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[Saint Seiya] Um Cavaleiro Encrencado na Cidade, escrita por Nemui

Capítulos: Único
Autor: Nemui
Fandom: Cavaleiros do Zodíaco
Gênero: comédia
Status: Completa
Classificação: não disponível
Resumo: Comédia do Hyoga baseada no longa-metragem da Éris. O motivo de os cavaleiros geralmente viverem fora da cidade é…

Era uma manhã ensolarada em Tóquio. Enquanto os carros corriam velozes na movimentada avenida, as crianças do orfanato instalado naquele endereço corriam e brincavam no pátio, acompanhadas das professoras Miho e Eiri.

O desastre ocorreu muito rápido. O avião de brinquedo de Akira sobrevoou a avenida, e o garoto saiu correndo atrás para reavê-lo. A professora mais próxima, Eiri, só conseguiu alcançá-lo quando já estava prestes a ser atropelado por um carro.

O acidente teria sido fatal, se um rapaz não tivesse intervindo. Uma melancia subitamente estourou na roda do carro, e logo em seguida Hyoga saltou para protegê-los. Com seu poderoso cosmos, segurou a frente do automóvel com uma só mão e assim o deteve. Qual foi a surpresa de Eiri ao ver que um desconhecido segurava o carro com tanta facilidade!

Quando o infeliz motorista parou de acelerar, Hyoga voltou-se a ela e a Akira, sorrindo.

“Vocês estão bem?”

“Sim, estamos.”

“Vocês são deste orfanato, não é? Eu vim visitá-los e trouxe estas melancias de presente. Só que, infelizmente, uma delas teve de ser sacrificada.”

Eiri riu e relaxou. Hyoga parecia ser um bom e simpático rapaz. Decidiu que confiaria nele.

“Certo… Vamos entrar?”

Hyoga entrou acompanhado de seus amigos, Seiya, Shun e Saori, que tinham resolvido passar uma tarde no lugar de tantas lembranças antigas.

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Uma hora depois, quando todos estavam reunidos no refeitório do orfanato, um policial bateu à porta.

“Desculpem incomodar, mas vocês estão envolvidos no acidente com o carro preto aí na frente?”

“De certa forma”, respondeu Eiri. “O carro ia nos atropelar, quando o Hyoga nos salvou bem a tempo.”

“Quem é Hyoga?”

“Sou eu”, respondeu o siberiano.

“Queira nos acompanhar. Precisamos conversar na delegacia.”

Achando que seria apenas para testemunhar, Hyoga não teve objeções. Aceitou entrar na viatura e seguir à delegacia, acompanhado de Eiri e de Saori. Não esperava que fosse um problema tão grande.

“Você sabe o que aconteceu com o motorista do carro?”, perguntou o delegado, assim que Hyoga sentou-se à mesa.

“Eu suponho que ele tenha voltado para casa, senhor.”

“Está brincando comigo, rapaz? Acabamos de receber a notícia de que o motorista sofreu um traumatismo craniano!”

“O quê?”

“Foi isso mesmo que você ouviu. Um traumatismo craniano. E você, meu rapaz, não prestou os primeiros socorros ao motorista!”

“Eu… Eu sinto muito, senhor… Não fazia idéia de que…”

“Não fazia idéia de que havia sangue no vidro do carro? Muito esperto…”

“Mas… Eu só estava tentando salvar a vida da Eiri e do Akira…”

“Você amassou o carro dele. Chama isso de proteger?”

“Mas…”

“Além do mais, atirou uma melancia contra o carro de outra pessoa! Nós podemos prendê-lo por este ato de vandalismo.”

“Eu não sou vândalo! Eu só atirei aquela melancia para fazer a roda derrapar.”

O delegado fitou-o em silêncio. Em seguida olhou em volta sério. Todos os seus companheiros de trabalho estavam ocupados. Encheu os pulmões, levantou-se e falou, em voz alta:

“Escutem todos! Este garoto aqui atirou uma melancia contra um carro achando que isso o faria parar!”

Imediatamente, todos os policiais desataram em rir. Riram tanto que Hyoga estava vermelho ao final da gozação. Até mesmo a recepcionista gargalhara de seu ao de heroísmo.

“Rapaz, sabia que minha filha de dois anos é mais inteligente que você?”

“Eu só queria que ele derrapasse!”

“E você acha que um carro caro como aquele, com tração nas quatro rodas, derraparia facilmente com uma melancia? Você só pode estar delirando! Mesmo que fosse apenas em duas rodas, o atrito das outras três rodas jamais permitiria uma derrapagem como a que imaginou!”

Mais risos ecoaram pela delegacia, e Hyoga ficou extremamente irritado. Contudo, como maior era a sua preocupação de não ser preso, ficou calado.

“Você omitiu socorro, destruiu um bem alheio, atrapalhou o trânsito, sujou a rua e tudo isso por causa de uma melancia. Prendam-no.”

“Mas isso não é justo!”

“Conte uma nova. Essa eu ouço todos os dias. Seu vândalo.”

“Eu não sou vândalo! Eu respeito todas as coisas! Não destruo nada!”

“O que esses jovens de hoje têm na cabeça? Quem os educa? Isso é um absurdo. Eu quero o telefone de seu responsável. Você está encrencado, meu jovem.”

“Eu sou órfão!”

“Isso explica muita coisa. Quem é o seu tutor?”

“Ele já morreu.”

“E você não foi encaminhado a nenhuma instituição?”

“Mas eu sei me cuidar! Eu trabalho para a Saori.”

“Sei, sei… Mas há coisas mais importantes que ser o office-boy dela.”

“Office-boy?”

“Sim, vamos logo. Você está em cana.”

O delegado algemou Hyoga, enquanto o rapaz tentava desesperadamente consertar o mal entendido.

“Mas… Eu sou o cavaleiro dela…”

“Não acha que está crescido demais para ser brincar de cavaleiro e princesa?”

“Você não entendeu, eu…”

“Já chega. Não diga mais nada para piorar as coisas.”

Hyoga olhou para trás e viu Saori prestar depoimento sobre o acidente. Gritou:

“Saori! Explique para eles, por favor!”

Achando que ele perdera o controle, dois guardas agarraram-no pelo braço e arrastaram-no à prisão. Hyoga precisava sair, mas não tinha argumentos que os convencessem da verdade. Contava com Saori para esclarecer todo o mal entendido, e esperava não ter de ficar ali por muito tempo.

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Hyoga olhava para o chão, entediado. Já estava ali há dois dias, mas ninguém viera em seu socorro. Saori, que sempre o ajudava, não dera nenhum sinal de vida.

‘Não pode ser. É tudo um mal entendido. Eu vou sair daqui logo, não?’

O delegado trouxe-lhe o almoço. Como era o guarda que trazia suas refeições, achou que havia alguma notícia sobre a sua situação.

“Senhor! Alguma notícia da Fundação Grado?”

“Nenhuma. Tome, é o seu almoço.”

Com todo o ânimo drenado por aquela resposta, o cavaleiro sentou-se na cama e pôs-se a comer, em silêncio. O delegado encostou-se à grade oposta à sua cela, com os braços cruzados. Logo Hyoga ficou incomodado com o olhar fixo do homem mais velho, como se fosse avaliado numa espécie de exame.

“Há algo que queira falar?”

“Eu entendo que se sinta revoltado por ser órfão.”

“O quê?”

“Você não teve a oportunidade de ter uma educação adequada.”

O primeiro pensamento de Hyoga foi: ‘do que esse cara está falando?’

“Perdão?”

“Olha, não deve ficar nervoso. Como você é menor de idade, provavelmente será encaminhado a uma instituição que dará um rumo à sua vida. Mas deve parar de delirar sobre contos de fada, entende?”

“Eu acho que isto tudo é um grande mal-entendido, senhor.”

“Eu sei que isto parece um mal-entendido, mas depois você verá que nós temos razão, jovem.”

“Tem certeza de que a Fundação Grado não se declarou a respeito?”

O delegado descruzou os braços.

“Olhe, eu sei que trabalhar como office-boy para aquela empresária pode dar a ilusão de que são próximos, mas você precisa encarar a realidade. Percebe a diferença entre você e a senhorita Saori Kido? O abismo social entre vocês?”

“Mas eu não sou office-boy dela. E nós somos amigos.”

“Você é um pobre rapaz… Essas crianças de hoje em dia são iludidas tão fácil…”

Naquela altura da conversa, Hyoga perguntava-se quantos neurônios o tal delegado possuía na cabeça. Interrompera a refeição de tão chocado que ficou com as suposições do oficial.

“Será que eu poderia entrar em contato com a fundação?”

“Sinto, meu rapaz. A senhorita Kido já deu o depoimento sobre o ocorrido. Mas como ela tinha muitos compromissos, continuou a cumprir sua lotada agenda.”

“Mas se eu entrasse em contato, ela com certeza…”

“Esqueça. Logo você receberá a visita de uma assistente social.”

“Eu não preciso de uma. Já sou independente.”

“Não, não é. Eu sei que teve muitas dificuldades por ser órfão, mas não deve achar que pode fazer tudo sozinho. Tenha paciência. Vamos, coma o seu almoço.”

Assombrado com a companhia do delegado, Hyoga terminou de comer às pressas e devolveu a bandeja para dispensá-lo de lá. Quando a pegou, o homem comentou:

“E tente esquecer a história de ser um cavaleiro. Não vai levá-lo a lugar nenhum.”

“Mas… Nunca ouviu a história dos cavaleiros de Athena? Do torneio realizado há alguns anos pela Fundação Grado?”

“Ah, eu soube que era um torneio de luta livre ou coisa do tipo. Foi feito especialmente para ganhar dinheiro e atrair a atenção da imprensa, não é?”

“Eu era um dos lutadores! Sou um cavaleiro de Athena!”

“Sei… Olhe, eu sinto desapontá-lo, rapaz, mas a Fundação só o usou este tempo todo.”

“Não, eu…”

“Olha, a conversa está muito boa, mas eu preciso trabalhar. Conte a sua história à assistente quando ela vier, está bem?”

O delegado partiu, e Hyoga bateu a cabeça contra a grade, inconformado. Quando Saori o tiraria de lá?

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Como não recebera qualquer respaldo da Fundação Grado ou dos conhecidos, Hyoga acabou dependendo dos favores do lunático delegado. Enquanto lavavam suas roupas, tomara um banho e agora voltava com uma toalha enrolada na cintura.

O delegado, quando o viu nu da cintura para cima, notou as profundas cicatrizes de batalha que seu corpo carregava. Chocado, devolveu-lhe as roupas e parou à porta da cela para conversar.

“Escute, o que são essas cicatrizes?”

“Estas? São por causa do meu treino de cavaleiro.”

“De novo essa conversa sobre cavaleiros e princesas? Você não é uma criança. Vamos ser mais objetivos. Essa cicatriz que você tem no abdome, do que é?”

“Bem… Foi quando Camus estava me ensinando a usar armas. Sabe, mesmo que os cavaleiros não lutem com armas, nós recebemos um treinamento básico de cada uma para aprendermos a nos defender delas durante a luta. Este foi um corte que ele me fez com a espada. Lembro que quase desmaiei nesse dia.”

“O seu tutor fez isso?!”

“Sim… Camus me ensinou tudo o que sei antes de morrer. Sou grato a ele.”

O olhar incrédulo do delegado fez Hyoga engolir seco. Só então lembrara que pessoas como ele não estavam acostumadas a machucados daquele porte.

“Ele não me machucou por mal. É impossível treinar luta sem se machucar.”

“Entendo”, comentou o delegado. Mas Hyoga notou por sua entonação que não entendera nada. “E esse Camus fazia isso com que freqüência?”

“Não, você não entendeu. É arte marcial para guerra. É normal ficar machucado, não é nenhuma forma de tortura.”

“Sei. Pobre rapaz… Agora vejo que vandalismo é pouco para o que foi o seu passado.”

“Não… Não é isso. Eu só queria salvar a Eiri. Já tentaram contatá-la? Ela pode confirmar a minha história.”

“Eu sinto muito, rapaz, mas ela ainda está desaparecida. Puxa, até que está sendo bem comportado. Creio que um pouco de atenção é tudo o que precisa.”

“Mas não sou um vândalo, estou falando isso. Se fosse, toda a sua delegacia estaria em pedaços!”

“Sei… Bem, a assistente social logo chegará. Conte a ela tudo sobre o seu antigo tutor, entendeu? Eu desejo a você sorte, rapaz.”

Deixado na prisão, Hyoga sentia que, quanto mais falava, mais encrencado ficava. Além do mais, Saori ainda não resolvera ajudá-lo. Sem saber como agir, deitou-se na cama e esperou, desejando que a assistente fosse mais inteligente que o delegado.

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A assistente social chegou à tarde, depois de Hyoga pegar no sono. Espiou o interior da cela, apenas com a cabeça visível a Hyoga e em seguida colocou-se próxima à porta, acompanhada do guarda. Carregava uma prancheta para anotações junto ao corpo e tinha os cabelos curtos e feições delicadas.

De inicio, hesitou em acordá-lo, pois Hyoga dormia profundamente, enrolado no lençol. Mas bateu a caneta de leve na grade, acordando-o.

“Desculpe interromper seu descanso, mas… Você é o Hyoga?”

“E se eu for?”

“Meu nome é Ayame Kawano. Sou assistente social, vim conversar com você, Hyoga. Será que eu posso fazer algumas perguntas?”

“Eu suponho que sim. Se isso me ajudar a sair desta prisão…”

“Não se preocupe, tudo vai dar certo. Por favor, guarda, pode abrir a porta para nós?”

O guarda obedeceu, e Ayame sentou-se na cadeira que lhe foi trazida. Hyoga fitou-a por alguns momentos, perguntando-se se finalmente teria a tão sonhada liberdade. Ayame tinha cara de ser uma daquelas que chorava ao ver qualquer cena de um drama.

“Muito bem… Vamos começar? Pela ficha que eu tenho aqui, você passou um ano no Hoshi no Gakkuen depois que sua mãe faleceu, é isso?”

“Correto.”

“E depois foi adotado por Mitsumasa Kido.”

“Ele era o meu pai biológico.”

“Você tem certeza disso, Hyoga?”

“Ele era. Minha mãe contou para mim.”

“Certo… Então você foi adotado pelo sr. Kido e depois pelo sr…. Camus, é isso?”

“Bem, ele era o meu mestre.”

“E você gostava muito dele, né?”

“Ele era exigente, mas foi um exemplo para mim. É como se fosse um pai.”

“E ele era bom para você?”

“Sempre foi. Eu sou o que sou por causa dele.”

Ayame sorriu enquanto anotava numa folha em branco e fitou-o como se fosse uma criança inocente.

“Você é um bom menino, Hyoga.”

Hyoga olhou-a, incrédulo. No que ela estava pensando?

“O delegado Koga contou-me sobre as cicatrizes… É verdade que foram causadas por seu tutor?”

“São resultados de treinos. Mas é normal, quando treino sozinho, também me machuco.”

Ayame ficou boquiaberta, e Hyoga tentou corrigir.

“Não é o que está pensando. Quando praticamos esportes, caímos e nos machucamos, certo? Eu pratico artes marciais, é a mesma coisa.”

Ayame tentou sorrir, embora Hyoga notasse que ela estava visivelmente abalada.

“E você participava de torneios?”

“Torneios? Não, eu luto para proteger a Saori. Quer dizer… O único torneio do qual participei foi o Torneio Galáctico criado pela Saori. Mas ele foi interrompido no meio.”

“Entendo. É verdade que um dos participantes quase morreu?”

“Está falando do Shiryu?”

“Sim, acho que tenho a ficha dele aqui. Ah, aqui está! Tadinho, ele também é como você…”

Vendo a expressão de pena de Ayame, Hyoga jogou fora todas as esperanças que depositara naquela entrevista. No final, estava sendo pior que conversar com o delegado.

“Sabe, Ayame, estamos com um pequeno problema aqui. Um mal-entendido que poderia ser facilmente esclarecido por Saori Kido, da Fundação Grado. O pessoal da Hoshi no Gakkuen também pode me libertar. Por que não me deixam entrar em contato com eles?”

A assistente ficou em silêncio por um momento, emocionada. Em seguida, seus olhos úmidos voltaram-se para baixo.

“Você é tão bonzinho, Hyoga… Mas ingênuo…”

Quando as lágrimas caíram e pingaram na calça que ela usava, Hyoga não sabia se ria ou se desesperava. Ele era um dos cavaleiros de Athena mais poderosos, mas estava em apuros!

“Escute, Ayame, acho que você não entendeu…”

Ela fez sinal para que ele parasse de falar e enxugou as lágrimas.

“Não… Não diga mais nada, Hyoga. Eu prometo que vou ajudar você, tá?”

Com o que disse, Hyoga realmente teve vontade de chorar. A ajuda que queria não era bem a que Ayame ofertava.

“Mas eu só quero sair daqui!”

“Você vai sair. Eu prometo. Só preciso arrumar alguns papéis para transferi-lo, tá? Você não precisa mais sofrer…”

O sorriso doce de Ayame era o inferno para ele. Ela tirou uma bíblia da bolsa e entregou-lhe.

“Vou dar isto a você. Acho que pode ajudá-lo.”

“Eu já li a bíblia. Era a religião da minha mãe.”

“Leia de novo. Você verá como é bom.”

“Eu não sou mais cristão. Eu sigo a Saori, a deusa Athena. Eu respeito outras religiões, mas eu tenho a minha, ok?”

“Eu sei que é difícil para você. Faça isso, Hyoga. Eu volto amanhã para ver como está.”

Ela deixou a bíblia sobre o armário e sorriu de novo, como se Hyoga fosse uma criança perdida. E ele estava tão irritado que achava que arrebentar as grades e fugir seria muito melhor que ficar cercado de idiotas.

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Hyoga entrou no táxi que Ayame chamara, perguntando-se se era o certo a fazer. A assistente sentou-se ao seu lado no banco traseiro e sorriu daquela forma que ele tanto odiava.

“Você vai fazer muitos amigos novos aonde vai. Não se preocupe, logo estarão se divertindo juntos.”

O rapaz fez uma pausa silenciosa, antes de responder:

“Ayame, você trabalha geralmente com crianças, não é verdade?”

“Você acertou! Como descobriu?”

“…Sorte.”

“Você é muito esperto, Hyoga!”

“Primeiro me chama de ingênuo. Agora, sou esperto. Você é meio contraditória, sabe?”

“Eu entendo, Hyoga. Sei que tudo parece confuso para você agora. Mas não se preocupe, eu vou cuidar de tudo para você!”

O rapaz não evitou a expressão de estranheza com o comentário, mas não respondeu; preferiu mudar de assunto.

“Então… Você trabalha há muito tempo como assistente social?”

“Há dois anos! Desde então já ajudei mais de cem crianças como você! Não se preocupe, pois está em boas mãos.”

Por um momento, Hyoga cogitou perguntar qual era a idade dela para chamá-lo de criança, mas achou que seria indelicado demais.

“Deve ser um trabalho gratificante.”

“Sim, é muito! Você também pode ser um quando crescer, Hyoga.”

“…Não, obrigado. Prefiro continuar como cavaleiro de Athena.”

“Não diga isso, querido… Um dia verá como isso é bom para você…”

“É… Um dia, quem sabe…”

“Lá você pode praticar esportes, estudar, até arranjar uma namorada! Não é ótimo?”

“Eu suponho que sim, Ayame. Escute, será que eu posso entrar em contato com a Fundação Grado de lá?”

“O quê? Escute, Hyoga… Eu não queria dizer isso, mas… A Fundação Grado não é boa para você. Você precisa entender que o melhor para você é a nossa instituição.”

“E a Hoshi no Gakkuen? Posso falar com a Miho, professora de lá?”

“Mas Hyoga, a Hoshi no Gakkuen é da Fundação Grado… Toda a sua vida foi controlada por ela, percebe? Eu sinto muito, deve ser tão difícil para você… Nós vamos mover uma ação contra ela.”

“O quê? Mas por quê?”

“Ainda é muito cedo para entender. Quando for adulto, eu lhe explico.”

“Eu já sou um adulto!”

“Sim… Olha, vamos primeiro conhecer a instituição, tá? Depois eu prometo que vou contar tudinho para você.”

“Vocês não podem processar a Fundação! A Saori é a minha amiga!”

Ayame fitou com os olhos marejados.

“Hyoga… Ah, eu não devia ter contado para você… Pobrezinho…”

Hyoga calou-se, sem saber o que fazer. Podia fugir daquela louca. Mas então seria considerado um fugitivo, além de vândalo. E se mostrasse o cosmos? Poderia ser seqüestrado por uma equipe de cientistas interessados no cosmos. E até o final da viagem, não teve outra idéia.

“Chegamos!”, anunciou Ayame, cantarolando “esta é a sua nova casa, Hyoga. Melhor que a delegacia, não acha?”

O prédio parecia um colégio. Envergonhado, Hyoga permaneceu no táxi e não quis descer. Aquele não era onde ele devia estar!

“Escute, Ayame. Eu não preciso disso. Só quero voltar para a minha casa, na Sibéria.”

“Aiii, eu sei que é difícil. Mas vamos, nem que seja só para olhar, Hyoga!”

Hyoga olhou para o outro lado, aborrecido.

“Eu prefiro ficar na prisão.”

“Não diga isso! Lá é o lugar errado para você!”

“Eu sei, mas não estou familiarizado com esse ambiente de colégio.”

“Significa que está familiarizado com a prisão! Coitado! Já esteve em prisão antes?”

Não querendo se encrencar mais ainda, apressou-se para responder:

“Não, foi a primeira vez… Mas é que eu preciso pagar pelos danos que causei.”

Ayame sorriu, como se o compreendesse.

“Não tenha medo, querido… Tudo vai dar certo, confie em mim!”

Hyoga estava pessimista com tudo aquilo, mas cedeu e saiu do carro. Só esperava que Saori o encontrasse logo.

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Ayame sorria para o grupo de terapia, enquanto apresentava Hyoga a todos. A terapeuta que cuidava da classe era uma moça chamada Sachi Yoshida, que parecia mais uma professora. O cavaleiro era provavelmente o mais alto e mais velho do grupo, o que lhe trazia uma sensação desagradável.

“Este é Hyoga, e ele veio fazer companhia a todos.”

Sachi sorriu-lhe e entregou-lhe uma folha de papel em branco.

“Seja bem-vindo, Hyoga. Espero que goste daqui.”

“Hum.”

Hyoga dirigiu-se ao canto mais distante da sala e encostou-se à parede, com os braços cruzados. Ayame aproximou-se da terapeuta e falou em voz baixa para ele não escutasse, embora Hyoga pudesse escutá-las muito bem.

“Ele ainda não sabe que o que houve com ele e está passando por uma fase muito difícil, Sachi. Você é a melhor nisso, faça um milagre.”

Ayame sorriu de novo para Hyoga, agora como se fosse uma mãe a deixar o filho na escola.

“Comporte-se, Hyoga. Você vai se acostumar logo.”

Mentalmente, Hyoga a amaldiçoava com todas as palavras possíveis. Por fora, mantinha-se frio e neutro à situação. Sachi sorriu para todos.

“Muito bem, vamos continuar. Quero que vocês escrevam tudo o que vier na mente nesse papel pelos próximos dez minutos. Qualquer coisa que seja! Podem começar.”

Hyoga olhou brevemente ao papel na mão esquerda e colocou-o sobre a mesa. Entretanto, não moveu um dedo a mais. Enquanto todos estavam concentrados na tarefa, Sachi aproximou-se.

“Não quer participar, Hyoga?”

“Não estou pensando em nada no momento.”

“Você está. Nós sempre estamos pensando. Por que não escreve?”

“Muito bem. Suponha que eu estivesse pensando em algo.”

“Sim. E então?”

“E eu escreva nesse papel que me deu.”

“Seria o propósito deste exercício.”

“E depois você leria.”

“Claro.”

“E depois sairia chorando.”

“Por que, Hyoga?”

“Nem queira saber por quê.”

“Então…”

A terapeuta sorriu, pegou o papel e colocou-o em sua mão.

“Faça-me chorar.”

A expressão de Hyoga notou o tom de desafio em Sachi. Ela parecia estar acostumada a tipos difíceis como ele e não seria intimidada facilmente. Mas ela não estava lidando com um rapaz comum.

Hyoga pegou o papel e concentrou o cosmos de forma discreta, congelando-o. Com certeza os dedos de Sachi seriam levemente congelados com aquele truque. Depois de congelá-lo, ofereceu-o de volta.

“Leia.”

“Mas você não escreveu nada nele.”

“Eu escrevi. É uma mágica. O que escrevi aparecerá quando você tocar nele. Experimente.”

Se ela queria desafiá-lo, teria de aceitar suas regras. Sachi cedeu e pegou o papel. Como esperado, o gelo subiu em seus dedos, dando-lhe um imenso susto. Imediatamente, ela soltou o papel e afastou-se dele.

“O que é isso?!”

Hyoga sorriu maldosamente e saltou pela janela aberta.

“Agora chore.”

Aquela era a chance perfeita para fugir e entrar em contato com a Fundação Grado. Podia ser uma instituição para jovens carentes, mas ele se sentia num manicômio. Pulou a cerca com agilidade e saiu correndo pelas ruas. Não se importava mais que o chamassem de fugitivo. Saori consertaria tudo quando se encontrassem.

No entanto, para o azar do cavaleiro, Ayame estava subindo no táxi para ir embora, quando o viu fugir.

“Hyoga! Motorista, siga aquele rapaz loiro!”

E a absurda perseguição começou. Hyoga começou a desviar por vielas e pequenas passagens na tentativa de desviá-los, mas Ayame também provava ser uma pessoa persistente.

“Espere, motorista! Eu sei aonde ele vai! Vamos direto!”

Hyoga logo notou que Ayame não mais o perseguia. Achando que a despistara, suspirou e diminuiu o ritmo. Em breve chegaria à Fundação Grado e resolveria toda a confusão.

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Ao aproximar-se da rua da mansão, Hyoga estava mais calmo. Caminhava com tranqüilidade, achando que tudo estava bem. Contudo, quando passou por uma travessa, subitamente foi agarrado por Ayame.

“Ahá! Eu peguei! Muito bem, mocinho, é hora de voltar! Eu sabia que viria para cá!”

Como era uma pessoa inocente, Hyoga não se viu no direito de afastá-la com um golpe. Restava-lhe dialogar.

“Ayame… Espere, deixe-me conversar com a Saori.”

“Você não deve! Você não percebe, Hyoga? Eles o estão iludindo! Desde criança, você sempre foi educado para ser torturado e ver isso como algo normal! Não é normal!”

“Mas eu expliquei que sou um cavaleiro de Athena! Isso é normal para um cavaleiro!”

“Ser um cavaleiro de Athena é outra desculpa inventada por essa Saori, não percebe? Você está sendo usado!”

“Está enganada, Ayame! Por que não entra comigo e conversa com a Saori? Verá como não é assim.”

“Você ainda não está pronto! Precisa passar pela terapia da Sachi antes!”

“Eu não preciso de preparação. Vamos, não será nada ruim.”

“Hyoga… Você não entende… Estou tentando ajudá-lo… Você precisa de ajuda. Tudo o que eles fazem é torná-lo num delinqüente. Mas você não é assim de verdade…”

“Ayame…”

Subitamente, Hyoga foi puxado para trás. Ayame mostrou os olhos úmidos.

“Eu sinto muito, Hyoga… Mas em casos assim, nós somos obrigados a…”

Vários funcionários do instituto, incluindo Sachi, caíram furiosamente sobre ele. Como não podia atacar pessoas inocentes, e sendo aquela a única saída possível, Hyoga não teve escolha a não ser ceder. Só viu o tecido branco cobri-lo rapidamente, no desespero de imobilizá-lo. Quando sua cabeça passou pela gola, foi atirado contra o chão. Só então percebeu que tinham acabado de vesti-lo com uma camisa de força.

O que faria agora? Usaria o cosmos e fugiria até a mansão? Mas e se os ferisse daquele jeito? Todos estavam tão próximos que um movimento de cosmos seria perigoso.

“Parem com isso! Eu só quero conversar com a Saori! É só isso!”

“Não podemos. Vamos lidar com tudo em seu lugar. Por enquanto, entre no furgão e esfrie a cabeça lá. Você nos forçou a isso, jovenzinho. Vamos.”

Com cinco funcionários à sua volta, Hyoga acabou obedecendo. Sentia-se um prisioneiro com aqueles malucos. Com os braços imóveis, estava à mercê da instituição e de suas terapias malucas até que Saori o salvasse de lá. Só Athena poderia prestar-lhe aquele favor. Mas… Se ela não tinha dado nenhum sinal de vida até aquele momento, provavelmente não o faria tão cedo. Desesperado, Hyoga decidiu correr. Quanto antes, precisava pegar um avião de volta para a Sibéria, bem longe daquela maluca. Congelou a camisa de força discretamente, enquanto distraía a assistente social.

“Eu sei que é estranho, mas conheço Saori e sou amigo dela. Olha, já faz anos. E eu garanto que sempre fui muito bem tratado lá.”

“Eu imagino… Mas Hyoga, você acha normal eu ficar machucada e cortada?”

“O meu trabalho é exatamente impedir que pessoas como você fiquem machucadas. Eu devo ficar machucado por elas, mas não quer dizer que eu esteja sendo maltratado. É que o meu trabalho exige riscos.”

“Ah, Hyoga… Não sei como consertar essa sua cabecinha…”

“Consertar…? Não há nada de errado com ela.”

“Não é que há algo de errado com ela. Você só não percebeu ainda, Hyoga.”

“Percebi o quê?”

“Que a fundação… Não, não posso dizer ainda. Você precisa fazer a terapia e só depois perceberá a verdade… Oh, meu Deus!”

O rapaz suspirou. Aquela garota estava mesmo tão preocupada com ele? Como a camisa de força já estava suficientemente congelada, estourou a vestimenta, ficando sem camisa nenhuma. Com o cosmos, arrombou a porta do furgão e saiu correndo novamente pelas ruas de Tóquio. Quanto mais distante daquela mulher, melhor. Pulou o portão da propriedade da mansão Kido e pôs-se a correr à procura de algum empregado. Atrás dele, Ayame correu, surpreendentemente saltou o muro e seguiu-o.

“Hyoga, não fuja! Você não deve voltar para a Srta Kido!”

“Por favor, alguém!”

O único funcionário presente naquela região do jardim era um rapaz que tinha sido empregado no dia anterior e, portanto, não fazia a menor idéia de quem era Hyoga.

“O que está acontecendo aqui?”

“Empregado! Chame a senhorita Kido, agora mesmo! É urgente!”

“Mas quem é você?”

“Sou eu, Hyoga! Eu estou hospedado aqui! Vamos, chame logo!”

“Você não está hospedado aqui!”

Ayame alcançou-os e sorriu para Hyoga com pena.

“Pobre Hyoga… Ele não compreende que ninguém da fundação irá ajudá-lo…”

“Mas… Você precisa acreditar em mim! Eu realmente estou hospedado na mansão! Eu sou amigo da Saori!”

“Mas… Eu não me lembro do senhor…”

“É porque você não tem memória alguma! Agora me deixe passar!”

“Infelizmente, não posso permitir isso, senhor…”

Hyoga sentiu a mão de Ayame puxar-lhe o braço, como se ele fosse uma criança birrenta.

“Hyoga, isto não está certo. Nós devemos ser mais educados com as pessoas e não podemos entrar na casa dos outros sem permissão. Vamos voltar.”

“Mas eu estou hospedado aqui! O que preciso fazer para você acreditar em mim?”
“Eu acredito em você, mas primeiro precisa fazer a sua terapia. O que acha de voltarmos para os seus amigos?”

“Não! Eu preciso conversar com a senhorita…”

Naquele instante, Hyoga sentiu algumas picadas nas costas. Instintivamente, olhou para trás e deparou-se com o motorista do furgão com a boca numa zarabatana. Nas costas, dois pequenos projéteis estavam fincados. Aquilo não era o que faziam com animais selvagens? O que eles pensavam que o cavaleiro era? Um macaco?

“Isto são… dardos com soníferos?! Eu não sou um animal selvagem para ser tratado assim, Ayame!”

Com o olhar molhado, Ayame cobriu a boca com uma das mãos, num pesar duvidoso.

“Oh, Hyoga… Eu sinto muito… Mas você ainda vai me agradecer por isto…”

“Sua… Você não compreende que…”

Antes de terminar a frase, Hyoga tombou. Tentara manter-se desperto, mas foi impossível.

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Quando recobrou a consciência, a primeira coisa que Hyoga viu foi o sorriso reconfortante de Saori. Finalmente ele estaria longe da encrenca.

“Diga que eu tive um pesadelo, Saori…”

“Infelizmente não… Me desculpe ter estado ausente. Eu tive de lutar contra Éris.”

“Contra Éris?! E… os outros… estão bem?”

“Estamos todos bem, Hyoga, já resolvemos o problema. Vim aqui resolver o seu…”

“Ah, que alívio… Por favor, explique para eles da minha situação…”

“Eu já conversei com a senhorita Kawano e já decidimos como fazer. Você vai fazer terapia por um ano, mas vai continuar morando na mansão.”

“O quê?! Saori, você não consegue uma solução melhor para mim?! Eu não quero fazer terapia alguma!”

“Fique calmo, Hyoga… Acalme-se e acompanhe as minhas palavras.”

Saori piscou-lhe um olho, pedindo por sua colaboração. Na certa, estava impedida de conversar sobre o assunto abertamente. Compreendendo-a, Hyoga acatou as regras de seu jogo.

“Mas um ano de terapia, Saori…? Não acha desnecessário?”

“Desculpe… É necessário…”

“Entendo… Vindo de você, eu entendo.”

Na verdade, Hyoga não estava entendendo absolutamente nada. Esperava que Saori fizesse algo de especial para salvá-lo, mas não sabia o quê. A deusa abriu a bolsa e tirou um envelope de dentro.

“Eu sei que será difícil para você, por isso trouxe um presente. Sabe aquela foto da sua mãe? Eu trouxe para encorajá-lo. Está dentro do envelope. Olhe com muito cuidado, Hyoga.”

“Obrigado.”

Foto de sua mãe? Mas do que Saori estava falando? Não existia nenhuma foto de sua mãe, e Saori estava sendo enfática no cuidado com aquele envelope. Respondeu:

“Saori… Eu não estou muito bem agora. Por favor, eu gostaria de privacidade agora. Quero ficar sozinho para pensar.”

“Está bem. Eu vou avisar a senhorita Kawano para você. Descanse bem. Você merece. Realmente merece.”

“Obrigado, Saori. Desculpe por não ter ajudado vocês.”

“Está tudo bem.”

Com a saída de Saori, Hyoga virou-se de lado para a cama. Sabia que o observavam através daquele espelho, por isso escondeu-se sob o cobertor para ver o que havia dentro do envelope. Sorriu assim que tirou o pedaço de papel. Era uma passagem de avião de volta para a Sibéria, que partiria em uma hora. Tempo suficiente para subir no avião sem ser seguido. Enfiou a passagem de avião na carteira, levantou-se e queimou o cosmos.

Ayame abriu a porta às pressas, chocada com o brilho do cosmos do cavaleiro.

“Hyoga! O que está acontecendo? Você está bem?”

“Eu estou ótimo, Ayame”, respondeu, sorrindo. “Agora estou ótimo!”

O cosmos explodiu contra a parede e abriu um buraco para fora do prédio. Hyoga saiu correndo em direção ao aeroporto. Agora não havia como ser preso! Para ter certeza de que ninguém o seguiria, correu na velocidade da luz e desapareceu da vista de todos. Em breve estaria voltando para casa.

Não levava nenhuma bagagem, mas bastava ir para longe daqueles malucos para deixá-lo feliz. Chegou ao aeroporto, subiu no avião e sentou-se confortável em sua poltrona. Sorria sozinho. Estava livre! Livre!

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“Olá! Você é o Hyoga, não é?!”

Hyoga parou feito uma estátua. Ayame estava em sua casa?! O que significava aquilo? Como ela tinha descoberto e vindo tão rápido?

“A-Ayame…?”

“Oh, não, não, não… Eu não sou Ayame. Meu nome é Tomie Kawano. Sou a irmã gêmea da Ayame. Estou estudando em São Petersburgo, e Ayame me ligou há poucas horas. Ela me pediu para ajudá-la na sua terapia. Você não se importa se eu passar um tempo aqui, não é? Vamos lá… Eu trouxe estes papéis coloridos comigo e estas canetas…”

A carteira de Hyoga desabou no chão sonoramente, enquanto o rapaz permanecia em silêncio. Subitamente, teve uma vontade enorme de sair chorando. Aquele seria um longo… longo dia.

*FIM*

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