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[Saint Seiya] A Sem Nome, escrita por Nemui

Capítulos: único
Autor: Nemui
Fandom: Saint Seiya
Gênero: Drama

Classificação: livre.
Status: Completa
Resumo: Até o presente, a menina sempre se dedicou a uma única tarefa: servir ao cavaleiro de ouro Aldebaran.


Molhado de suor, Aldebaran entrou na ala pessoal do templo de Touro e cobriu-se com a toalha seca pendurada na porta. Havia uma bandeja sobre a mesa, preparada com um jarro de água gelada e um copo limpo, ausente antes de sair para o treino. Como todos os dias, o trato surgia quase que magicamente. Solveu dois copos inteiros, enxugou-se melhor e jogou-se numa poltrona.

Alguém bateu na porta e em seguida a abriu. Uma jovem timidamente espiou a sala, e Aldebaran sorriu-lhe.

“Está tudo bem, criança, pode entrar.”

A menina entrou, carregando uma pilha de roupas limpas e passadas do cavaleiro, lavadas no dia anterior.

“Com licença, meu senhor.”

Enquanto a observava guardar suas roupas numa cômoda, Aldebaran percebia como os anos se passavam em sua serva. Quando a tomara para trabalhar em seu templo, ela não passava de uma garotinha, pequena demais. Agora, começava a adquirir sinais do corpo de adulta, os seios surgiam, as curvas se formavam, entre trejeitos mais delicados.

“Criança, há quanto tempo trabalha para mim?”

“Há três anos, meu senhor.”

“Três anos… Ora, vejo que em breve não poderei mais te chamar de criança… E desde pequena, serve-me bem.”

Aquela era uma menina sem nome. Quando Aldebaran a salvou no assalto que a deixou órfã, por mais que forçasse, não conseguia fazê-la lembrar de seu passado. Não sabia sequer quem eram os pais, nem com que nome fora registrada. Decidiu tomá-la como serva até que crescesse, mas não conseguiu batizá-la. Como não sabia que nome dar, chamava-a simplesmente de ‘criança’.

Depois de um breve silêncio, o cavaleiro perguntou:

“Diga-me, criança, o que você deseja?”

A menina parou, pega de surpresa com a indagação de seu mestre. Por um segundo, fitou-o nos olhos, mas logo voltou a encarar o chão.

“Eu não sei, senhor. Nunca pensei nisto antes.”

“Não? Então acho que está na hora de pensar a respeito. Você não é mais tão pequena, criança, e não é mais a órfã que eu tirei das ruas. Não quero que sua vida permaneça vazia, depois do que fiz. Não pensou neste assunto? Nunca?”

Ela desviou o olhar, refletiu sobre a questão e sorriu para Aldebaran.

“Meu senhor, servir-lhe bem é o que desejo, pelo menos por enquanto. O senhor deu-me um lar e um trabalho, sou grata por isso. Não penso em fazer outra coisa, só agradecer.”

“Eu fico grato por sua dedicação, criança. Mas não deve esquecer que sou um soldado. Um dia, talvez desapareça no campo de batalha, e fico preocupado com o que acontecerá depois, com você. É por isso que pergunto: o que deseja? Se há algo que posso fazer por você, por favor, me diga. Desde já, preciso preparar a minha morte.”

Se para Aldebaran falar de morte era natural, para a serva era uma espécie de tabu, de território proibido, de outro universo. O mestre era quase um adorado ídolo, cultuado o dia inteiro. O café da manhã, a cama arrumada, a toalha do treino, o jarro de água, a roupa lavada, os curativos e remédios, a armadura reluzente, o almoço para dois metros e trinta, o horário da ronda, o banho quente, a janta, a casa arrumada, os acessórios, o chá ou o vinho da noite. Tudo com perfeição. E se o ídolo desaparecesse, o que seria de todos os esmeros? A menina cerrou os punhos pelas palavras amargas, mas nada respondeu.

“Criança”, disse Aldebaran, “dou-lhe um mês de férias a partir de agora. Não faça nada para mim. Eu já vivi sozinho neste templo, por isso, não se preocupe com minhas necessidades. Eu quero que você vá e viva a sua vida nesses dias; busque, explore, aventure-se. Ganhe algo que seja só seu. Você precisa disso, antes que seja tarde demais.”

“Mas senhor… O que devo fazer…?”

“Qualquer coisa, menos cuidar de mim, criança. Ora, não é tão difícil. Outras meninas da sua idade adoram fazer coisas diferentes. Verá… Daqui a um mês, não vai querer voltar ao trabalho.”

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A menina saiu do templo sem um rumo certo. Estava acostumada a obedecer e a fazer as mais diversas tarefas para o seu mestre, mas aquela definitivamente era a mais difícil. Estava proibida de cuidar do cavaleiro, devia apenas perambular por qualquer lugar sem um objetivo definido. Não sabia por onde começar.

Desceu as escadas, chegou ao templo de Áries. O dono daquela casa era um amigo de seu mestre, um cavaleiro muito educado, chamado Mu. Diziam que, apesar da personalidade gentil, escondia um poder imenso. Adentrou o salão principal, procurando pelo cavaleiro para pedir-lhe permissão de passagem. Era regra no Santuário informar aos seus superiores quando entrava ou saía das Doze Casas. Ouviu vozes numa sala da ala pessoal, uma conversa entre seu mestre e o cavaleiro Mu.

“Afinal de contas, quando você pretende dar um nome a ela?”

“Ora, por que a pressa, amigo? Ela ainda é uma criança, ainda posso chamá-la assim.”

“Ela está crescendo, está crescendo… Ora, Aldebaran, você não pode negar esse direito a ela. Pobre menina.”

“É que… Bem… Eu pensei em muitos nomes, sabe? Muitos. Mas não achei nenhum que combinasse bem…”

“Está procurando por um nome perfeito?”

“Não sei se há um perfeito para ela… Quero dizer, deve existir, mas eu nunca fui muito bom nisso. Mas qual é o problema? Nunca a confundo com ninguém, Mu.”

“Mas os outros, sim. Deve ser triste ser chamada apenas de ‘menina’, ‘criança’, ‘mocinha’, etc. Quando alguém quer se lembrar dela, acaba falando: ‘aquela menina’ ou ‘aquela mocinha cujo nome não sei’. E bem, ela continua no anonimato.”

“Você tem razão. Mas não sei que nome dou a ela.”

“Por que não a deixa escolher?”

“Porque quando perguntei isso, ela simplesmente disse: continue me chamando de criança, senhor. Assim, sem demonstrar vontade. Eu fico preocupado com isso.”

“É por isso que hoje você apareceu com as roupas amassadas!”

“Ei, não me culpe! Faz anos que não faço essas coisas!”

Para a menina, era uma lisonja ouvir dois cavaleiros de ouro conversarem sobre ela. Não era a primeira vez que Aldebaran demonstrava a preocupação de dar-lhe um nome. Para ela, estava muito bem ser chamada de criança pelo cavaleiro, pois dava a impressão de serem próximos. Mas ela não seria criança para sempre, e Aldebaran uma hora escolheria algum nome, infelizmente.

Como não podia passar sem a permissão de Mu e não queria incomodar os superiores, ficou ali esperando. A conversa dos cavaleiros se seguiu por vários minutos, até que Aldebaran resolveu voltar para o templo. Saíram e pararam ao ver a serva esperando na saída. Mu sorriu e agachou-se um pouco.

“Muito bom dia, pequena. O que veio buscar no templo de Áries?”

“Eu só queria pedir passagem, senhor…”

“Ora, nem precisa pedir. Eu já disse que você está livre para entrar e sair das Doze Casas sem me avisar, não disse? Não precisava ficar esperando por nós. Agora vá com a minha permissão.”

“Obrigada, meu senhor.”

Aldebaran sorriu-lhe.

“Vá, criança, vá se divertir… Só não volte muito tarde, está bem?”

“Sim, meu senhor…”

E assim ela se afastou, envolvida na mais estranha sensação. Era uma mudança extremamente radical para o seu pequeno mundo. Não saía para comprar comida, nem para entregar nada a ninguém; saía apenas por sair, apenas porque seu mestre assim desejava. E de repente, quem precisava ter um desejo era ela. Observou em volta, pôs-se a caminhar timidamente, parou, incerta, continuou.

O campo de treino do mestre não era longe de lá. Surgiu uma pequenina vontade de ver aquele lugar. Diziam que servos não deviam ir para lá, mas o mestre dera-lhe uma permissão assinada, dizendo que podia ir para qualquer lugar no Santuário abaixo do templo de Touro. Então ela podia ir. Tomou o caminho e passou a explorar o território hostil e estranho dos soldados, sob os olhos atentos e gentis de Aldebaran, lá da casa de Áries.

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Que mundo mais estranho era aquele, dos soldados. A menina parou atrás de uma cerca e observou, impressionada. Todos os homens estavam lutando e se machucando e trocando ofensas, entre risadas. Seu mestre, que nunca dizia nada impolido a ela, também tinha aquele tipo de comportamento? Pareciam animais em vez de homens.

Havia uma área apenas com meninos, quase todos da mesma idade que ela. Treinavam golpes de luta, incentivados por um cavaleiro. Cada um deles precisava quebrar uma pedra, e nem todos conseguiam. Quando falhavam, eram repreendidos e zombados.

Um dos garotos, o primeiro a quebrar a pedra, foi dispensado mais cedo. Aproximou-se dela sorrindo, sujo da cabeça aos pés.

“Ei, menina, viu só o que fiz? Sou um dos melhores da minha turma! Mas por que você está aqui? Veio trazer uma mensagem?”

“Eu… Só estou olhando.”

“Sem permissão? Servos não podem entrar aqui sem permissão.”

“Eu tenho sim, meu mestre escreveu para mim.”

Quando procurava pela carta dentro da bolsa que trouxera consigo, uns meninos correram e gritaram ao primeiro:

“Ei, Than! Veja, veja! Um cavaleiro morreu!”

O sorriso desapareceu do rosto do menino, que lhe disse:

“Esquece, conversamos outra hora, menina! Parece que um cavaleiro voltou morto!”

Aproximava-se uma comitiva de soldados, todos carregando uma maca. Os meninos correram e aproximaram-se para ver o corpo. Curiosa, a garota também se enfiou no meio dos garotos para ver quem era o cavaleiro.

O reconhecimento foi imediato. Aquele era Xylon, um cavaleiro de bronze que sempre lhe dava um doce quando vinha entregar uma mensagem do mestre. Era gentil e sempre arranjava uma maneira de dar atenção a todos, inclusive a soldados e a servos. O rosto, antes belo e jovem, era agora uma massa deformada de sangue coagulado e carne em decomposição. Um dos globos oculares estava fora, preso ao rosto por uma massa sangrenta. As pernas estavam viradas em ângulos estranhos, o peito estava tingido de vermelho e imóvel, os braços pendiam como cipós. E ele era um cavaleiro, exatamente como o mestre Aldebaran!

A comitiva se seguiu, agregando soldados e aprendizes a cavaleiros. A menina ficou para trás, paralisada, sem saber o que fazer ou pensar. Só sentiu vontade de chorar. Queria voltar, desesperadamente. Contudo, as pernas tremiam, não conseguiam se mexer.

Ouviu uma corneta, anunciando a morte do cavaleiro para todo o Santuário. E mais pessoas se reuniam em volta do corpo, mais pessoas comentavam sobre o ocorrido. Mas elas ainda tinham um chão. A menina não.

Passou-se meia hora antes de sair de lá. Na iminência do choro, disparou numa corrida de volta para casa, subindo as escadas, passando direto pela casa de Áries, seguindo para Touro, sem parar, sem se importar com o baço dolorido, segurando as lágrimas, rezando para que elas não caíssem antes de voltar ao seu quarto. Passou direto por seu mestre sem fitá-lo, pois não queria ser vista daquele jeito. Fechou-se no quarto e enfim conseguiu se libertar.

A corneta tocava e tocava. Ela já a ouvira em outras ocasiões, mas não sabia o que significava. Nunca notara como era alta. O cavaleiro gentil virara um corpo horrendo, e o mesmo podia acontecer ao seu mestre. Não queria, não aceitava, não podia acontecer! Ouviu a porta abrir-se, mas não queria que ele a visse chorando.

“Criança?”

Não podia mais parar de chorar. O rosto gentil de Xylon confundia-se com a expressão do mestre Aldebaran. O rosto do mestre ficava deformado tal como o do cavaleiro de bronze e sufocava-a. Seu mestre não podia morrer! Tinha medo de olhar para o cavaleiro e ver um cadáver. Por isso, escondia-se com todas as forças.

“Criança, venha aqui.”

Não havia como lutar contra os imensos braços daquele guerreiro. Mas Aldebaran não foi rude, apenas a puxou para junto de si, a fim de abraçá-la. Era a primeira vez que a abraçava. E mestres não deviam demonstrar sentimentos pelos servos, pois eram pessoas de naturezas distintas. Mesmo assim, o cavaleiro não se importava de quebrar as regras. Cavaleiros de ouro eram os guerreiros da mais alta categoria no Santuário, com privilégios e poderes acima de todos os outros.

“Não era para você ter visto isso… Não era hora. Perdoe-me…”

A garota chorou em silêncio por um longo tempo, sob a proteção daquele quase deus, embalada como um bebê, sem se lembrar de já ter passado por uma ternura daquelas. O mestre era a única pessoa próxima o bastante para consolá-la, era a única que oferecia um ninho. Assim, a menina tinha vontade de nunca mais afastar-se daquele abrigo.

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Depois de uma semana de isolamento, o mestre decidiu que precisava, ele mesmo, consertar o problema que iniciara. Tirou a serva do quarto, saiu do templo de Touro logo de manhã e com ela desceu as escadas na direção da casa de Áries. Mu estava fora, e o templo estava vazio. A imagem do cavaleiro morto retornou à mente da serva, agora com o gentil Mu, mas Aldebaran já tinha lhe dito para parar de pensar nos cavaleiros como pessoas que viviam para morrer.

Quando se aproximaram da área de treino, a menina parou e hesitou. Aldebaran sorriu-lhe.

“Está tudo bem, criança. Este é apenas um lugar como todos os outros. Os soldados e aprendizes a cavaleiros vêm aqui todos os dias para treinar. Eles passam o dia treinando duro, realizando exercícios dificílimos, todos com o mesmo objetivo: servir a deusa Athena. Eu venho fazer o mesmo que eles. Vamos, não precisa ter medo.”

Se estivesse sozinha, provavelmente teria dado meia volta e ido na direção oposta. Mas se seu mestre dizia que não aconteceria nada, acreditava. Aproximou-se e continuou junto dele.

“Eu entendo que se sinta insegura. O Santuário não é o melhor lugar do mundo… Mas este é o meu lar e a minha vida. Eu gosto de ser um cavaleiro de Athena, sabe? Sinto que não existe lugar mais acertado para mim. Posso dizer isso porque vi muita coisa do mundo lá de fora. É por isso que digo: antes de considerar o meu templo o lugar certo para você, criança, veja o mundo, explore, sinta o sabor de ares diferentes. Eu quero que encontre o seu lugar também. Antes que…”

A palavra morreu. Aldebaran fingiu ter a atenção tomada por um aprendiz que treinava sozinho, e felizmente a menina acreditou.

“Ah, era o que eu procurava! Ei, garoto! Eu preciso falar com você! Criança, espere aqui dois minutinhos. Eu já volto.”

O mestre Aldebaran era muito respeitado dentro do Santuário. O menino parou de treinar assim que o viu e escutou suas palavras com toda a atenção. Olharam para ela e continuaram falando. Então, de repente, caminharam até a serva.

“Criança, hoje você não ficará sozinha. Este garoto, Than, é um aprendiz de cavaleiro e ficará com você até que se sinta à vontade para explorar o Santuário sozinha. Ele vai protegê-la de tudo, por isso não precisa se preocupar.”

A menina acreditava nele, por isso aproximou-se de Than, que lhe sorria. Aquele era o mesmo garoto de uma semana atrás. Ele vestia roupas sujas e gastas com o treino e estava todo suado, mas não parecia ser uma pessoa ruim.

“O senhor Aldebaran me fez prometer que a protegeria. Um cavaleiro de Athena sempre cumpre as promessas que faz, porque é forte o bastante para isso. Eu quero ser assim um dia. Por isso eu prometo a você que irei protegê-la. Assim o senhor Aldebaran me tomará como discípulo.”

“Agora aceite e vá brincar, criança, vá explorar o mundo. E não precisa ter medo, pois nada de ruim acontecerá a você. Não é mesmo, Than?”

“É claro, senhor! Pode contar comigo! Vamos, menina!”

Antes que ela tivesse tempo para protestar, já era levada através do campo de treino segurando a mão de Than. A menina só pôde olhar assustada para o mestre, que a observava com um sorriso gentil. Era desejo dele que ela experimentasse o mundo, que crescesse, que se transformasse.

Than levou-a longe nos campos de treino. Estava animado com a idéia de passar o dia sem fazer nada para variar. Parou próximo ao campo de treino dos cavaleiros, onde guerreiros veteranos aperfeiçoavam suas técnicas. Faziam embates fantásticos, cheios de movimentação e golpes extravagantes. Than, empolgado, comentou:

“Está vendo aqueles dois? São cavaleiros de prata! Um dia serei como eles e lutarei por Athena!”

Vendo-os lutarem, a menina perguntou-se porque eles precisavam lutar e morrer daquele jeito. Por que o mestre Aldebaran vivia aquela vida tão arriscada, em que poderia facilmente virar um cadáver?

“Por que você quer ser um cavaleiro?”

“Por quê? Porque ser um cavaleiro é uma grande honra, não percebe? Você devia se sentir honrada por servir ao senhor Aldebaran, um cavaleiro de ouro!”

“Eu não entendo… É tão fácil morrer sendo um cavaleiro…”

Than sorriu-lhe amigavelmente. A menina perguntou-se por que as pessoas que queriam ser cavaleiros podiam ser tão fortes com um assunto como a morte. Ele queria ser agradável com ela, por isso escolheu as palavras com cuidado.

“O meu mestre me disse que nós devemos treinar para não sermos mortos. Os cavaleiros são fortes porque a vontade deles de viver é extrema. Apesar de terem uma profissão perigosa, eles são as pessoas que menos desejam morrer neste mundo. É assim que eu me sinto.”

“Mas eles podem morrer a qualquer momento. Até mesmo o senhor Aldebaran.”

“Não se preocupe. O senhor Aldebaran é muito forte, por isso não pode ser derrubado assim tão fácil! Nem mesmo um exército conseguiria derrubá-lo, sabia? O senhor Aldebaran é um cavaleiro de ouro, o que significa que ele está entre os guerreiros mais fortes deste mundo.”

Então era mais difícil acontecer com o mestre o mesmo que houve com Xylon. A menina sentiu-se um pouco mais calma com a segurança daquele aprendiz a cavaleiro.

“Além disso, há cavaleiros que conseguem chegar a uma idade mais avançada e se aposentar. Aí eles viram servos do Santuário. Venha comigo, eu vou te apresentar uma pessoa!”

E de novo a menina se via correndo de mãos dadas com Than, até um lugar ao qual nunca fora. Era a área destinada à moradia dos servos que faziam serviços gerais no Santuário. Como sempre morara com Aldebaran, a menina nunca precisara ir para lá.

“Vai gostar dele”, disse Than, “ele é muito legal!”

Than parou em frente a uma cabana e bateu a porta com entusiasmo.

“Senhor Dieck! Senhor Dieck, sou eu, Than! Eu vim visitar!”

Por trás da porta, surgiu um rosto com algumas rugas, cabelos grisalhos e secos, mas bem penteados. O homem devia ter entre cinqüenta e sessenta anos, pois mostrava marcas de velhice, mas ainda parecia carregar a forças de um soldado no corpo.

“Ah, Than… Não devia estar treinando? Se quer ser um cavaleiro, devia…”

O homem parou de falar e exibiu um belo conjunto de dentes bem cuidados num sorriso.

“Hoje veio acompanhado? E que linda mocinha! Venham, entrem.”

Dieck vestia roupas velhas, mas tinha pendurada próxima à cama uma veste branca muito bem conservada, que os mensageiros do Santuário usavam.

“Entrem, sentem-se… Eu preparava meu almoço. Não querem comer comigo? Mocinha, como devo chamá-la?”

“O meu mestre ainda não me deu nenhum nome, senhor.”

“O seu mestre? Isso é incomum. Diga, quem é o seu mestre, jovem?”

“É o senhor Aldebaran, senhor.”

“O Aldebaran…?”

O homem explodiu numa ruidosa gargalhada, como se tivesse ouvido uma piada. Tanto Than quanto a serva não compreenderam sua reação. Depois de acalmar-se, ele enxugou as lágrimas resultantes do riso, mexeu as brasas do forno a lenha e sorriu-lhe.

“E me diga, mocinha, como vai aquele ladrãozinho?”

“O senhor Aldebaran não é um ladrão.”

“Eu sei, eu sei… Mas ele já foi, e como foi! Eu me lembro bem de quando o conheci. Sabia, mocinha, que fui eu quem o trouxe para cá? Aqui, neste Santuário… Antes de ele ser um aprendiz de cavaleiro, era um ladrãozinho, que roubava para sobreviver… Roubou-me a armadura, acredita? Era esperto e ágil, sabia enganar. Mas não machucava ninguém, nem mesmo com aquele tamanho todo. Ele já era grande quando criança…”

A menina estava surpresa. O servo Dieck fora um cavaleiro e ainda conhecera o senhor Aldebaran! Fitou-o nos olhos, impressionada, querendo saber mais.

“E como foi que o senhor Aldebaran veio parar no Santuário?”

“Ah, foi uma guinada do destino. Eu estava numa missão, hospedado numa pensãozinha. O Aldebaran enganou o dono da pensão, pegou minha armadura e saiu correndo! Eu passei a investigar na vila para encontrá-la e acabei me deparando com ele sendo linchado pela população. Naquela hora, ainda não sabia que ele era o meu ladrão. Quando o vi sendo esmurrado, salvei-o. O Aldebaran podia ser um ladrãozinho, mas tinha sentimentos, como qualquer garoto. Como eu o ajudei, ele resolveu devolver a armadura e me contou como fez para roubá-la. O garoto tinha talento com o corpo, e estava vivendo com dificuldades. Achei, então, que seria uma boa idéia levá-lo para o Santuário. Não fiz uma boa coisa?”

Dieck jogou alguns ingredientes na assadeira do forno, enquanto exibia um sereno sorriso.

“Ele não era um mau garoto e me prometeu que nunca mais roubaria quando chegamos aqui. Manteve a promessa. Por isso, ganhou o direito de treinar e virar um cavaleiro de ouro. Lembro que na época houve alguma resistência, por isso eu fui o primeiro a reconhecê-lo como cavaleiro. Disse a todos que, tendo Aldebaran como defensor do Santuário, eu já não era mais necessário. E anunciei a minha aposentadoria. E não me arrependi não. Ele é um grande cavaleiro e carrega um coração maior do que seu corpo gigante.”

Naquele momento a menina quis ficar e ouvir mais histórias sobre o mestre Aldebaran. E se o senhor Dieck, que se considerava mais fraco que o mestre, conseguira aposentar, por que o mestre Aldebaran não podia fazer o mesmo? Uma nova esperança acendeu na menina, enquanto ouvia histórias da meninice de seu mestre.

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E então, criança, o Than foi um bom guardião?”, perguntou Aldebaran, naquele mesmo dia, à noite.

“Sim, mestre. Ele me levou até o senhor Dieck, que me contou muitas histórias.”

“O Dieck?”

O mestre Aldebaran gargalhou como Dieck e então comentou:

“Então aquele velho continua o mesmo de sempre… Meu velho amigo Dieck… Foi ele que me tirou das ruas, devo muito a ele… Ele me ensinou o certo e o errado, castigou-me quando fiz coisas erradas, elogiou-me quando fiz coisas certas… Hoje ele se vangloria disso, e com razão… Eu era terrível, antes de ser sossegado como agora. Criança, você irá vê-lo de novo?”

“Ele me convidou a ir vê-lo amanhã…”

“Pois vá. Eu vou pedir um pequeno favor seu. Estou cuidando da casa de Touro agora, por isso não posso sair. Vou entregar-lhe uma carta, e você deve entregá-la a ele, está bem? É só isso que peço. Ah, também quero que se divirta como hoje!”

Aldebaran calou-se um pouco para escrever a carta. Ao terminar, olhou longamente para ela e depois fitou a menina, com um sorriso gentil.

“Criança… Eu andei pensando em dar-lhe um nome. Ainda não cheguei a uma conclusão, mas você terá um nome até a semana que vem, eu prometo.”

Ela não queria um nome. Bastava ser chamada de ‘criança’ pelo mestre. Como se lesse a sua mente, Aldebaran aproximou-se e pousou a mão enorme e calejada sobre a sua cabeça, afagando-a.

“Para mim, você sempre será a minha ‘criança’, e eu sempre a chamarei assim. Mas Than e Dieck e seus futuros amigos precisam lembrá-la por um nome. E eu quero dar-lhe um belo nome, que será meu presente para você para o resto de sua vida. Por isso, tem que ser bom. Você está crescendo…”

Ele então se ajoelhou e abraçou-a forte. Não era ela que precisava daquilo, mas ele.

“Tudo o que peço a Athena é que você cresça forte e feliz. Aconteça o que acontecer, esse meu desejo jamais mudará, criança. Se eu puder ajudar nisso, morrerei feliz.”

“Mas não vai morrer, vai?”

Aldebaran estufou o peito e sorriu confiante:

“Será preciso ter a força de um milhão de touros para me derrubar, criança. Acha mesmo que eu desistiria de mim mesmo, quando há pessoas que dependem de mim?”

“É porque… depois que o senhor Xylon…”

Antes que ela pudesse falar, o mestre segurou-lhe a mão.

“Venha, criança. Eu preciso mostrar-lhe uma coisa.”

Foram até a entrada da casa de Touro. De lá, podiam ver o Santuário inteiro. Já escurecia, e as tochas dos soldados começavam a se destacar na paisagem. A menina observou lá embaixo, enquanto escutava o mestre.

“Este é o Santuário de Athena, a nossa deusa. Há quem reclame dele, mas eu só me sinto grato por poder morar aqui. É um mundo violento, cheio de guerras, de lutas, de medos… Mas eu gosto daqui. Isso porque todos podem ter uma existência digna neste lugar. Todos podem ter uma morte digna sob o nome de Athena. As pessoas que me acolheram neste vasto império… Dieck… Mu… Aioria e os demais cavaleiros de ouro… e até mesmo você… ensinaram-me a desejar o bem de tudo isto. Quando eu treino, não fico pensando em adquirir a força apenas para tê-la. Eu penso em ser forte porque quero ver todos bem neste lugar. Eu quero que todos neste Santuário possam sorrir de verdade, viver como pessoas sem preocupações. Eu não sou forte por mim mesmo, mas por todos vocês. É por isso que eu não serei morto assim tão facilmente. Enquanto vocês me desejarem o bem, eu continuarei sendo um muro para esta fortaleza, protegendo-a com a minha vida. É por isso que você pode correr por aí em segurança. E mesmo que eu morra, continuarei vivendo.”

“Continuará…?”

“Mas é claro. Eu faço parte deste lugar. Mesmo que eu morra, o Santuário permanecerá aqui. E eu viverei através dele e através das pessoas que viveram comigo. Até mesmo em você, criança. Afinal, você é parte de mim, assim como eu sou de você. O mesmo acontece com Mu, Dieck e os outros. Eu jamais morrerei de verdade, enquanto vocês ainda desejarem o meu bem. E eu sou grato por isso. Grato de coração.”

Sem soltar-lhe a mão, Aldebaran fitou-a.

“Amanhã você irá até a casa de Dieck… Eu não vou me importar se quiser ficar lá até a noite. Na verdade… Por que não dorme uma noite lá e ouve mais histórias dele? Dieck é uma ótima pessoa, e foi um grande cavaleiro. Ele gosta de falar do passado, por isso eu tenho certeza de que não ficará entediada.”

“Não se importa se ele me contar mais histórias sobre o senhor?”

Ele riu, cheio de bondade.

“Sobre quando eu era um moleque? É claro que não. Não me importaria se você saísse para ouvir uma boa história dele.”

A menina sorriu, e ele sentiu-se grato por aquilo. Queria que ela fosse feliz. Desde que a acolhera das ruas, a menina desistira da felicidade. Agora… talvez… estivesse devolvendo esse sentimento a ela. Não podia pedir mais para Athena.

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Os sinos dos soldados soaram. Dieck levantou-se da cadeira e caminhou até a janela. Pouco dava para ver no breu da noite, mas sabia que algo sério acontecia no Santuário. O número de soldados aumentou nas ruas, e muitos servos fugiam carregando um pequeno pacote de roupas. Contudo, como o ex-cavaleiro manteve a calma, a menina, também, continuou tranqüila.

“Parece que alguma coisa está acontecendo.”

“Uma invasão? Acha que o senhor Aldebaran está bem?”

“Ele está melhor do que nós dois. Escute, já está tarde. Por que não vai dormir? Vamos esperar até amanhã de manhã para descobrirmos o que houve.”

“Mas… e se o Santuário estiver em perigo?”

Dieck sorriu-lhe.

“Existe uma parede indestrutível entre o Santuário e qualquer inimigo de Athena. Esta parede chama-se Aldebaran. Portanto, não precisa se preocupar, pequena. Nós dois estamos a salvo.”

Mesmo que Dieck lhe dissesse para permanecer calma, a menina continuaria a olhar através da janela a noite toda. Da vila dos servos, pouco dava para ver do Santuário, pois as casas eram muito próximas umas das outras e por isso a paisagem ficava parcialmente coberta. Dieck também permaneceu acordado, bebendo café para não dormir. Uma hora serviu um chocolate quente para a menina, sorrindo.

“Ah! Eu ainda não lhe contei sobre a primeira missão do Aldebaran, não é? Não gostaria de ouvir agora?”

“A primeira missão?”

“Sim. Até hoje, ele diz que foi a missão mais especial que já realizou.”

A menina virou de costas para a janela e olhou para Dieck, sentada na cama. Já estava pronta para dormir, apenas teimava em fechar os olhos. O ex-cavaleiro sentou-se numa poltrona e acomodou-se bem.

“Isso foi há alguns anos. Aldebaran tinha recebido a armadura de Touro há dois meses, mas ainda não tinha recebido nenhuma mensagem do mestre. Na verdade, poucos acreditavam nele e na sua honestidade. Não é fácil conquistar a confiança dos outros depois de ser um ladrão, sabe?”

A menina assentiu com a cabeça, e Dieck continuou.

“Eu lembro que ele veio me visitar nessa época, com a confiança abalada. Dizia ele que os outros cavaleiros recebiam missões, enquanto ele ficava sem fazer nada. Mas bem quando eu dizia que tudo daria certo, ele recebeu uma mensagem do mestre com uma missão. Eu lembro que ele ficou contente, mas logo se decepcionou ao abrir o envelope. Não era um caso para um cavaleiro de ouro, mas para um soldado. Ele devia simplesmente interferir num assalto a um supermercado na cidade de Atenas. Uma missão simples demais. Provavelmente o mestre só queria ver se ele ficaria do lado das vítimas ou do lado do ladrão. Eu disse para ele que coisa melhor viria depois daquilo, e aí sim ele teria uma missão de verdade. Aldebaran ficou chateado, mas foi assim mesmo.”

“Por que ele ficou triste pela missão?”

“Bem… É que na época ele era jovem e imaturo. Ele esperava que cavaleiros de ouro só solucionassem casos grandes, que exigissem o poder enorme do cosmos superior. Hoje eu sei que ele não pensa assim. Mas continuando… Ele me contou que os bandidos tinham seqüestrado os clientes. Para provarem que não estavam brincando, mataram metade dos clientes. Quando chegou ali, Aldebaran pegou-os justamente no momento em que eles machucavam uma criança. Foi um caso muito simples e rápido para resolver.”

“Mas… O senhor disse que essa foi a missão mais especial do senhor Aldebaran.”

“E eu não estou mentindo, pequena. O Aldebaran voltou mudado depois daquela missão. A criança que ele salvou estava tão traumatizada que se esqueceu de tudo, até do próprio nome.”

Finalmente a menina percebeu: aquela não era apenas a história do mestre Aldebaran, mas dela também. Dieck sorriu diante de seu olhar surpreso.

“Sim. Essa criança era você, pequena. Aldebaran decidiu que a tomaria como serva. E nesse dia fez uma promessa solene. Ele jurou que devolveria a felicidade para aquela criança que salvara. Depois desse dia, ele percebeu que a missão não era tão importante quanto o propósito. Ele me disse depois daquilo: Dieck, que venham mais missões como essa, para que eu ajude mais pessoas. Ele enfim percebeu que um cavaleiro de Athena precisava ajudar pessoas, não pensar no interesse próprio. Para provar que tinha mudado, decidiu cuidar da criança até que ela recuperasse a felicidade. Ele me disse, pouco tempo depois… que tinha descoberto o que era amar incondicionalmente uma pessoa da família… e que aquela missão fora a missão mais especial de sua vida.”

Foi a primeira vez que a menina percebeu que ocupava um espaço generoso no coração do mestre Aldebaran. Pulou da cama, correu até a porta, abriu-a e parou na varanda da casa, olhando para as Doze Casas. Queria voltar correndo até ele. Dieck saiu de casa, agachou-se ao seu lado e segurou-a pela cintura, para ter certeza de que ela não fugiria.

“Espere. Já é madrugada. Vamos esperar até amanhã para que…”

Naquele momento, ele sentiu a explosão de cosmos. A menina não percebeu porque não possuía cosmos, mas ele sim. Olhou para a montanha horrorizado e sentiu os olhos arderem. Fingiu que nada estava acontecendo, mas o impossível tinha acontecido.

A parede chamada Aldebaran tinha acabado de ser destruída.

—————————————————————-

Deick caminhou entre os escombros das Doze Casas com a menina agarrada ao seu pescoço, chorando. Estava sufocado com a força com que o apertava, mas não tinha coragem para repreendê-la. No bolso havia a carta que Aldebaran tinha lhe enviado: ‘Dieck, meu velho: não estou gostando da movimentação do Santuário. Por favor, receba minha criança em sua casa esta noite e conte-lhe histórias para aquecer-lhe o coração. Athena lhe agradecerá com o triplo do calor. Venho pensando num nome bonito para ela. Nos últimos três anos pensei em muitos nomes e fiz muita complicação. Pedi que ela escolhesse, e ela não quis. Passei a última noite acordado porque algo me incomodava nesta época de instabilidades e violência. Lembrei que minha mãe se chamava Ágape, e eu sempre a amei muito. Por algum motivo achei que combinava. Diga-me, velho amigo, acha que tive uma boa idéia? Por favor, avise-me se acha que é feio, porque prometi a minha criança que lhe daria um nome até a semana que vem. Afinal, eu não quero que ela pense em mim como aquele que destruiu a sua vida com um nome feio. Fico preocupado com isso. Quero que ela seja feliz. Sua palavra vale ouro, e minha gratidão é eterna. Que Athena o proteja sempre. Aldebaran.”

Chegaram à casa de Touro. No chão, restara os pedaços de carne irreconhecíveis do forte corpo de Aldebaran, em meio às partes da armadura de Touro. A menina gritou e debateu-se ao ver o cadáver do mestre, mas Dieck segurou-a firme contra o peito. Ouviu passos subindo as escadas e notou que era Than, o garoto do outro dia.

“Menina…”

Ele aproximou-se com o olhar pesaroso. Sentia, também, pena da garota órfã. E com o coração pesado, olhava para o Santuário em ruínas. O seu lar, completamente destruído. Era o fim de uma era, de uma geração de cavaleiros. Vidas tinham sido destruídas em uma única noite. Aldebaran tivera medo de que isso pudesse acontecer, por isso mandara a serva buscar pessoas e fazer amizades. Assim, quando ele morresse, ela não estaria sozinha.

“Ágape…”

A menina fitou-o, e Dieck disse, em voz baixa:

“Aldebaran vive através deste nome, que ele escolheu para você. Ágape… Enquanto o carregar, ele viverá com você, assim como o desejo ardente que ele tinha de devolver-lhe a felicidade.”

Juntando o que lhe restava de forças, já cansada de chorar, a menina pediu para descer dos braços do bondoso ex-cavaleiro e murmurou, entre soluços:

“Eu não preciso de um nome.”

“Mas… Ágape…”

“Eu fui má com o senhor Aldebaran… Ele sempre foi tão bom… e eu fui tão má… Eu nunca disse para ele, senhor Dieck… Eu não quero um nome. Eu só quero que ele volte a me chamar de ‘criança’ de novo. Essa é a única felicidade que conheço neste mundo. Ele voltará? Ele vai me chamar de ‘criança’ de novo…?”

Dieck não sabia o que dizer. Aldebaran não retornaria para ela. Jamais a chamaria de ‘criança’ de novo.

“Você está errada!”, exclamou Than, subitamente.

A menina e Dieck olharam para ele.

“O senhor Aldebaran te chamar de ‘criança’ não é a única felicidade neste mundo! É a primeira! Ele realizou o desejo de devolver-lhe a felicidade. Agora eu prometo o mesmo a você! Porque sou um aprendiz a cavaleiro, e serei forte para fazer o mesmo que ele! Além disso, o senhor Aldebaran sempre te chamará de ‘criança’. Cada vez que alguém te chamar de Ágape, será o mesmo que o senhor Aldebaran te chamar de ‘criança’! Porque ele vive nesse nome, e ele sempre te chamará assim! Portanto…”

Ele sorriu. Era o único sorriso em todo o Santuário, feito apenas do desejo de vê-la bem.

“Confie em mim e não tenha medo de aceitar essa nova promessa! Prometi ao senhor Aldebaran que a protegeria. E o senhor Dieck também está aqui para ajudar. Juntos, nós podemos construir uma nova felicidade, Ágape!”

A menina fitou-os surpresa pelas palavras. Than e o senhor Dieck eram um chão bem frágil, que a seguravam por um fio. Mas eram um chão que Aldebaran construíra para ela. Não perderia Aldebaran por completo enquanto ainda os tivesse. Chorou e segurou forte a mão de Dieck, com a certeza de que ele a confortaria.

“Quero ir para casa, senhor Dieck…”

Ainda levaria um bom tempo para recuperar-se. Mas Dieck ficou satisfeito com o pedido da menina. Ela estava na casa de Touro, mas queria voltar para casa. Significava que admitia a necessidade da mudança. Ele começou a descer as escadas, de volta para a área dos servos, enquanto lhe dizia palavras ternas. O velho amigo Aldebaran viveria sempre com ele, se cuidasse daquela menina. Amanhecia no Santuário em ruínas, coberto de corações feridos.

“Está bem, Ágape, querida… Vamos… Ágape…”

E enquanto era levada gentilmente, a menina ouvia os ecos do próprio nome, na voz gentil do mestre Aldebaran.

‘Criança’… ‘Criança’…

*FIM*

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