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[Rayearth] Do Seu Jeito - Capítulo 11, escrita por Anita

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Autor: Anita
Fandom: Guerreiras Mágicas de Rayearth
Gênero: Romance, Comédia, Aventura, Drama, em capítulos.
Classificação: 12 anos.
Resumo: As guerreiras retornam a Rayearth e fenômenos estranhos começam a surgir em seus caminhos. Uma esfera negra, sonhos com imagens inexplicáveis... Centrada em Lantis e Lucy, com grande participação das outras e seus romances nem sempre felizes.

Notas Iniciais:
Como sempre lembro aqui, Rayearth não é criação minha e sim da Clamp e de quem mais for. Não ganho dinheiro com isto. Nenhum dinheiro... Há, no entanto, personagens originais como a Liana os quais foram criados por mim. Aliás, se realmente gostaram da Lianinha, são encorajados a lerem outras histórias minhas das quais ela faz parte como E Se Eu Te Deixar Ir? e Ainda Estarei Esperando, não tem nenhum spoiler lá, são panos de fundo bem diferentes deste aqui. E não se esqueçam de comentar, comentários fazem o autor feliz!


Olho Azul Apresenta:
Do Seu Jeito



Capítulo 11 — Intenções Ocultas

  Ele parecia sincero, encarando-o de olhos esbugalhados e interrogando-o sobre o feitiço que Lantis havia acabado de usar. Sim, não era algo que se encontraria em qualquer lugar, mesmo sem haver estudado feitiços a fundo, Lantis sabia reconhecer um raro.

- E está tudo acabado com isso? — Com essa, Clef parecia haver terminado sua sucessão de perguntas ao discípulo.
- Não. Apenas remediei um dos sintomas. O que quer que os esteja causando voltará a atacar. Mas isto apenas confirma minhas suspeitas de que o equilíbrio de Zefir está sendo afetado de propósito. — Lantis estudou o mestre após dizer essas palavras.

  Clef agora tinha os olhos desfocados, era difícil ler qualquer coisa além. Por isso, não havia opção para descobrir mais se não aproveitar aquele confronto interrompido pela esfera.

- Clef... — Mantinha a voz calma e baixa, era tal como se houvesse retornado às aulas e só estivesse para esclarecer uma dúvida corriqueira. — O chefe dos gurus morreu há cerca de quatrocentos anos atrás, o que significa que você já era vivo quando os ataques aconteceram. E estes ataques estão atacando Zefir diretamente, tal como o gênio da guerreira mágica disse em sonho. Se não agirmos logo, todo nosso mundo pode sucumbir.

  Era a primeira vez que Lantis achava seu mestre tão pequeno. Até então, independente de sua altura, sempre o olhava para cima. Mas agora era impossível pela forma como ele se encolhia, ainda perdido em pensamentos.

- Para esse feitiço capaz de afetar o equilíbrio de Zefir não estar em nenhum livro, ele deve haver sido banido, certo? Como consequência, sequer temos acesso a um contra-feitiço.
- Lantis...
- Serei mais direto para facilitar: culpado ou não, você já presenciou esse fenômeno antes. Desfaça-o agora.

 Os sons vindos de trás dele quebrou-lhe a concentração, lembrando-o de algo ainda mais importante que Zefir. Lantis virou-se, apressando-se para se ajoelhar ao lado de Lucy, quem parecia estar recobrando os sentidos. Olhá-la tão pálida nos braços das duas amigas trazia-lhe as lembranças de quando a vira dentro da esfera negra, seu corpo sendo levado para fora de seu alcance. Não havia mais nada que ele pudesse fazer, sua espada também funcionava. Era como se seus golpes não estivessem acertando a esfera, era como se ele estivesse atacando um holograma. O fenômeno parecia criar semi-dimensões que isolavam Lucy, mesmo quando esta estava bem ali acima de sua cabeça. Todo o equilíbrio daquele cômodo havia se perdido com sua presença, e ele próprio não sabia mais se ainda estava lá ou flutuando na escuridão.

  Mas, desde que Lantis ouvira que aquele poderia ser um feitiço, ele vinha estudando as anotações daquele chefe dos gurus. Zefir ainda estava inteira. Ninguém nunca soubera de nada. Aquele feiticeiro havia conseguido conter o fenômeno e, provavelmente, garantido que ninguém mais o invocasse novamente. Aquele contra-feitiço que salvara Lucy da esfera estava apenas rascunhado em um dos diários. Era muito estranho que ele restabelecesse o equilíbrio de Zefir, por que alguém estudaria sobre isso quando o pilar já o fazia naturalmente? Por isso aquelas notas de tanto tempo antes do fenômeno haviam ficado em sua mente.

  Não conseguia crer que dera certo. Olhava para Lucy e era como se a houvesse perdido, como se estivesse sonhando que o gesto desesperado houvesse funcionado mesmo.

- Lantis... — disse ela com a voz embargada. Então, sorriu-lhe.

  Em resposta, ele lhe apertou a mão. Estava tão gelada... Quando a jovem retribuiu, seu coração enfim encontrou um sossego: Lucy estava mesmo bem ali.

- Clef — a voz de Marine o tirou daquele momento. A guerreira mágica havia saído do lado da amiga e se levantado, voltada em direção ao mago.  Seus olhos estavam molhados, mas a própria não parecia se importar — ou notar? — que estivesse chorando. — Clef! Diga... não é você, né?
- Marine... — Anne disse em um quase sussurro.
- Clef! — Agora a guerreira mágica já estava bem na frente do outro e lhe segurava os ombros. — Eu não quero acreditar que foi você, mas por que tem que agir assim? Desde que chegamos, você não parece o mesmo. Não nos contou sobre os ataques e quando contou mentiu que era só um fenômeno que acontecia de vez em quando, como se fosse normal que nem os monstros que vemos lá fora. E não é! Pior, você também escondeu sobre o Lantis ter se ferido e ainda por cima proibiu Anne e Lucy de ficarem com quem elas amam. — A jovem olhou rapidamente, como que a fim de chamar a atenção de todos para a mão que Lantis ainda segurava. — Eu não sei se consigo te reconhecer. Por que tem agido assim?
- Para que não tenham motivos para ficar. — A resposta vinha seca e automática. Clef não precisou de tempo algum para pensar na mesma. E ele prosseguiu da mesma forma, calmamente: — Afinal Zefir é a terra onde impera o poder do pensamento. Quanto mais problemas para resolver, quanto mais pessoas com quem se relacionar, menores as chances de voltarem para casa.
- E se nós não quisermos voltar para casa? E se quisermos ficar para sempre?

  Marine mal havia terminado a pergunta e Clef já respondia prontamente:

- Não podem!
- Você é o único que pensa assim. Bem, você e o Rafaga. — Ela virou os olhos.

  O comandante da guarda, no entanto, se aproximou de ambos para se defender. Até mesmo Lantis sabia que havia sido acusado injustamente.

- Eu nunca disse isso — retorquiu Rafaga. — Eu só acho que suas amigas não podem ficar arrumando companheiros por aqui se não podem controlar quanto tempo ficarão em Zefir. Pensem nas consequências! E se... vocês sabem... — O rosto dele começou a ficar vermelho e seus olhos procuravam nos das três guerreiras compreensão de o que ele queria falar. — Vocês sabem o que acontecem com companheiros. E isso não tem como evitar muito bem. Acontece. É natural. Dá pra evitar com isso ou aquilo, mas vocês sequer são daqui. E se vocês quiserem? É natural — ele se repetiu.
- Naturalmente — interrompeu Ferio, dando tapas leves nas costas de um frustrado Rafaga.

  Percebendo que não havia mais nada a dizer, Lantis puxou cuidadosamente Lucy para si e a levantou com os braços de forma a carregá-la.

- Lantis! — o grito surpreso da guerreira mágica pareceu roubar a atenção de todos das explicações de Rafaga até o casal que rumava para a saída. — Não precisava me carregar, eu tô bem.
- Vou levá-la até seu quarto.
- Mas eu... — Lucy tentou repetir.

  Contudo, Lantis a interrompeu ao se voltar mais uma vez para seu mestre.

- Eu o aconselho a parar com o feitiço, Clef. Pois, enquanto ele estiver em andamento, há uma alternativa, caso de não encontremos o contra-feitiço.  — Lantis tornou a se virar e a andar para a saída. — Quando o feiticeiro morrer. E não importa quem ele seja, não permitirei que machuquem Lucy novamente.

  Não havia como ver a expressão de Clef, mas Lantis sabia que havia causado impacto com sua ameaça pela forma repreensiva com que Lucy o encarava desde seus braços. Ainda lhe pediu desculpas quando já estavam a sós no corredor, mas nem ele mesmo se desculpava pela ira e frustração que revirava o estômago no momento.

  Não obstante Lucy estar bem em seus braços, o sentimento de havê-la perdido remanescia amargo em sua boca.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

  - Aqui está, meninas!

  Anne observou Caldina se aproximar da pequena mesinha em seu quarto e depositar ali a bandeja com peças para o chá que lhes havia prometido tão logo ouvira o que havia acontecido no salão de Clef. Inicialmente, a guerreira mágica havia recusado o convite e fora a seu quarto dormir, tão logo confirmara que Lucy estava bem em seu quarto junto com Lantis e que logo Priscilla também chegaria.

  Mas como dormir quando as imagens distorcidas daquele ataque ainda a assustavam? Era engraçado, como ter mais sonhos ajudaria a todos, mas ela estava tão preocupada com não poder fazer nada que estava incapaz de dormir. Era a mesma lógica de gritar para alguém nervoso se acalmar, né? Ninguém realmente quer ficar nervoso; se dependesse dessa pessoa, ela já haveria se acalmado.

- Vamos, sirvam-se! — disse a mulher, mostrando a própria xícara em mãos. — As duas precisam estar muito bem agora na reta final. Ouvi que Lantis já tá bem perto de desvendar tudo, né?

  Anne foi a primeira a alcançar a própria xícara e tomar um breve gole. A sensação de queimadura que o líquido fazia contra sua garganta era reconfortante.

- Só gostaria que houvesse algo que pudéssemos fazer — disse ao olhar para Marine, quem parecia ainda mais encolhida que ela própria.
- Algo como confrontar o Clef de novo? — perguntou Caldina. Era a primeira vez que alguém abordava o assunto com tanta leveza.
- Não, isso não deu em muito... — Anne olhou para seu reflexo disforme sobre a superfície escura do chá. — Talvez não seja ele mesmo.

  A porta do quarto abriu logo em seguida e o cômodo pareceu lotado quando Rafaga entrou marchando.

- É claro que não é ele! De onde tiraram essa ideia ridícula?

  Caldina levantou-se e pôs uma das mãos na cintura enquanto apontava para o companheiro com a outra.

- Como pode ser tão mal educado? Ouvindo uma conversa de garotas? É isso que é ser um cavalheiro, é? Um soldado honrado? — E o empurrou no peito, fazendo-o desequilibrar momentaneamente e dar alguns passos para trás.

  O olhar arrependido que Rafaga devolvia à mulher não parecia deixar Caldina satisfeita. Mas uma risada foi o bastante para interromper o argumento. O casal parou e se voltou para Marina, quem tinha lágrimas nos olhos de tanto rir.

- Ei, você! — Caldina agora apontava na direção da guerreira mágica. — Acha engraçado esse brutamontes estar espionando a gente?
- Eu não estava! — replicou Rafaga imediatamente, sem dar tempo de Marine responder nada além de uma balançada de mãos. — E-Eu só tava p-p-passando e-e-e... — Com o rosto vermelho, Rafaga inspirou fundo e completou: - Este é meu quarto!

  Caldina não precisou de nem um instante para contrapor aquele argumento:

- E meu também — disse, enquanto punha agora ambas as mãos na cintura. — Bata antes de entrar, pelo menos. Que faria se não estivéssemos decentes, hein? — Caldina apontou para o próprio corpo. — Já pensou se só estivéssemos em nossas roupas de baixo. Ou até pior?

  A vermelhidão no rosto de Rafaga perdeu os tons da frustração e agora seus olhos não ousavam olhar nada além dos próprios pés. Era tal como se realmente fosse o que havia acontecido.

  Mas a atmosfera desconfortável foi quebrada quando as gargalhadas de Marine ganharam mais volume. Aquele som fazia o peito de Anne sentir-se um pouco menos pesado.

- Acho que eu nunca teria imaginado vocês juntos! — exclamou ela com o rosto levemente escondido pelas mãos. Foram as primeiras palavras ditas por Marine deste a conversa com Clef e o ataque. — Fico feliz que tenham dado certo, apesar de serem tão diferente. Acho que são o casal mais inusitado de Zefir.

  Mesmo sem esconder também estar aliviada com a reação da guerreira mágica, Caldina não comentou nada e apenas seguiu com aquela conversa.

- É... eu mesma fico surpresa quando penso melhor. — Sorriu e enlaçou o braço no corpo do companheiro. O gesto fez o rosto do outro ficar róseo desta vez.
- Acho que não somos nada se compararmos com Lucy. — Rafaga caminhou até uma das cadeiras e sentou com um suspiro cansado. — Não entendo o que ela veria algo num sujeito estranho como o Lantis.
- É... — concordou Marine, agora mais calma exceto por um sorriso vago no rosto. — Ele me assustava no início com aquele jeitão e a voz do Zagato. Mas, se não fosse por ele, agora há pouco... — Ela mordeu um lábio.

  Com o tom oposto de Marine, Caldina assentiu com força e disse:

- Parece ter sido uma cena bem heroica! — Era como se houvessem corações em seus olhos.
- De fato — condescendeu Rafaga. — Pude ver como ele se importa com Lucy. Não podíamos ver um ao outro naquela hora, eu não fazia ideia de o que fazer mesmo com a minha espada bem ali na minha mão. — Caldina pôs a mão em seu braço nesse momento. Talvez para dizer que mesmo assim, ele havia realizado um bom trabalho, ou para informar que já estava tudo bem. Qualquer que havia sido a intenção, o tom do outro estava mais tenso ao completar seu raciocínio dizendo: — Ainda assim, Lantis conseguiu fazer o feitiço.
- O Ferio também pulou em você bem na hora, né, Anne? — lembrou Marine.

  Anne sentiu o rosto queimar, então apenas pôde balbuciar uma resposta sem muita razão de existir:

- Bem, nós já estávamos um do lado do outro. Não foi difícil nos acharmos e...

  Contudo, Marine a interrompeu como se nem a estivesse ouvindo:

- E eu só conseguir segurar o Clef. Depois de todo o treinamento que vim fazendo... foi patético. — Ela soprou para cima, fazendo suas franjas balançarem no ar. — Pensando melhor, aquela esfera não iria atacar o dono. Até que fui inteligente. — E riu.
- Já não disse que Clef não tem nada a ver com isso? — interveio Rafaga. Ele se levantou da cadeira e começou a gesticular, apontando para a janela. — Vocês podem conhecer Zefir, mas não todos os feiticeiros que existem por aqui. Lantis mesmo, não que seja ele, mas ele aprendeu tanto quanto Zagato, né? Não podem achar que Clef é o único que pode fazer feitiços complicados. Ainda mais numa terra como esta, onde é a força do pensamento e não o tanto que sabemos que controla tudo.
- Meio que faz sentido — ponderou Caldina. — Eu não era ninguém em Tizeta, só uma dançarina, né? Mas aqui... Isso do poder do pensamento é assustador, às vezes.

  Rafaga assentiu com hesitação, mas, animado com lograr enfim ter sua tese compreendido, ele continuou:

- As pessoas de Zefir são pacíficas, por isso não saem por aí lançando feitiços. Sem contar que não é em qualquer lugar que vamos encontrar essas coisas. Olhem pra mim, eu sou um analfabeto em feitiços. Mas se eu tivesse convivido com eles, sabe, tido alguma experiência, podia muito bem abrir um livro e começar a brincar com o que tá ali. É só estar determinado. É só querer que qualquer um pode ser um grande feiticeiro. Vocês, guerreiras mágicas de outro mundo, deviam saber disso mais que ninguém. Não que eu diga que seja qualquer um. Poucos têm a chance de aprender com alguém com Clef e fazer algum uso da magia. Mas vocês não podem achar que conhecem todo mundo, tem muitos que não ficam tão famosos e viram o chefe dos gurus.

  O restante do discurso não era necessário senão para confirmar o que o início já havia despertado em Anne. E só em olhar para Marina, sabia que não era a única que havia se lembrado de haver sim ao menos mais uma pessoa.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

  Ainda assim, não levou Lantis nem um segundo de consideração antes de responder assertivamente:

- Não é ele.

  Rafaga deu alguns passos para dentro do quarto de Lucy e parecia pronto para convencer o outro à força. As duas guerreiras mágicas haviam descrito todo o necessário para haver uma segunda opção de feiticeiro. Um sábio que vivia em um local afastado do palácio havia curado Lantis das feridas em que nem mesmo a magia de Anne sortira qualquer efeito. Como essa pessoa não podia ser o suspeito e o próprio mestre daquele homem à sua frente era?

- Como pode ter tanta certeza?
- Ele me disse. — Lantis voltou a se sentar ao lado da cama onde a companheira estava, dando as costas para o comandante da guarda.
- Ei! — reclamou Rafaga.
- Ele entrou em contato telepático comigo logo após o último ataque.
- Estão falando daquele senhor? — Lucy, quem havia apenas ouvido a nova hipótese trazida por Rafaga e suas amigas, sentou-se na cama e encarou Lantis. — Por que você não me disse nada?
- Pu puuuu! — Mokona gritou desde onde estava sentado na barriga de Lucy, era como se estivesse bravo com Lantis.

  Quando o outro estava pronto a responder, Priscilla se adiantou do canto onde estava e forçou o corpo de Lucy a se deitar mais uma vez.

- Tem que descansar, Lucy... Seu corpo se machucou bastante.
- Puuu! — Mokona pulou, concordando com sua guardião original.
- Eu já estou bem! — disse a moça em tom convincente, apesar de sua aparência contradizê-lo.

  Rafaga fechou o punho, imaginando como o tal homem podia haver conhecido Lucy e ainda sido capaz de atacar aquela menina. Ele próprio ainda se punia pela vez em que, cego pela magia de Zagato, travara uma batalha com ela. Mas esse homem, deliberadamente, havia agido dessa forma. E sua raiva se redirecionava em parte para aquele que devia ser o primeiro com vontade de socá-lo.

  Após esperar até que Lucy estivesse deitada mais uma vez, Lantis tornou a falar:

- Sim, é o mesmo sábio. Ele está vindo ao palácio e poderemos conversar melhor. Pedi para Askot ir buscá-lo pessoalmente. — Após um rápido olhar para Rafaga, ele prosseguiu com se lhe houvesse lido os pensamentos: — Ele também não possui qualquer discípulo vivo e vem morando sozinho naquela casa. Ninguém mais haveria tido contato com suas anotações.

  Sentindo-se contrariado, Rafaga bufou.

- Então pra que perder seu tempo?
- Foi ele quem disse que viria, pois possuía algo para falar pessoalmente — respondeu o outro.
- Quer dizer que aquele senhor sabe algo? — indagou Lucy, virando-se para Lantis. — Bem, ele pôde te curar bem rápido, mesmo. Se aquele fenômeno não é tão comum como o Clef disse que seria...

  O rapaz se limitou a assentir, e Rafaga podia ler perfeitamente as palavras de hesitação que ele falava com aquele silêncio.

- Enquanto isso, buscarei todos os nossos registros sobre feiticeiros — declarou o espadachim. — Tem que ter ao menos alguém.
- Clef parece mesmo estranho ultimamente... — disse Priscilla com a voz fraca. Até ela agora suspeitava? Como?

  Rafaga retorquiu com pressa:

- Não. É. Ele!
- Bem na hora — a voz de Lantis cortou o efeito de sua ira e atraiu a atenção de todos.

  Sem se explicar, o rapaz se levantou e andou em direção à saída do quarto.

- Lantis? — Lucy o chamou, enquanto Priscilla já devia saber que era inútil tentar segurá-la na cama.
- Pu puuu? — Mokona desceu da cama da guerreira mágica para seguir o espadachim-mágico.

  Claramente, Askot devia haver retornado com o tal sábio feiticeiro.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

  Tentando ignorar o quão dolorido era andar e o tanto que sua vista escurecia mais a cada passo, Lucy insistiu em acompanhar todos até onde Lantis se encontraria com Askot. Mesmo Rafaga, quem vinha dizendo que preferia usar o tempo para pesquisar mais artigos, seguiu o grupo.

  O ponto de encontro era uma familiar entrada do palácio, aonde os gênios sempre as deixavam após as batalhas. Desta vez, um dos amigos de Askot cuidadosamente depositava o feiticeiro e o senhor que Lucy conhecera poucos antes — apesar de agora parecer uma eternidade atrás aquela pequena viagem com Liana e Lantis.

- Sabe, ele parece bem capaz. Tem toda a cara de vilão de filme que se disfarça de vovô sorridente com uma bengala — comentou Marine em um sussurro para Lantis.

  O sábio pareceu haver escutado, pois se curvou ainda mais sobre sua bengala de madeira e riu levemente.

- Eu não poderia fazê-lo de tão longe do palácio, minha jovem. Este é o lugar mais protegido de Zefir, afinal de contas. Não importa quantos feitiços eu possa conhecer. — Seus olhos passaram a estudar Rafaga, quem realmente parecia estar pronto para fazer alguma pergunta. Em seguida, o sábio se voltou novamente para Marine. — E confesso que essa nem é minha especialidade.
- Mas foi o senhor quem curou Lantis, não é? Mesmo quando minha magia não parecia fazer nada... — comentou Anne reticente.
- Ah, sim. Sou sempre chamado de feiticeiro por todos, mas a verdade é que faço poções. — Ele soltou mais uma risada e complementou: — Claro, para olhares menos experientes, é quase a mesma coisa.

  Anne não pareceu se abalar com a correção e tornou a perguntar:

- Isso quer dizer que o senhor sabe que foi um feitiço o responsável por tudo. O senhor sabe o que está acontecendo?

  Lentamente, o sábio assentiu e só com aquele movimento Lucy já antecipava qual seria sua resposta.

- Infelizmente, não posso dizer muito. — E voltou-se para Lantis. — Vocês veem, é parte da promessa que fiz à minha cliente.
- Não tem nada disso de promessa com um assunto que põe toda Zefir em risco! — Rafaga avançou zangado até estar frente a frente com o senhor.  Contudo foi segurado por Priscilla e Askot.

  Foi Anne quem continuou com as perguntas:

- Disse “sua cliente”?
- Pera! — exclamou Marine, lançando um olhar para Lantis. — Não pode ser!

  Lucy sentiu o ar lhe faltar ao juntar todas as peças sobre o que o namorado queria indicar ao trazer o sábio até o palácio.

- Lantis! — Ela o afrontou.
- Não estou dizendo que é a minha mãe por trás dos feitiços. Mas ela é uma das duas pessoas agindo de maneira suspeita neste palácio, Lucy.

  O sábio se aproximou do casal, passando direto por onde Rafaga estava a encará-lo, e declarou:

- Vim informá-lo do que posso. Pois eu vi os ferimentos de Lantis e os reconheço. São como os que vi há muitos, muitos anos.
- Dez anos atrás? — sugeriu o rapaz.

  O homem mais velho pareceu crescer um pouco ao acertar a postura e sorrir para aquela pergunta. Mas balançou sua cabeça.

- Algo assim não é nada para alguém de minha idade. Quando digo muitos, quero dizer...

  Mas a voz de Anne interrompeu-o:

- Quatrocentos anos — disse a guerreira mágica com firmeza.
- Ele é o tal guru dos seus sonhos!? — Os olhos de Marine se esbugalhavam ao encarar o sábio.

  Por sua vez, Anne o estudou um pouco antes de falar mais.

- Achei que fosse quando o vi chegando com Askot. Mas não poderia ser. Acho...
- Sonhos, minha querida? — O sábio, ainda apoiado em sua bengala, andou até Anne. — Então você é a menina que ingeriu a planta para acordar, certo? Liana me comentou sobre esse incidente. — Ele balançou a cabeça.
- Peraí, velhote! — Marine começou a arregaçar as mangas. — Tá dizendo que aquela planta que eu busquei fez alguma coisa com a minha amiga!?

  Em resposta, o sábio riu claramente se divertindo.

- Ao contrário, querida. A planta curou-a dos efeitos colaterais da minha poção. Dessa eu poço falar, já que diz respeito às três. Foi assim que vocês foram trazidas a Zefir, mas um efeito colateral é enfraquecer sua magia a ponto de não conseguirem ouvir nem os seus gênios. Não foi bem algo de propósito, ainda quero aperfeiçoar essa parte. Mas serviu ao propósito, né?

  Lantis foi o próximo a falar:

- Então, minha mãe queria trazê-las de volta?
- Não era isso exatamente. Direi logo o que vim fazer. — Ele se curvou sobre a bengala e limpou a garganta. — Faz pouco tempo, fui procurado para curar alguém, mas as minhas poções não bastaram. Sabe, eu tive um irmão que foi um grande feiticeiro, foi assim que Liana me conheceu. Mas não sou nada como ele.
- Você era irmão do chefe dos gurus de quatrocentos anos atrás — resumiu Lantis o que todos estavam começando a imaginar.

  O sábio assentiu com os olhos distantes.

- Eu não podia fazer o que ela queria, mas prometi ajudar no que pudesse para curá-lo. Mas Liana não voltou mais. Noutro dia, ela me apareceu do nada com algumas encomendas. É o que posso dizer sobre minha relação com sua mãe, rapaz. O restante, faz parte de minha promessa.
- Não tem nada disso de promessa — interrompeu Rafaga, a carranca voltando a lhe estampar o rosto.

  Lantis pareceu ignorar o comandante da guarda e se aproximou ainda mais do sábio.

- Além de sua relação com ela, o que mais pode me dizer?

  O senhor olhou para um dos corredores do palácio e respondeu:

- Vamos esperar pela ajuda visual.

  Por uns minutos, nada aconteceu no corredor. Até que o som de passos e a silhueta de alguém correndo em direção ao grupo fez o estômago de Lucy se apertar.

  Temia o que estava por vir. Não queria mais revirar os segredos de Liana e confirmar as suspeitas de Lantis. Por que ele não lhe dera ouvidos. Bastava confiar no quanto a mãe o amava e esperar até seus planos darem certo. Fossem quais fossem. Lucy apertou a mão do namorado, quem lhe devolveu o gesto, olhando-a decidido. Era como se lhe respondesse o quanto precisava saber de tudo.

  Quando a pessoa se aproximou o bastante para ser identificado, ela suspirou com alívio. Mesmo quando todos pareceram frustrados com a cena, Lucy nunca se sentira tão feliz em ver Ferio.

- Aí está você, Lantis! — disse o rapaz, correndo até eles. — Ué?
- Ferio! — gritou Anne, interceptando-o. — Eu aqui preocupada com onde você estaria.
- Foi mal, Anne. — O rapaz levou a mão até o rosto da namorada. — Não queria deixar esse seu rostinho lindo tão triste. — E se aproximou, como se a fosse beijar.

  Contudo, Anne virou para outro lado e deu um passo para trás.

- Aqui não... — disse baixo, mas Lucy pôde ouvi-la com clareza.

  Marine pigarreou, quebrando o momento do casal.

- Os dois já não tão satisfeitos depois de passarem a noite toda juntos?
- Isso é ciúmes, Marine? — Ferio riu de maneira afetada.

  Lucy riu em seguida ao perceber a irritação crescente no rosto de Rafaga. Mas Lantis o interrompeu antes que o espadachim encontrasse palavras de protesto.

- Ferio.

  O recém-chegado ajeitou o corpo e tornou a encarar Lantis. Em seguida, assentiu.

- Eu encontrei, mas não sei onde conseguir a chave mestra.
- Não precisamos nos preocupar. — Lantis se voltou para Lucy e também pousou o olhar sobre as amigas. — Há um lugar aonde quero que me levem.

  Era mesmo. Se estavam falando de algum quarto, Lantis havia lhe dito muito tempo antes que as guerreiras mágicas possuíam acesso livre a todos os cômodos do palácio.

- Espera — interferiu Rafaga. — Seu plano inclui entrar em um cômodo trancado? Por mais que sejam as guerreiras mágicas, não posso permitir...

  Mas ninguém pôde ouvir o restante de suas palavras, ele as perdeu quando notou haver sido transportado com todos.

  Estavam em um lugar familiar para Lucy. Não era um dos corredores de sempre, mas ela já estivera por ali antes, bem quando fora atacada na primeira vez. E agora também lembrava o que não queria, mas achava também não ser necessário dizer a Lantis: pouco depois, eles haviam visto Liana por aquele lugar.

  Ferio começou a andar para a direita do grupo e virou pelo corredor, fazendo sinal para que fosse seguido. Então, parou em frente a uma das portas.

- Aqui deveria estar vazio, né? — perguntou Askot confuso.
- Sim... — confirmou Rafaga, buscando explicações com Lantis.
- Por isso mesmo minha mãe escolheu esta parte do palácio. Apesar de exatamente por estar vazia que vê-la por aqui me chamou atenção.

  Marine foi a primeira das guerreiras mágicas a se aproximar do quarto.

- Quando a gente abrir, vai dar de cara com a sua mãe com um chapéu pontudo na frente de um caldeirão e cantando coisas estranhas?

  Nem Lucy nem Anne reagiram à piada, apesar haverem sido as únicas a compreendê-la.

  O sábio se adiantou e fez um movimento com as mãos em direção à porta.

- Por que não olham por si mesmas, queridas?
- Eu estava pensando... — Anne levou a mão até os lábios, mostrando-se hesitante. — Podíamos conversar com a dona Liana, como fizemos com Clef. Ela já sabe que você desconfia dela, né, Lantis?

  Lucy observou o namorado apenas desviar o olhar como resposta a Anne. Então, ela balançou a cabeça em desaprovação a tudo o que estava presenciando e caminhou em direção à porta. Com o movimento, esta se abriu.

  De fato, não havia nenhuma bruxa falando encantamentos lá dentro. Na verdade, a pessoa que encontraram ali sequer era Liana, mas um homem que dormia sobre uma cama, um dos poucos móveis do pequeno quarto.

- Ué... será que errei o quarto? Juro que a vi saindo daqui agora há pouco! — Ferio coçou a cabeça.

  Foi Rafaga o segundo a falar:

- Não, Ferio. Creio estarmos sim no quarto de Liana. Mas... — Seus olhos estavam fixos sobre o homem adormecido.

  Uma risada leve vinda do sábio interrompeu as tentativas do espadachim de falar o que aquela pessoa significava.

- Sim, este é o homem que Liana desejava curar quando me procurou pela primeira vez. Uns anos atrás.
- Anos? Impossível! — exclamou Rafaga. — Esse velho só pode estar gagá!

  Lucy se assustou ao sentir um toque gelado sobre sua mão. Olhou para Lantis, cujos lábios balançaram repetidamente até algum som sair:

- É meu pai...

Continuará...

Anita, 11/12/2013

Notas da Autora:

Quase escrevo autoria, rs (sim comentário aleatório, foi mal). Eu tenho demorado muuuuito pra publicar esta fic, olha a data que escrevi o capítulo e a data de hoje! (Sim primeiro de outubro de 2014..... que vergonha, Anita!) Então, vou cometer um absurdo de abuso com vocês leitores e mandar a fic antes de eu realmente estar satisfeita com o resultado.  Espero não ter deixado muitos absurdos passarem, eu sou o caos escrevendo, mas acho que depois de tantos capítulos, com ou sem minha aprovação final, já deu pra notar que sou uma bagunça escrevendo, né?

Enfim, vejamos se assim eu consigo lançar e terminar essa fic logo! É uma tentativa desesperada de parar de deixar vocês todos na mão T_T

Não vou dar a cara a tapa pedindo comentários sobre essa decisão, mas aceito sim comentários sobre a história, táaa? Please?? E para mais histórias minhas, visitem meu site Olho Azul. :D

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