no rosto de Aioria quando ele estava se divertindo. Por alguma razão sempre pensou que ao contrário do Cavaleiro de Leão, seu irmão mais velho penderia mais para o tipo sério, como Camus ou Shion.

- Então, sobre a dívida...

A neta de Mitsumasa Kido balançou a cabeça, fazendo pouco caso.

- Você esteve dormindo por um longo tempo – disse ela. – Muitas coisas aconteceram. Meu avô se beneficiou de encontra-lo tanto ou mais do que você de ser encontrado... Pode-se dizer que não há uma dívida. Não do seu lado. Mas eu gostaria de ajuda-lo, se você permitisse.

- Me ajudar? – o Cavaleiro pareceu cético. – Como exatamente?

- Você quem vai ter que me dizer.

Ela não achava que ele precisasse de sua ajuda, mas uma garota podia ter esperança.

A ideia de Aioros saindo do hospital e ganhando o mundo sem olhar para trás não a agradava por alguma razão. Ele tinha salvado a vida dela, era sua obrigação ajuda-lo, racionalizou.

E o que havia para ele lá fora? Doze casas vazias e uma ilha inóspita que já começava a hibernar até a próxima Guerra Santa? Os poucos Cavaleiros sobreviventes estavam começando a deixar o lugar, voltando a seus locais de treinamento para ocupar-se de novos aprendizes. Alguém recém-saído de um coma não estava pronto para esse tipo de responsabilidade.

Quanto mais pensava no assunto, mais lógico parecia que ele devia ir para casa com ela.

- Eu vou poder sair do hospital? – ele deu de ombros.

Saori sorriu.

- Vou falar com o diretor imediatamente.

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O diretor Chiba acabou mantendo Aioros no hospital por mais uma semana com a desculpa de fazer uma bateria de testes adicionais. A maior parte desses testes, porém, consistiam em intermináveis conversas com psiquiatras diante dos quais o Cavaleiro fingia sofrer de amnésia na maior cara de pau.

Embora não falassem sobre o assunto, Saori não podia culpa-lo. O que ele diria? "Eu era um Cavaleiro de Athena e fui morto pelo meu melhor amigo quando tentei salvar a reencarnação da deusa das mãos de um vilão que queria dominar o mundo"? Se tentasse eles certamente o colocariam em uma camisa de força para o resto da vida.

- Você é muito ruim nesse jogo, Saori Kido – disse Aioros, durante uma de suas visitas diárias enquanto os dois se debruçavam sobre um tabuleiro de xadrez para matar o tempo.

Saori estava muito consciente da presença de Tatsumi, observando-os da janela como um chacal, com sua melhor carranca reprovadora. Algum dia ainda descobriria que tipo de complexo ele tinha para odiar todos os homens jovens e bonitos que atravessavam seu caminho. Talvez ela devesse inscrevê-lo em um desses sites de relacionamento tão populares nos últimos tempos.

- Pôquer faz mais o meu estilo – respondeu, rindo. – Mas o diretor morreria de apoplexia se me visse envolvida com jogos de azar.

- Ele desaprova?

- Ele não é divertido.

Os dois se olharam de bom humor. Nos últimos dias tinham forjado uma espécie de amizade e a jovem deusa se sentia cada vez mais segura de que o Cavaleiro esperaria pela alta e a acompanharia para a mansão quando chegasse a hora, o que se dependesse de seus esforços seria mais rápido do que imaginava. Nos primeiros dias seu maior temor era que ele mudasse de ideia e desaparecesse quando ela não estivesse presente.

- Ele gostava de viajar, seu avô?

A mudança de assunto não a pegou de surpresa. Aioros sempre dava um jeito de fazer perguntas sobre Mitsumasa em algum momento, não importava o que estivessem fazendo.

- Muito... Mas não tanto depois de encontrar você. Ele começou a se ocupar de outros projetos – ela respondeu, cuidadosamente. Não queria ter que explicar sobre o Torneio Galáctico agora. – Você vai acabar descobrindo tudo quando começar a acessar a Internet.

- Internet? Uma dessas coisas estranhas inventadas no século XXI?

Por coisas malucas ele estava falando de telefones celulares e portas que se abriam com comando de voz, que era tudo o que tinha testemunhado trancado no hospital.

- Século XX. As coisas demoram a chegar ao Santuário.

Outra coisa sobre a qual os dois não tinham conversado: como ela sabia tanto sobre o Santuário. Ele também não tinha feito perguntas sobre Ares e as outras batalhas, o que era estranho. De vez em quando mencionava Aioria, mas de um jeito que fazia parecer que o acreditava ainda vivo. De vez em quando Saori se pegava pensando se ele não teria mesmo algum problema de memória. Talvez uma dessas amnésias seletivas.

- O seu guarda-costas não gosta de mim – o Cavaleiro apontou para a janela com a cabeça.

Tatsumi estava tentando ser discreto, mas com aquela altura e disposição para não perder sua preciosa senhorita Kido de vista, um cego teria percebido sua presença.

- Ele não é meu guarda-costas.

- Perseguidor?

- Guarda-costas, mordomo, motorista e faz tudo pessoal... Pensando bem, perseguidor é uma boa descrição de cargo para ele.

Os dois olharam na direção de Tatsumi. O mordomo tentou sair de vista discretamente, mas acabou se atrapalhando e caindo para trás.

Nesse momento, uma enfermeira entrou no quarto, olhando para o homem jogado no chão do corredor com desaprovação.

- Aioros, como está se sentindo hoje? – ela sorriu.

- Da mesma forma de sempre – ele respondeu. Já estava ficando impaciente por ficar tanto tempo no hospital sem razão nenhuma.

Olhou para a neta de Mitsumasa Kido e ela o observava com uma expressão presunçosa, como se soubesse algo que ele não sabia.

No mesmo momento, a enfermeira continuou:

- O diretor Chiba acaba se assinar a sua alta. Ele acha que você se beneficiará mais de um ambiente familiar e a senhorita Kido – apontou para Saori – concordou em ficar responsável por informa-lo de seu progresso. Você vai poder sair amanhã mesmo.

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Tudo aconteceu como o planejado. Aioros saiu do hospital e acompanhou Saori para a mansão Kido, onde deveria ficar até recuperar a memória supostamente perdida ou simplesmente decidir o que fazer com sua vida.

No entanto, dez dias depois, as coisas não estavam progredindo do jeito que Saori imaginou. A notícia de que Aioros de Sagitário estava vivo logo se espalhou pelos quatro cantos do mundo e Cavaleiros vinham de todas as partes para vê-lo; apareciam repentinamente, a maior parte das vezes sem serem convidados, e o tratavam como o último exemplar de algum tipo de espécie em extinção.

O objeto de interesse deles, felizmente, não se abalava. Respondia as perguntas educadamente e tolerava os olhares indiscretos. Assim como no hospital, dava a entender que não se lembrava de quase nada sobre seu passado e por isso não poderia saciar a curiosidade de ninguém. Ah, a senhorita Kido estava sendo de muita ajuda acolhendo-o naquele momento difícil. Todos estavam sendo extremamente gentis e pacientes na mansão. Ele nem sabia como agradecer.

Talvez fosse aquela súbita invasão de privacidade, talvez a mudança radical de ambiente, mas mesmo quando estavam a sós, Aioros se mostrava bem menos aberto do que se mostrara no hospital. Era educado e bem humorado, mas distante. Quase nunca falava de si mesmo ou do irmão mais novo. Gostava de falar sobre assuntos banais, como o tempo, até que Saori estivesse se controlando para não gritar de frustração. Parecia se interessar sobre os muitos artefatos exóticos que Mitsumasa trouxera de suas viagens, mas a jovem desconfiava que fosse apenas porque assim a mantinha contando suas histórias e evitava ter que falar ele mesmo. Tampouco mencionara o Santuário novamente e ela começava a ficar preocupada com a reação dele quando descobrisse que ela era o bebê que ele quase morrera tentando salvar.

Felizmente tinha conseguido evitar que alguém tocasse no assunto até agora. As vantagens de ser Athena e ter a palavra considerada lei.

Duas semanas depois da chegada do Cavaleiro a mansão, ela acabava de encerrar uma videoconferência com o diretor Chiba, que não parava de incomoda-la querendo saber o que descobrira sobre o passado do interessantíssimo paciente, quando o mesmo bateu na porta do escritório.

- Falando no diabo... Pode entrar! – ela respondeu sem desviar a atenção da tela do computador.

Ouviu mais do que viu quando Sagitário entrou, olhando em volta com curiosidade. Não era a primeira vez que vinha ao escritório, mas ele sempre parecia impressionado com qualquer aposento que contivesse estantes cheias de livros. Pensou no interior da casa de Sagitário, que era limpa e organizada, mas continha muito pouco além do básico para uma pessoa ocupa-la. Na época em que a visitara pensara que talvez Aioria tivesse levado a maior parte das coisas de Aioros com ele. Ou que o Cavaleiro fosse tão jovem quando morrera que não tivera tempo de deixar sua marca pessoal no lugar.

- O Chiba ainda não desistiu de conhecer minha história? – Aioros sorriu, olhando para ela de braços cruzados.

Isso ganhou a atenção imediata de Saori, que se atrapalhou e fechou o site da Fundação Graad, cujo mural aberto para a opinião de visitantes estava lendo. Alguns dos Cavaleiros de Bronze gostavam de se comunicar com mensagens misteriosas através dele e Saori estava sempre checando, por preocupação com o bem estar deles, obvio, não curiosidade.

- Acho que não vou me dar ao trabalho de perguntar como você sabe disso – respondeu. – Afinal, você não se lembra de nada. Deve ser assustador ter acesso a toda essa informação dentro da sua cabeça quando não faz a menor ideia de onde ela vem.

Aioros sorriu de lado, parecendo muito satisfeito consigo mesmo, e ocupou uma cadeira sem pedir licença. Athena sentiu uma ponta de esperança que ele finalmente estivesse se sentindo confortável o bastante para abandonar aquela reserva desesperadora e os dois pudessem conversar e disputar partidas de xadrez como antes. Ela nem reclamaria quando ele acabasse com ela nos primeiros quatro lances.

- Muito assustador – ele sorriu ainda mais. – Na verdade há uma explicação perfeitamente razoável para isso: eu estava passando pelo jardim quando ouvi a voz dele através da janela do escritório. Você não esquece a primeira voz que ouviu depois de vinte anos em coma. Mesmo que na ocasião tivesse sido gritando como uma mesnina.

- Da próxima vez avise antes de abrir os olhos subitamente.

- Desculpe se o sinal de wi-fi no Mundo dos Mortos é uma droga.

Os dois se encararam, sentindo o tipo de alívio que amigos sentem ao voltarem a se falar depois de se afastarem por um tempo.

- Mas você não veio até aqui porque estava com saudades do diretor, não é? Ele, a propósito, está muito interessado se você se lembrou de alguma coisa nas últimas semanas...

- Não – Aioros sorriu sarcasticamente. – Mas eu vim pedir algo que talvez ajude.

- Qualquer coisa – ela sorriu de volta. Os sorrisos de Aioros causavam aquele efeito nas pessoas. Não importa o humor que estivesse, era difícil não responder nos mesmos termos.

- Há três lugares que eu gostaria de visitar – disse ele, ainda relaxado, mas diferente de alguma forma. Um detalhe que ela aprendera sobre o Cavaleiro de Sagitário naquele pequeno tempo de convivência: no geral ele sempre parecia completamente satisfeito com a vida. Suas mudanças de humores eram tão sutis que só eram perceptíveis para alguém que estivesse observando a frequência certa. – Mas não tenho certeza como chegar até eles e... talvez seja presunção da minha parte, mas gostaria que você me acompanhasse.

- Claro que sim – Saori levantou-se rápido demais. Não queria parecer muito entusiasmada, mas era a primeira vez que ele dizia que precisava de alguma coisa e que sua companhia fosse parte disso a deixava ridiculamente feliz. – Podemos ir agora mesmo.

- Alguém está entediada – Aioros balançou a cabeça. – Não vamos agora. Amanhã. Por que não nos encontramos na porta da frente, digamos umas dez horas?

- Perfeito – disse Saori, mordendo o lábio inferior para evitar acrescentar: “está marcado”. Aquilo a faria soar como uma adolescente.

O Cavaleiro aproveitou a deixa e se despediu, saindo do escritório antes que a deusa pudesse se lembrar de perguntar aonde iriam. Mal sabia ele o quão pouco ela se importava com esse detalhe. Agora mesmo estava ocupada com questões mais importantes: como ia fazer para se livrar de Tatsumi durante todo o dia seguinte, por exemplo.

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Saori mal podia acreditar quando entraram no Planetário Manten no meio da manhã seguinte. Não por haver alguma coisa errada com o destino, mas porque por um instante pensara que eles nunca conseguiriam sair da mansão.

Tatsumi tinha feito um grande escândalo quando o informara que a presença dele não seria necessária àquela manhã. Ele tinha enumerado todos os perigos que ela estaria correndo andando pela cidade com aquele homem rude – o mordomo nunca ia superar o fato de que Aioros não a chamava de “senhorita Kido”, como ele achava que devia ser lei valendo para toda a humanidade – e com problemas mentais; ignorando as chances praticamente nulas de um ser humano normal conseguir atacar Athena e um Cavaleiro de Ouro no meio da rua.

Os dois acabaram deixando-o falando sozinho no meio de um monólogo sobre os índices de violência crescentes na cidade e se refugiado no primeiro táxi que conseguiram encontrar.

- Eu nunca vim aqui – disse Saori ao saltarem do veículo.

- É a primeira vez para nós dois então – sorriu Aioros.

Um grupo de colegiais passou por eles na direção do planetário, olhando para trás e dando risadinhas durante todo o caminho. Saori deu uma boa olhada em seu acompanhante. Os anos em coma tinham tido um efeito em seu corpo, diminuindo drasticamente sua massa muscular, mas ele continuava alto e atraente. O sobretudo marrom escuro e as roupas pretas que usava lhe caiam bem, aumentando o efeito. Os cabelos estavam espalhados sobre o rosto por causa do vento, dando-lhe um ar levemente rebelde. Ele parecia o membro de algum tipo de banda de rock estrangeira. Nada mal para quem dormiu por vinte anos inteiros. Nada mal mesmo.

- Vamos – Aioros segurou sua mão e a puxou delicadamente na direção do prédio. – A essa altura já devem estar mostrando as constelações.

Eles ocuparam uma cadeira na parte de trás bem a tempo de ver a redoma branca sobre suas cabeças se encher com a imagem de centenas de estrelas sobre uma montanha. A paisagem era linda, mesmo com a iluminação artificial, e Saori se viu sentindo falta de seu próprio planetário, onde conversara com a imagem virtual do avô nos primeiros dias depois de sua morte.

A redoma particular tinha sido destruída em um ataque à mansão durante uma das muitas batalhas travadas contra Athena. Depois disso ela ordenara que as partes essenciais da residência fossem reparadas, deixando para cuidar do planetário mais tarde.

Estava se perguntando quando esses planos tinham escapado de sua mente quando ouviu Aioros sussurrar:

- Meu irmão queria ser astronauta.

Seu coração deu um salto. Era a primeira vez que o ouvia se referir ao irmão no passado.

- Mesmo?

- Ele viu um documentário na TV sobre Neil Armstrong quando tinha cinco anos e decidiu que seria o primeiro garoto a pisar na lua – As estrelas na redoma estavam ficando maiores, até que eles puderam ver o contorno da Terra bem de frente, como se estivessem voando para fora da atmosfera terrestre. – Eu disse a ele que precisaria estudar durante muitos anos antes de pensar em ir até a lua e Aioria disse que ele ia fazer o que quisesse. Se quisesse ir à lua naquele dia mesmo, ele iria.

- Teimoso.

- Como uma mula. Era uma das coisas que eu gostava mais nele. Que eu invejava até. Se alguém tivesse me dito que não podia mais olhar para a lua, eu teria pensado dez vezes antes de desviar os olhos dos meus sapatos.

Uma boa personalidade para um cavaleiro, pensou Saori com tristeza. Alguns deles tinham vivido um verdadeiro inferno para conseguir vestir sua armadura e para que? Para acabarem mortos por um deus megalomaníaco em quem ninguém acreditava há centenas de anos.

O planetário continuou sua viagem através do espaço, demorando-se em cada constelação, de vez em quando mostrando uma vista de tirar o fôlego de algum fenômeno astronômico distante.

Eles eram os únicos sentados nos fundos, separados de um grupo de colegiais em uma excursão escolar por diversas filas, o que lhes dava alguma privacidade para conversar. Apesar disso, depois do breve diálogo sobre Aioria, o Cavaleiro de Sagitário ficou em silêncio durante muito tempo, olhando para frente com olhos semicerrados enquanto o universo se expandia acima deles.

Saori sorria. Estava se lembrando de quando tinha doze anos e frequentara a escola durante algum tempo. Aquilo tinha sido antes do Santuário. Antes de Athena. Uma época em que ela era apenas a milionária Saori Kido que agia como se o mundo inteiro girasse ao seu redor. Um garoto de outra sala do mesmo ano a convidara para um encontro naquele mesmo planetário e ela dissera que sim apenas para ter a chance de sair da mansão durante algumas horas. O avô a obrigara a deixar que Tatsumi os acompanhasse, então a tarde toda tinha sido embaraçosa e muito pouco agradável. Nunca mais fora a nenhum planetário além do da mansão depois daquele dia. Quanto ao garoto... Nem mesmo se lembrava do que tinha acontecido com ele. Naquela época ela era boa em deixar as pessoas para trás.

- Vamos embora – disse Aioros.

- Mas ainda não acabou.

- Falta a parte sobre buracos negros. Eles sempre me deram arrepios.

Ele a puxou pela mão e os dois estavam na frente do prédio quase tão rápido quanto entraram.

- E agora? – Saori perguntou.

- Agora...

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- Essa é a segunda coisa que eu queria fazer – disse Aioros, empurrando uma colher de sorvete ridiculamente grande na boca de uma só vez.

Saori ergueu uma sobrancelha. Não gostava muito de coisas doces, mas teria concordado em entornar uma garrafa de mel se isso significasse que o dia não acabaria tão cedo. Além disso, queria manter Aioros falando. Ouvir mais sobre a vida dele se tivesse a chance.

- É a primeira vez que experimenta sorvete? – ela lançou a isca, provocando-o com a perda de memória.

O Cavaleiro sorriu, recusando-se a morder.

- Quem sabe? Talvez eu tenha experimentado quando era criança. Ouvi dizer que eu tinha quatorze anos quando morri – ele olhou o próprio reflexo no vidro do mostruário de sorvetes ao lado deles. – Dormir deve fazer bem para a pele. Ninguém diria que eu tenho um dia a mais do que isso.

- Você bem que gostaria. Mas isso deve ser estranho.

- Ter quatorze anos no corpo de um homem de mais de trinta? – Aioros deu de ombros. – Talvez eu fosse maduro para a minha idade. Afinal, eu tinha minha própria armadura de ouro e lutava por Athena e pela justiça. Isso me lembra de que você não me contou o que aconteceu com ela.

- Longa história – Saori balançou a cabeça. – E você deve ter lido sobre a Guarra Galáctica na Internet. Ainda há milhares de pessoas postando teorias da conspiração sobre isso.

- Ah, sim, sobre o Cavaleiro de Fênix ser um alienígena vindo do centro oco da Terra... Muito útil a tal da Internet. Impressionante também. Tenho sorte de ter visto De Volta Para o Futuro pelo menos umas vinte vezes na minha época ou estaria rolando pelo chão, catatônico.

- O futuro é tão impressionante assim?

- Com algumas excessões. Onde estão os carros voadores? – ele olhou na direção da rua, como se esperasse que um veículo fosse pousar ali a qualquer momento.

Os dois se concentraram nos sorvetes por algum tempo. Saori estava pensando que era a primeira vez que se divertia desde os acontecimentos no Mundo dos Mortos. Perguntava-se se devia tocar no assunto da última Guerra Santa. Tinha certeza que Aioros sabia o que acontecera a seus companheiros, mas não os detalhes.

E se ele se lembrasse de estar lá em espírito, lutando junto aos outros? Era muito egoísta da parte dela torcer para que fosse assim? Para não ter que reviver tudo aquilo na tentativa de explicar para ele? E quanto ao bebê? Ele teria mencionado alguma coisa se soubesse que ela era Athena? E, se não soubesse até agora, a trataria diferente quando ficasse sabendo?

- Ouvi dizer que vocês japoneses fazem sorvete com carne crua de cavalo.

Saori deixou escapar um riso aliviado, quase engasgando com o comentário tão aleatório.

- Sou grega.

- Gregos comem cabeça de cordeiro, não tem para onde fugir.

- Ah, por Zeus...

.&.&.&.



Depois da sorveteria eles deram uma volta em um parque nas proximidades. O dia estava úmido e um vento frio soprava da direção do oceano prometendo chuva para mais tarde. Era a chegada do outono em toda sua glória.

Saori fez menção de introduzir novamente o assunto Santuário, mas acabou mudando de ideia. O silêncio estava confortável e ela queria que continuasse assim. Vinha se sentindo perdida desde que voltara da Grécia após a última batalha; como se o destino tivesse cometido um erro ao deixa-la viver. Dirigir a Fundação ocupava seus dias e com o tempo fora fácil se acomodar na rotina de Saori Kido, ignorando que não estava feliz. Seria por isso que tinha ficado tão zangada ao descobrir sobre Aioros a princípio? Porque o aparecimento dele abalara seu mundo, arrancando-a da zona de conforto que criara?

Mas agora que tinha se acostumado a uma nova rotina, o que faria se ele decidisse voltar para o Santuário? Ou sair pelo mundo sem destino certo, como o Cavaleiro de Fênix?

- Você está bem?

Aioros tinha parado de andar e a estava observando mais atrás. Ele acenou na direção de um banco de madeira e os dois se sentaram, encarando os prédios baixos de tijolos do outro lado da rua.

- Eu sei que a maior parte é uma piada entre nós, mas eu preciso saber... Do quanto você realmente se lembra? – perguntou Saori, antes que perdesse a coragem.

- Tudo?

- Que seria...

- Tudo. O que você sabe sobre o Santuário?

A pergunta pegou a deusa de surpresa. Poderia ser que Aioros não fizesse comentários sobre o Santuário porque realmente pensava que ela era apenas a neta de Mitsumasa Kido e diretora da Fundação? Seu papel na organização da Guerra Galática não era segredo, mas a parte sobre ser Athena não era informação que ele encontraria em sites de conspiração.

Resolveu ser cuidadosa ao responder:

- Sei que é uma ilha na Grécia, cuja entrada está escondida por trás de umas ruínas. Não que alguém fosse querer entrar lá; faz quarenta e cinco graus na sombra a maior parte do ano e está cheia de homens em armaduras antiquadas, cuja razão de viver é evitar que alguém passe por dentro de suas casas.

Aioros deixou escapar um grunhido tentando não gargalhar.

- É uma descrição perfeita do Santuário.

- Eu tento.

- E sobre Aioria?

- Cavaleiro de Leão. Personalidade interessante. Tinha uma queda por uma amazona. Levando em conta que ela nunca tentou mata-lo mesmo depois de ele ter visto o rosto dela, era correspondido.

- Isso é fantástico. Teve uma boa vida, o meu irmãozinho – Aioros suspirou. – Você o conheceu?

- Claro. Todo mundo conheceu Aioria. Ele era difícil de ignorar – Saori sorriu com alívio. A conversa estava indo bem melhor do que tinha imaginado. – Mas se você quer histórias, melhor perguntar à Marin.

- A amazona que você mencionou?

- Em carne, osso e, ultimamente, sem máscara.

- Vou ter que olhar para os pés quando falar com ela – disse Aioros. – Meu mestre fez um ótimo trabalho me deixando apavorado com histórias do que aconteceria se eu olhasse para o rosto de uma amazona.

- Seu irmão não tinha esse problema.

- Ele sempre foi o rebelde da família.

Saori riu, mas esforçou-se para ficar séria em seguida:

- Aioros... – ela tocou a mão dele tão rápido que ele mal percebeu. – Você pode perguntar o que quiser. Se eu puder responder...

- Ah, tudo bem – o Cavaleiro fez um gesto com a mão. – Acho que ouvi o bastante.

- Não está nem um pouco curioso? – Se iam falar sobre a parte difícil, ela preferia que fosse agora, enquanto o clima entre eles estava leve e estavam longe da mansão.

Aioros apoiou o braço no encosto do banco e olhou diretamente nos olhos dela.

- Você se preocupa demais, Saori Kido. Eu fui... sou um Cavaleiro de Ouro e conheço as regras. Nós renunciamos a infância, a uma chance de uma vida normal, pela felicidade de servir Athena e a humanidade. Morrer faz parte da descrição do cargo, então não se preocupe com os meus sentimentos com relação a isso.

Ele fez uma pausa, procurando pelas palavras, mas não desviou os olhos dos dela.

- Não vou negar que não esteja ressentido pelo meu irmão ter tido a morte gloriosa, enquanto eu estou aqui, com uns cinquenta anos de adaptações cinematográficas ruins de HQs da DC a minha frente.

A fala era espirituosa, mas a expressão era triste. Saori sentiu o impulso de segurar a mão dele, mas não conseguiu se mexer. Confortar pessoas era uma habilidade de Athena, não da senhorita Saori Kido. Ela nunca se sentira tão Saori.

- Eu procurei por eles durante muito tempo quando estava no hospital, mesmo sabendo que não havia nada para encontrar. Fico feliz que você tenha aparecido com sua falta de habilidade no xadrez para me distrair.

- Exatamente. Eu estava escondendo meu jogo o tempo inteiro para o seu benefício.

Aioros riu alto e foi ele a alcançar a mão dela, dando um aperto de agradecimento.

- Por que você fugiu do hospital? – ela perguntou.

- Você não conhece o diretor Chiba? –sorriu. – Achei que o velho fosse dissecar meu cérebro se eu continuasse ignorando suas perguntas. Não dava exatamente para dizer que eu tinha morrido enquanto salvava a deusa grega da sabedoria. – Balançou a cabeça em autorecriminação. – Acho que eu devia pegar uma lista dos nomes das enfermeiras e mandar flores para cada uma delas como desculpa pelo meu mau comportamento.

- Adicione algumas pérolas, se não quiser que elas arrumem uma desculpa para te darem uma injeção durante o seu próximo checkup.

- Fale a verdade. Você só se ofereceu para me hospedar porque gosta de se divertir as minhas custas – ele começou a fazer círculos lentos no topo mão dela com o dedo indicador. – Isso era tudo o que você precisava saber?

- Ah, sim – ela respondeu distraidamente. – Meu avô sempre dizia que não devemos questionar o destino. Você salvou Athena. Ela cresceu e salvou o mundo. Acho que vou ter que me contentar com isso.

Aioros desviou o olhar pela primeira vez e os dois assistiram o movimento da rua mais além, onde o parque terminava em uma fileira de cerejeiras desfolhadas. O vento soprou mais frio. Um caminhão com uma propaganda de lavanderia pintada nas laterais deu um freio quando um ciclista instável atravessou o caminho. Alguém gritou um xingamento. O mundo continuou seu percurso.

.&.&.&.



O diretor Chiba ligou novamente aquela manhã e Saori teve que se controlar para não gritar com ele outra vez. Ou soltar toda a história de Athena, deuses e dominação mundial para ver se aquilo o fazia calar a boca. Também foi difícil não gritar com Tatsumi, que decidira evoluir de perseguidor à sombra, segundo ele “para evitar que o hóspede abusado chegasse perto demais”.

Perguntava-se quão chocado ele ficaria se soubesse o muito perto que ela queria o “hóspede abusado”.

Depois da saída ao planetário eles tinham voltado à rotina de antes, com a diferença que agora conversavam abertamente sobre Aioria, o Santuário e o que mais lhes desse na telha. Saori achava que estava ficando melhor no xadrez, embora Aioros ainda dissesse que ela era péssima o tempo todo.

Eles se reuniam no escritório todas as tardes, onde ela negligenciava o trabalho enquanto o Cavaleiro lia a mesma página de um livro durante duas horas seguidas, frequentemente de cabeça para baixo. Tudo sob o olhar do zeloso Tatsumi, a sombra.

Aquilo estava ficando ridículo.

- Saori?

Aioros apareceu na janela uma tarde em que estava sozinha, quase lançando Saori para fora da própria pele. Ele riu da expressão dela.

- Desculpe, não era minha intenção assusta-la. Muito ocupada com o trabalho?

- Ignorando convites para bailes de caridade. Os cheques não precisam de mim para encontrar o caminho.

- Isso quer dizer que não é importante?

A deusa deu de ombros.

- Quer dizer que pode esperar.

- Ótimo, porque ainda não fomos ao terceiro lugar que falei – disse Aioros, debruçando-se no parapeito da janela com um sorriso preguiçoso.

A luz do sol refletiu-se no cabelo dele e ela desejou ter uma câmera à mão. A imagem ficaria perfeita em um calendário de parede. Mr. Novembro. Saori sacudiu a cabeça para espantar o pensamento, achando graça de si mesma.

- E o dia está muito bonito para ser desperdiçado.

- Está ficando nublado.

- E haverá vento e chuva, se tivermos sorte.

- Você quer sair agora? – ela perguntou sem muita certeza.

- Se sairmos nos próximos dez minutos, talvez Tatsumi nem vá perceber. A cozinheira o pegou com os dedos em uma torta de maçã e ele está ouvindo um discurso sobre como não agir como um troglodita.

- Hm... Você disse vento e chuva?

- Acho melhor vestir um casaco.

.&.&.&.



Aquilo não era bem o que ela esperava quando Aioros a convidou para uma saída. Saori olhou em volta, para o portão de ferro e para o espaço aberto em volta, pensando que combinava com o dia enevoado um pouco bem demais.

- Um cemitério?

Ele arrastava com uma mão uma sacola de comida suficiente para alimentar um exército e equilibrava uma garrafa de saquê com a outra. Parecia orgulhoso dos preparativos que fizera sozinho.

- Achei que era um bom dia para prestar meus respeitos ao seu avô – explicou. – Afinal, ele salvou minha vida. Tatsumi me disse que eu não devia economizar nos preparativos e me contou tudo sobre o costume japonês de fazer piquenique no cemitério. E como seu avô adorava vinho de arroz... O que?

Saori mordeu o lábio inferior desesperadamente, tentando não rir. Um grupo de senhoras caminhava perto deles na direção oposta e ela não queria fazer uma cena.

- Piquenique no cemitério? – apertou as mãos sobre os lábios, fazendo com que as palavras soassem abafadas: – Meu avô não bebia há anos. Alguma história obscura envolvendo uma mulher russa e uma lhama que ele nunca quis me contar. Quando foi que você falou com Tatsumi?

- Bem, ontem... Não mencionei que você viria junto. Como assim não bebe? Então o que você faz quando quer homenageá-lo?

- Vou até o altar no terceiro andar de casa e acendo um pouco de incenso.

- Saquê...?

- Não.

- Piquenique no cemitério?

- Menos.

A expressão de Aioros tornou-se tão desolada que ficou ainda mais difícil para Saori se controlar. Podia sentir as lágrimas ardendo nos olhos por causa do riso contido.

- Tenho certeza que rir da cara dos outros em um cemitério é algo extremamente inapropriado – ele disse. – Aquelas senhoras do outro lado concordariam comigo. E eu não me responsabilizo se algo acontecer ao seu mordomo nos próximos dias.

- Ele estava brincando. Não precisa agir como se tivesse descoberto que Papai Noel não existe.

Sagitário revirou os olhos.

- Então também não é verdade que você odeia homens e está destinada a um mosteiro no Butão?

- Que?

- Isso você não achou engraçado – ele ergueu a sacola desajeitadamente por causa do tamanho, respirando o aroma de comida vindo dela. – Isso aqui cheira bem. Tem certeza que a parte do piquenique está fora de cogitação?

- Você pode deixar para o meu avô como um presente.

Aioros a encarou como se ela estivesse maluca, mas a seguiu até o tumulo de Mitsumasa. O espaço estava limpo e bem cuidado. Havia flores frescas e incenso tinha sido queimado ali havia pouco tempo.

- Tatsumi vem aqui pelo menos uma vez por semana – explicou Saori. – Eu prefiro prestar meus respeitos em casa. Não é como se acreditasse que o espírito dele continua por perto me assistindo.

A jovem fechou os olhos e fez uma oração silenciosa pelo avô. Esperava de todo coração que seu espírito descansasse em um lugar agradável, apesar de sua vida ter sido menos que irrepreensível.

Quando abriu os olhos, percebeu que seu acompanhante fazia o mesmo.

- Quaisquer que fossem as suas faltas – disse o rapaz, como se lesse seus pensamentos – ele desempenhou seu papel na manutenção da paz e merece crédito por isso.

Segurou a mão dela e a puxou para fora do cemitério. Ela percebeu que ele ainda segurava a sacola de comida, mas tinha deixado o saquê em cima do túmulo. Aquilo fez com que tivesse a visão mais bizarra do fantasma do avô berrando que se recusava a descansar enquanto alguém não aparecesse para tirar a garrafa ofensiva do seu lugar de repouso.

- Você está criando um hábito de me puxar para dentro e fora dos lugares.

- Isso é um protesto? Que eu saiba ninguém gosta de ficar em um cemitério além do necessário.

- É quieto.

- E assombrado. Seu avô não vai ficar feliz quando notar aquela garrafa se o que você disse sobre ele for verdade. Melhor irmos embora antes que ele nos siga.

- Eu não menti!

- Não, mas alguns homens gostam de fingir que não bebem.

- Meu avô não bebia – protestou Saori. – Ora, se você acha que vai perturba-lo, por que deixou a garrafa?

- Eu também não bebo e ela estava pesada.

Aquela altura Saori já tinha se acostumado com a ideia de passar a tarde em um cemitério, embora de jeito nenhuma ela fosse demorar ali fazendo piquenique.

Estavam em uma pequena inclinação e dali era possível ver o teto das casas de um bairro que se estendia até onde a vista alcançava mais embaixo. Do lado oposto havia um lago que dava uma atmosfera de parque ao lugar. Imaginava que fosse uma bela vista durante a primavera.

- Esse era mesmo o terceiro lugar que você queria visitar?

Aioros balançou a cabeça afirmativamente.

- Queria ter vindo aqui primeiro, mas eu meio que estava irritado com o seu avô.

Saori o encarou, sobrancelhas erguidas.

- Não me olhe assim, eu sei que devo minha vida a ele. Mas ler sobre a Guerra Galática e sobre todo o sofrimento que ela trouxe àqueles pobres órfãos...

- Andou falando com Tatsumi sobre isso também? – a parte sobre o orfanato não era informação fácil de ser encontrada.

- Ele tem muito orgulho de seu papel na formação moral dos garotos – Aioros respondeu secamente. – Mas recebi a visita de alguns Cavaleiros de Bronze ultimamente, já esqueceu? Eles adoram falar mal do velho Tatsumi.

- Os Cavaleiros de Bronze foram essenciais na manutenção da paz.

A justificativa soou fraca, mas ela achou que devia ao avô a tentativa mesmo assim.

- Entendo que eles foram importantes, mas ainda acho que o seu avô foi um pouco longe demais. Não sou o tipo de pessoa que acha que o fim justifica os meios, mesmo em se tratando do destino da humanidade.

O que estava feito, estava feito, então não havia muito mais o que dizer aquele respeito. Saori mudou de assunto:

- Esse foi o terceiro lugar mesmo? Um planetário, uma sorveteria e um cemitério?

- Pensei que você tinha gostado do planetário.

- Nós saímos na metade da exibição.

Aioros ficou em silêncio por um instante.

- Eu devia isso a Aioria. Prometi que iriamos a um planetário na nossa primeira missão juntos quando ele conseguisse a Armadura de Leão. Ele não estava muito motivado com os treinos no início. Isso me assustava. O Santuário não é muito gentil com aprendizes que não dão o máximo de si.

- O sistema precisa de reformas. Vou me certificar que isso aconteça antes da próxima geração – disse a deusa, resoluta.

- E como você pensa em fazer isso?

Saori corou, lembrando de súbito que ele não sabia sobre ela ser a encarnação de Athena.

- A sorveteria também foi em honra de Aioria?

- Não. Foi em minha honra. Gosto de sorvete.

- Ah, claro – a jovem ainda estava se sentindo atrapalhada com o deslize de antes e esperava que ele não percebesse. – O que pretende fazer agora? No futuro próximo, quero dizer.

Aioros deu de ombros.

- Acho que devo parar de procrastinar e visitar o Santuário. Já estou abusando da sua hospitalidade aqui...

- Não foi isso que eu quis...

- Eu sei! – ele a interrompeu. – Mas eventualmente eu vou ter que dar um jeito na minha vida. Os deuses estão todos de volta onde pertencem e, a não ser que eu queira me responsabilizar por um grupo de aprendizes, acho que meus dias como Cavaleiro meio que estão contados.

- Entendo... – disse Saori, contendo o sentimento de decepção. Recusava-se a se sentir miserável até ouvir a resposta completa.

- E já que está tão curiosa... – ele chegou mais perto, segurando a mão dela, dessa vez com mais força. – Acho que vou fazer uma lista. Uma dessas listas de mil coisas para fazer antes de morrer. Mais de uma, talvez: mil filmes para ver; mil livros para ler; mil sabores de sorvete para provar. E, claro, a parte realmente difícil: ensinar você a não assassinar centenas de anos de tradição no xadrez.

Ele estava sorrindo, e o coração de Saori começou a bater como louco.

- Vai ter ficar muito tempo por perto para conseguir isso – ela ia se certificar de não aprender absolutamente nada nos próximos dez ou vinte anos

Abriu a boca para fazer outro comentário provocador, mas lembrou do pequeno detalhe que ainda não tinham discutido: Athena. Ele não sabia que ela era Athena! Se soubesse estaria ajoelhado, jurando lealdade eterna enquanto falava com ela de pelo menos dois metros de distância, exatamente como aquele bobo adorável do Shion costumava fazer. Por quanto tempo seria capaz de esconder a verdade dele? Talvez se comprasse todos os Cavaleiros com férias grátis e produtos de cabelo...

- Metade dos Cavaleiros de Ouro estão revirando no túmulo agora. Inclusive meu velho amigo Shura.

Saori franziu a testa, confusa.

- Você sabe – ele continuou. – Alguns cavaleiros considerariam blasfêmia convidar a encarnação de Athena para sair.

- O que?

Convidar para sair? Quando? Como? Espere, não era com isso que ela devia estar preocupada. Ele sabia que ela era Athena? E não estava ajoelhando e a reverenciando?

Aioros inclinou a cabeça para o lado como se dissesse: “peguei você”.

- Como você soube? – perguntou Saori.

- Sobre você ser Athena?

Saori assentiu.

- Seus olhos foram a última coisa que eu vi antes de morrer. Como poderia esquecer?

Agora ela estava sentindo as lágrimas ardendo por trás dos olhos novamente. Mas dessa vez era por um misto de alegria e alívio.

- Bem... – respirou fundo. Não queria que Aioros achasse que ela estava ficando muito emocional. – Eu sempre achei que a sua última lembrança tivesse sido a barba do meu avô.

Aioros balançou a cabeça e passou o braço pelos ombros dela. Parecia que queria abraça-la, mas achava que era muito cedo para isso. Cavaleiros e seu cavalheirismo exasperante.

- Isso realmente não o incomoda? Athena?

- Incomoda você?

Ela balançou a cabeça rápido demais, fazendo-o rir. Normalmente teria tentado tomar o controle da conversa, mas o que importava? Ultimamente não havia outro som que gostasse mais do que ouvir Aioros rir.

- Talvez você seja muito velho para mim – disse ela, encostando a cabeça no ombro dele enquanto assistia a paisagem sem realmente vê-la.

- Pelo contrário, eu tenho quatorze anos! Athena está por aqui desde o começo dos tempos. Já ouviu falar em algo mais escandaloso?

- Pelos deuses, não repita isso nem por brincadeira.

Os dois riram e se encararam.

- Eu beijaria você...

- Hm...

- ...se não estivéssemos em um cemitério.

Saori deu um salto para o lado, só então se lembrando dos arredores. Aioros continuou rindo. As mulheres de antes tinham desaparecido e agora o sol era apenas uma linha fina e alaranjada no horizonte, por trás das casas. As nuvens de chuva tinham se dissipado completamente.

Por um instante ela pensou que havia piores lugares onde beijar alguém que um cemitério. Sabia que se ressentiria da oportunidade perdida quando estivesse de volta na mansão cheia de empregados curiosos, mas não tomou a iniciativa.

- Vamos embora – disse o Cavaleiro. Ainda segurava a sacola de comida. – Isso aqui está começando a ficar pesado.

Começaram a andar na direção da saída.

- Tatsumi não vai gostar nada disso, sabia? Você e eu.

- Encontrar mil maneiras de irritar Tatsumi. Gosto dessa lista.

Saori mal podia esperar para começar.




FIM



Notas: Nada de beijo no cemitério. Eu até tentei, mas eles não colaboraram...

Para a Thamy: MIL DESCULPAS pela enorme demora. Eu sei que abusei do prazo dessa vez, mas resolvi arriscar. A outra opção era publicar a primeira versão desse troço – acredite, isso foi completamente reescrito – e o mico era grande demais para contemplar.

Espero que tenha dado para ter um gostinho do casal fofo pelo qual agradeceremos a Nemui pelo resto de nossas vidas. Abraços. ^o^v

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